Jovem fica cego após sete anos a comer batatas fritas e pouco mais

A dieta do jovem britânico consistia essencialmente no consumo de batatas fritas, pão branco e ocasionalmente fatias de fiambre e salsichas. Especialistas alertam para os riscos da má alimentação.

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REUTERS

Um caso extremo de má alimentação causou cegueira a um jovem do Reino Unido, de acordo com um novo relatório publicado esta segunda-feira na revista Annals of Internal Medicine.

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Um caso extremo de má alimentação causou cegueira a um jovem do Reino Unido, de acordo com um novo relatório publicado esta segunda-feira na revista Annals of Internal Medicine.

Quando Denize Atan, a principal autora do estudo, conheceu o jovem de 17 anos no hospital especializado em oftalmologia de Bristol, a visão do adolescente já se vinha a deteriorar há dois anos. Mas o que mais chocou a autora foi “o tempo durante o qual persistiram os hábitos alimentares do paciente”, escreveu Atan num e-mail enviado esta terça-feira ao The Washington Post. “Quando eu o conheci pela primeira vez, ele já seguia a mesma dieta há [aproximadamente sete] anos”.

O jovem, que não foi identificado, disse aos médicos que desde a escola primária “comia uma porção diária de batatas fritas do restaurante local de peixe e batatas fritas e petiscava batatas Pringles, pão branco, fatias de [carne processada como] fiambre e salsichas”, diz o estudo.

Os riscos da má alimentação estão frequentemente associados à obesidade, problemas cardiovasculares e ao cancro, mas o estudo de Denize Atan alerta que a dieta também pode ter efeitos desastrosos, e por vezes irreversíveis, para o sistema nervoso, incluindo a visão.

O jovem tinha sido observado, pela primeira vez, três anos antes pelo seu médico de família devido a sintomas de “cansaço”. Segundo o relatório, o jovem, à data com 14 anos, era esquisito com a sua alimentação, mas encontrava-se “bem e não tomava medicação”. Os primeiros exames mostraram que ele apresentava níveis baixos de vitamina B12 e anemia macrocítica, condições que foram tratadas com injecções de vitamina B12 e “aconselhamento dietético”.

Aos 15 anos, a audição do adolescente começou a falhar e, posteriormente, começaram os problemas visuais. Os médicos não conseguiam descobrir o que estava a causar nenhum dos sintomas.

Após dois anos de perda progressiva da visão, os médicos declararam que o jovem sofria de cegueira. Exames adicionais revelaram que a sua deficiência de vitamina B12 não tinha melhorado. Além disso, tinha também atingido um nível reduzido de densidade mineral óssea e apresentava elevados níveis de zinco e baixos níveis de cobre, selénio e vitamina D no organismo.

O seu diagnóstico, de acordo com o relatório, apontava para neuropatia óptica nutricional e transtorno alimentar restritivo, um distúrbio alimentar que normalmente começa na infância e não é motivado por preocupações relacionadas com o peso ou fisionomia, mas por uma aversão a certas texturas de alimentos e pelo medo das consequências de comer.

A neuropatia óptica nutricional — que Atan diz ser causada com maior frequência pela má absorção de nutrientes, por certos medicamentos e pelo alcoolismo — é uma disfunção no nervo óptico. Caso seja detectada precocemente, a condição pode ser reversível, mas se não for tratada pode causar danos permanentes no nervo óptico e cegueira.

“As deficiências nutricionais são, na verdade, bastante comuns, mas a cegueira [por deficiência] nutricional não”, explicou Denize Atan ao The Washington Post. “A cegueira é uma complicação rara, mas grave, da má nutrição”.

“Este caso destaca a importância da dieta para a saúde visual e física, e o facto de que o consumo calórico e o índice de massa corporal não são indicadores fiáveis do estado nutricional”, esclareceu Denize Atan, professora de oftalmologia na Faculdade de Medicina de Bristol e médica no Hospital de Bristol, em comunicado divulgado pela Universidade de Bristol.

Os investigadores temem que a neuropatia óptica nutricional se possa vir a tornar mais frequente devido ao consumo massificado de comida de plástico (junk food) e à “crescente popularidade do veganismo” que, muitas vezes, não se faz acompanhar dos suplementos de vitamina B12 necessários.

“É importante ter uma dieta variada. Não existe um único alimento que forneça todas as vitaminas e minerais de que necessitamos — a variedade é a solução”, afirmou Atan.

Denize Atan espera que o caso deste jovem alerte para esta questão e que os exames clínicos de rotina passem a ter em conta os hábitos alimentares dos pacientes.

Exclusivo PÚBLICO/The Washington Post