A avaliação do desempenho desportivo para a próxima legislatura
O Governo, os partidos políticos, a CDP e o Comité Olímpico de Portugal (COP) têm comportamentos errados que não promovem o debate e o consenso sobre as melhores políticas públicas desportivas a partir do projecto PDF.
A complexidade do desporto português está a ser falhada por quem dela mais depende como são os que produzem desporto em todos os seus níveis, tanto mais quando a avaliação do seu desempenho é feita entre pares mundiais e olímpicos.
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A complexidade do desporto português está a ser falhada por quem dela mais depende como são os que produzem desporto em todos os seus níveis, tanto mais quando a avaliação do seu desempenho é feita entre pares mundiais e olímpicos.
Falta ao desporto ter capacidade de convencimento dos mais altos responsáveis da nação para obter as condições de produção excepcionais necessárias a esses feitos extraordinários que são os de competir e vencer os melhores do mundo.
Cada momento de política pública é um marco entre os muitos que há que conquistar num projecto de longo prazo e sem fim.
O desporto português necessita de ser feito pelo querer inquebrantável de cadeias de valor desportivo e ético de líderes dedicados ao desporto desde o clube do bairro mais frágil ao topo da pirâmide federada.
No actual debate eleitoral é decisivo promover a política pública da próxima legislatura, coincidente com o novo ciclo desportivo e olímpico. O sincronismo do ciclo político com o desportivo é relevante porque as eleições avaliam o desempenho da política pública e os jogos olímpicos avaliam, simultaneamente, o desempenho desportivo.
No sentido de valorizar o devir desportivo é importante afirmar que a actual legislatura continuou a desinteressar-se do associativismo desportivo e que essa desatenção da política pública necessariamente marcará negativamente o futuro, se o associativismo continuar a não ter sucesso na defesa dos seus legítimos direitos públicos.
Segunda-feira, 9 de Setembro de 2019, houve o habitual debate pré-eleitoral, promovido pela Confederação do Desporto de Portugal (CDP) sobre os programas desportivos dos partidos com assento parlamentar. A presença das federações desportivas foi esparsa para o que devia ser o conhecimento da nova política pública contra a actual crise do desporto.
Esteve presente Rafael Pinto, do PAN, Vasco Barata, do BE, Joana Silva, dos Verdes, João Machado, do CDS, Joel Sá, do PSD, Ivan Gonçalves, do PS, com a excepção do PCP. Sinteticamente, os (muito jovens) deputados enganaram-se porque focaram projectos de política da Educação, relacionados com a área da educação física e do desporto escolar. A anfitriã foi a CDP cujos membros estavam interessados em conhecer os novos projectos de política pública para o desporto federado. Como já tinham dito há 4 anos os deputados confessaram o consenso interpartidário ao longo da legislatura passada quanto às medidas que tinham aprovado. Fizeram discursos dispersos em várias direcções sugerindo, afinal, que ao consenso parlamentar faltaria a substância de política desportiva. A sua ignorância de desporto levou-os a afirmar que desempenhos de medalhas de 12 valores eram iguais a desempenhos de medalhas de 20 valores.
O desporto português tem lampejos de primeira categoria mas estruturalmente é de segunda velocidade. O desporto português é de uma Europa de “segunda velocidade” que a iliteracia desportiva nos partidos políticos nacionais teima em afirmar na sua candura desportiva.
O presidente da CDP e 4 presidentes de federação ou seus representantes realçaram a baixa prática desportiva da população, a necessidade de políticas para os clubes desportivos acompanharem as necessidades desportivas da população e os enormes impactos negativos na saúde dos portugueses, que haverá no futuro, devido à actual ausência de boas políticas direccionadas para o associativismo desportivo. Foram intervenções focadas, diferentes da dispersão dos representantes dos partidos.
Os presidentes das federações notam que os partidos políticos ignoram os desafios desportivos e económicos do associativismo desportivo. Teria sido relevante que os deputados falassem da Plataforma do Desporto Federado (PDF) e que não perdessem de vista o interesse das federações em melhorar e maximizar a produção de desporto. A Plataforma do Desporto Federado foi um alerta sobre a crise crónica que as fragiliza e um esforço crucial das federações desportivas na identificação de novas políticas públicas. O documento tem condições para ser melhorado, com o debate aberto a diversos parceiros interessados no estabelecimento de consensos e capazes de tolerar a divergência.
