Campanha eleitoral ou mentir a pessoas estúpidas pelo seu próprio bem

O grande esforço de um político em campanha eleitoral é fingir que está interessado no que as pessoas têm para dizer e ser simpático. Porque as pessoas não votam no melhor candidato ou no que tem as melhores medidas. Votam no candidato que bebe uns copos de vinho com elas, que usa o chapéu mais naturalmente ou que consegue comer sandes de porco no espeto sem ser de faca e garfo.

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pp paulo pimenta

A campanha eleitoral é o pior período na vida de um político. Como eu costumo dizer, “a democracia é o pior de todos os sistemas, com excepção de todos os outros.” Eu sei que o Dr. Churchill também diz o mesmo, mas eu disse esta frase sem saber que ele o tinha dito, daí sermos co-autores.

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A campanha eleitoral é o pior período na vida de um político. Como eu costumo dizer, “a democracia é o pior de todos os sistemas, com excepção de todos os outros.” Eu sei que o Dr. Churchill também diz o mesmo, mas eu disse esta frase sem saber que ele o tinha dito, daí sermos co-autores.

O pior de todos os sistemas obriga os políticos a prestarem contas aos cidadãos. A campanha eleitoral é como uma entrevista de emprego para um político. Ele não pode dizer a verdade, senão não é contratado, e tem de fazer boa figura. O mal é que, ao contrário das entrevistas de emprego, em que os candidatos são submetidos a recrutadores especializados, na campanha eleitoral os políticos são sujeitos aos recrutadores menos especializados que existem: os eleitores. Se o eleitor médio fosse uma pessoa, seria uma pessoa extremamente limitada. No entanto, é essa pessoa que escolhe os nossos governantes.

O grande esforço de um político em campanha eleitoral é fingir que está interessado no que as pessoas têm para dizer e ser simpático. Porque as pessoas não votam no melhor candidato ou no que tem as melhores medidas. Votam no candidato que bebe uns copos de vinho com elas, que usa o chapéu mais naturalmente ou que consegue comer sandes de porco no espeto sem ser de faca e garfo. O político tem de saber interagir com as pessoas, mas, mais importante do que isso, também tem de saber com que pessoas não pode interagir. Tem de ter a habilidade de um precog do Relatório Minoritário e saber identificar à distância o tipo de pessoa que lhe pode vir a chamar chulo à frente dos jornalistas, criando um indesejado momento viral na campanha.

Outro dos grandes desafios para um político em campanha eleitoral é conseguir passar uma campanha sem falar das suas ideias concretas para o país. Ninguém quer saber das ideias dos partidos. Aliás, quem captou esta essência da democracia do século XXI foi aquele grupo de amigos do reiki sem ideologia: o PAN. Enquanto a esquerda vai fazer de conta que vai resolver o “problema” das alterações climáticas, na direita vai discutir-se o verdadeiro problema: a mudança de ares na liderança após o dia 6 de Outubro. Será que o Doutor Jovem Conservador de Direita vai finalmente avançar com a anexação da Direita? Será que vamos voltar a ter um líder tão carismático como o Dr. Cavaco Silva? Porque a falta de ideias em campanha é o problema da democracia. Os políticos não beijam peixeiras porque gostam; beijam peixeiras para terem a boca ocupada e não precisarem de dizer coisas. É por isso que os políticos fazem campanha entre multidões. Por exemplo, à falta de uma peixeira para beijar, o Dr. Cavaco foi forçado a encher a boca de bolo-rei.

E os políticos não podem falar sobre as suas ideias em campanha porque as pessoas nem sempre são capazes de reconhecer o que é melhor para elas. Por exemplo, o Dr. Passos Coelho foi forçado a passar uma campanha inteira a dizer que não ia impor medidas de austeridade, mesmo sabendo que elas eram inevitáveis. Custou-lhe muito mentir aos portugueses, mas foi um mal menor para evitar o mal maior que seria ele não ser eleito. Nas eleições seguintes, as pessoas recusaram-se a reconhecer que ele fez o melhor por elas, não concedendo à PàF uma maioria absoluta. As pessoas são ingratas e, por isso, merecem ser enganadas, para que votem nas pessoas certas.

Neste momento, é o Dr. António Costa que luta por uma maioria absoluta. Para isso, tem de fingir que governará muito melhor sem os outros partidos da “geringonça” a servir de empecilho. Mesmo sabendo que, sem eles, nunca teria sido primeiro-ministro. Inconstitucional, leia-se. Por outro lado, o PCP e o BE têm de passar a campanha a reivindicar mérito por aquilo que correu bem e a renegar o que correu mal.

Mas é um mal necessário. Os políticos responsáveis têm de saber mentir. É essencial para a democracia. Vou rebaixar-me e fazer uma comparação para o caso de haver “esquerdalhos” a lerem esta crónica. Aqui vai: um político em campanha eleitoral é como um actor de um teatro que faz sentido. Enquanto um “esquerdalho” se torna actor para poder ficar todo nu no centro do palco a gritar obscenidades a um pau de vassoura, tendo as pessoas que interpretarem que está nu porque se despojou de uma sociedade materialista e que o pau de vassoura é o seu pai, cujo capitalismo lhe sugou toda a carne, um político faz também um teatro que ninguém precisa de interpretar, apenas julgar pelo aspecto. Era escusado ter feito uma comparação tão longa, bastava dizer que era tal e qual um actor de telenovelas. Não precisa de interpretar, apenas é julgado pelo seu aspecto. Agora, já está.

Porque se não formos nós, os políticos responsáveis, a mentir, arriscamo-nos a que as pessoas, como são estúpidas, votem pelos partidos populistas e irresponsáveis, que mentem, mas para impor a sua agenda populista. A diferença entre um político populista e um político responsável é que um político responsável mente pelo bem; mente porque só assim consegue chegar ao poder e implementar as suas políticas boas. É por isso que tem de se rebaixar e ir a feiras, onde anda sem gravata e em mangas de camisa e beija pessoas sem lhes fazer testes médicos antes. Um político arrisca a sua vida e dignidade para poder servir o povo. Resta-lhe, ao final do dia, o consolo de regressar ao hotel, onde poderá lavar as mãos, baixar as mangas de camisa e colocar, de novo, a sua gravata. O tempo de fingir acabou.