Aldeia em Odemira abastecida por autotanque desperdiça muita da água que recebe
Dos 40 mil litros de água que são lançados diariamente na rede pública de abastecimento, habitantes de Relíquias dizem que 30 mil perdem-se. A culpa será de “duas grandes fugas”. A Câmara de Odemira nega estes números.
A população da aldeia de Relíquias, no concelho de Odemira, está a ser abastecida por autotanque desde Abril, sendo lançados, duas vezes por dia, na rede pública de abastecimento da aldeia cerca de 40 mil litros de água, apurou o PÚBLICO. Porém, a população não consumirá mais do que 10 mil litros. Trinta mil litros de água estarão a perder-se em “duas fugas muito grandes” sem que até agora as fosse possível localizar com precisão, confirmou ao PÚBLICO Daniel Balinhas, presidente da junta de freguesia. Embora os técnicos da câmara estejam a investigar as fugas, a autarquia nega a dimensão do problema.
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A população da aldeia de Relíquias, no concelho de Odemira, está a ser abastecida por autotanque desde Abril, sendo lançados, duas vezes por dia, na rede pública de abastecimento da aldeia cerca de 40 mil litros de água, apurou o PÚBLICO. Porém, a população não consumirá mais do que 10 mil litros. Trinta mil litros de água estarão a perder-se em “duas fugas muito grandes” sem que até agora as fosse possível localizar com precisão, confirmou ao PÚBLICO Daniel Balinhas, presidente da junta de freguesia. Embora os técnicos da câmara estejam a investigar as fugas, a autarquia nega a dimensão do problema.
O autarca reconhece que a rede de abastecimento é das mais antigas do concelho de Odemira. Foi instalada em 1972 e agora tem rupturas frequentes e um acentuado desperdício de água, problema que só será superado com a instalação de novos ramais para substituir os antigos. O presidente da junta diz não “conseguir precisar qual o volume de água consumido pela população”, mas denúncias de habitantes que chegaram ao PÚBLICO asseguram que não deverá passar de um quarto da água que é lançada na rede.
Esta situação prolonga-se “há mais de dois anos” sem que até agora o desperdício de água seja atenuado. Daniel Balinhas diz que os técnicos da Câmara de Odemira estão a tentar localizar o sítio exacto por onde se esvai a água que ainda não foi possível detectar.
Confrontado pelo PÚBLICO sobre este desperdício de água, o presidente da Câmara de Odemira, José Alberto Guerreiro, considera que se trata de uma “afirmação gratuita”. Os dados “reais” referem que, desde Junho, a Câmara de Odemira “comprou à AgdA – Águas Públicas do Alentejo, SA, 2404m3 de água, ou seja, a totalidade da água entrada no sistema, e facturou 1675m3 de água à população”. O autarca acrescenta que “estes 1675m3 correspondem a cerca de 70% da água que foi utilizada pelos consumidores e que os “restantes 30% correspondem a água não facturada (grande parte gasta em espaços públicos, regas em espaços verdes e instalações sanitárias públicas)”.
Há mais de uma década, e sempre que os anos registam baixa pluviosidade, que a escassez de água em Relíquias se repete. Em Abril passado foi necessário recorrer ao abastecimento por autotanque, porque os cerca de dez furos e poços que abastecem a aldeia “secaram todos”, explicou Daniel Balinhas.
As dificuldades de abastecimento complicam-se nesta altura do ano, quando os familiares que emigraram chegam à aldeia “para estar com os pais e avós”. Com o crescimento populacional, aumenta o consumo da água.
O autarca sublinha que, num futuro próximo, a albufeira do Alqueva irá debitar caudais para a barragem do Monte da Rocha, garantindo, desta forma, que a estação de tratamento de água (ETA) instalada junto a esta albufeira abasteça os concelhos de Castro Verde, Almodôvar, Ourique e parte dos territórios de Odemira e Mértola.
No decorrer de uma reunião da Comissão Parlamentar de Ambiente, Ordenamento do Território, Descentralização, Poder Local e Habitação, realizada a 17 de Junho, o ministro do Ambiente e da Transição Energética, João Pedro Matos Fernandes, realçou a pouca capacidade de encaixe da bacia hidrográfica que debita para a albufeira de Monte da Rocha. “É a albufeira mais crítica [em termos de armazenamento de água]”, disse.
Os dados publicados pelo Sistema Nacional de Informação de Recursos Hídricos, no início de Agosto, indicam que a barragem do Monte da Rocha, construída em 1972 no troço do rio Sado que atravessa o concelho de Ourique, permanece como uma das situações mais preocupantes em todo o Alentejo. Apresentava uma reserva de água de 9,8% da sua capacidade máxima de armazenamento de 104,5 milhões de metros cúbicos de água.
Os dados mais recentes divulgados pela empresa Águas Públicas do Alentejo (ApdA) referem que cerca de duas mil de pessoas dos concelhos de Almodôvar, Castro Verde, Mértola, Odemira e Ourique estão ser apoiadas com abastecimentos por autotanque. Entre Janeiro e Junho deste ano já foram fornecidos cerca de 12 mil metros cúbicos de água para satisfazer às necessidades básicas das populações afectadas.
O ministro do Ambiente garante que este ano o país não está a enfrentar “uma situação de seca tão complexa como existia há dois anos por esta altura”. Apesar de, segundo Matos Fernandes, a situação ser menos complexa, “há a consciência de que, com o aquecimento global, a tendência é, de facto, de agravamento”.
É neste cenário de escassez que o desperdício de água na região continua ser uma realidade. Assiste-se à rega de jardins, lavagens de carros e rupturas com elevados valores de perdas de água na rede pública de abastecimento em quase todos os concelhos alentejanos.
O PÚBLICO solicitou esclarecimentos à empresa Águas Públicas do Alentejo, mas não obteve resposta.