O projecto PDF demonstra que as federações sabem e podem fazer mais pelo seu futuro e pelo da juventude. O associativismo deveria focar-se no que será o século XXI e congregar as organizações públicas na resposta às necessidades de política que criará esse objectivo. As aspirações das federações são legítimas dado que são as detentoras do direito de propriedade da produção de desporto, ao contrário de outros parceiros que dependem do sucesso do federado para justificarem as suas Missões estatutárias.
O Governo, os partidos políticos, a CDP e o Comité Olímpico de Portugal (COP) têm comportamentos errados que não promovem o debate e o consenso sobre as melhores políticas públicas desportivas a partir do projecto PDF.
O debate de política pública do desporto actualmente tem uma ética duvidosa quando é atirado para a véspera das eleições em vez de preencher e engrandecer a legislatura e o ciclo desportivo. O COP, por exemplo, parece não o querer fazer, ou não valorizar as federações como parceiros fundamentais do sucesso desportivo nacional que necessitam da agilidade de organizações do topo para a melhoria da proposta de PDF.
O COP defende-se atrás do normativo e da continuidade do que diz ser estabelecido sem, contudo, aceitar a contestação crítica e auditoria independente às consequências das suas acções no presente século. Ao mesmo tempo é posto a circular, pejorativamente, que iniciativas como o projecto PDF ou a CDP têm características sindicais.
A situação é grave no respeitante às actuais características do Modelo de Desporto Português. As organizações desportivas privadas de topo que deviam apurar o sentido, a dimensão e a emergência da produção desportiva foram capturadas por interesses corporativos e rentistas a quem interessa anular a Plataforma do Desporto Federado ou outras iniciativas equivalentes.
Desde a apresentação da PDF em 2017 as organizações federadas de topo não terão promovido a discussão de melhores medidas de política de longo prazo como defendem os presidentes das federações.
Hoje é impossível saber em que se transformará o projecto PDF e que melhoria trará ao Modelo de Desporto Português e ao desporto português.
A certeza que existe é que a situação de rotura da produção desportiva e a crise desportiva crónica tem sido sustentada por aqueles a quem interessa a continuidade das coisas do costume. Tal é insustentável para a produção de mais e melhor desporto para que os clubes, associações e federações compitam com a Europa da primeira velocidade do desporto.
Por fim, as federações necessitam com urgência de um líder de um COP ou uma CDP que permita às federações desportivas criar e ter o usufruto do sucesso desportivo nacional.
As federações necessitam de um líder que assuma a responsabilidade da resolução das necessidades de política desportiva de todas as federações e lidere o diálogo com os parceiros sociais, culturais, económicos e políticos e a obtenção de um Pacto de Regime do Desporto visando de produção de resultados desportivos de primeira estirpe europeia.
As características pessoais desse líder, dos líderes das federações, exigem que seja um bom estratega capaz de identificar o futuro do desporto produzido pelas federações, associações e clubes nos seus diferentes segmentos. Terá que ser competente na identificação de colaboradores qualificados, capazes de reconhecer as necessidades sectoriais, equacionar os resultados a esperar de cada um e assumir a auditoria do desempenho desportivo, económico e social. O líder do associativismo desportivo deverá liderar processos complexos de debate e deliberação suportados por estudos técnicos preparados por equipas de especialistas. O presidente do organismo associativo de cúpula deverá saber ouvir as federações que o elegem, encorajar o consenso e ser tolerante quanto à divergência de opinião.
O líder terá a capacidade de diálogo e de comunicação da Visão do sector, as suas metas desportivas e económicas devidamente quantificadas, os instrumentos de programação e de produção para as criar, assim como, a prestação de contas pública dos projectos por que se responsabilizou.
Particularmente, o desporto português necessita de novos valores desportivos e olímpicos e que o líder do desporto seja capaz de os engrandecer.
O principal líder desportivo deverá aproveitar os momentos simbólicos como as vitórias esperadas e as extraordinárias para acertar e incrementar a reforma de longo prazo.
Fernando Tenreiro