Tribunal da Escócia recusa travar suspensão do Parlamento britânico
Juiz rejeita providência cautelar pedida na quinta-feira por 75 deputados que se opõem a um “Brexit” sem acordo com a União Europeia.
Um tribunal da Escócia recusou esta sexta-feira um pedido, com carácter de urgência, para travar a suspensão do Parlamento do Reino Unido, anunciada na quarta-feira pelo primeiro-ministro britânico, Boris Johnson. Mas esta não é a decisão final neste caso em particular, e há ainda outros dois processos em curso em tribunais da Irlanda do Norte e de Inglaterra.
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Um tribunal da Escócia recusou esta sexta-feira um pedido, com carácter de urgência, para travar a suspensão do Parlamento do Reino Unido, anunciada na quarta-feira pelo primeiro-ministro britânico, Boris Johnson. Mas esta não é a decisão final neste caso em particular, e há ainda outros dois processos em curso em tribunais da Irlanda do Norte e de Inglaterra.
“O tribunal [escocês] recusa aprovar providências cautelares nesta fase, mas indica que está aberto a ouvir as partes no início da próxima semana”, disse no Twitter a deputada Joanna Cherry, do Partido Nacional Escocês.
Cherry representa um grupo de 75 deputados da Câmara dos Comuns e da Câmara dos Lordes que se opõem a um “Brexit” sem acordo e que tentam travar a decisão de Boris Johnson nos tribunais.
“Não há nenhuma decisão sobre os méritos da nossa tentativa de travar a prorrogação [suspensão do Parlamento]. Isso vai acontecer na próxima semana”, disse ainda a deputada.
Em causa está o argumento de que a decisão do primeiro-ministro do Reino Unido constitui um abuso de poder. Em particular, os 75 deputados dizem que Boris Johnson traiu a confiança dos eleitores ao suspender o Parlamento de uma forma que vai contra o espírito da lei.
“O poder da prorrogação não é ilimitado, e deve ser usado de acordo com a confiança do povo”, disse o advogado Aidan O’Neill.
Ao anunciar na quarta-feira a suspensão do Parlamento entre 10 de Setembro e 14 de Outubro, o primeiro-ministro britânico disse que o seu objectivo é apresentar as medidas do novo Governo para o país – o que acontecerá com o Discurso da Rainha a marcar o fim da suspensão, no dia 14 de Outubro.
Mas os seus críticos dizem que isso é uma manobra para desviar as atenções do seu verdadeiro objectivo: tirar mais de um mês aos deputados para se poderem unir e travar um “Brexit” sem acordo até ao dia 31 de Outubro, a data marcada para a saída. O primeiro-ministro defende que o Reino Unido deve sair da União Europeia de qualquer forma, com ou sem acordo.
“A prorrogação está a ser usada para criar algo irreversível. O Reino Unido será forçado a sair da União Europeia com ou sem acordo, e o Parlamento está a ser impedido de fazer alguma coisa contra isso com o abuso do poder da prorrogação”, disse O’Neill.
Não está em causa a dissolução do Parlamento britânico, mas sim uma suspensão da sessão que foi aberta no Verão de 2017. Ao contrário do que acontece quando o Parlamento é dissolvido, numa suspensão (ou prorrogação, no termo original) os deputados mantêm os seus mandatos e regressam aos seus lugares no recomeço da sessão (neste caso, a 14 de Outubro).
O juiz Raymond Doherty, que recusou esta sexta-feira um pedido de providência cautelar para travar, desde já, a suspensão anunciada por Boris Johnson, vai voltar a analisar o caso na próxima semana. Mas, mesmo que aceite barrar a decisão do primeiro-ministro britânico no início da semana, os advogados do Governo terão tempo para recorrer e reverter essa decisão.
E, de qualquer forma, a suspensão do Parlamento só começa a 10 de Setembro, pelo que qualquer decisão temporária dos tribunais nos próximos dias terá poucos efeitos práticos. É provável que a batalha legal termine no Supremo Tribunal do Reino Unido.
Major junta-se aos processos
Para além do caso na Escócia, há outros dois processos em curso na Irlanda do Norte e em Inglaterra.
Na quinta-feira, soube-se que o responsável máximo pelos tribunais da Irlanda do Norte, o juiz Declan Morgan, interrompeu as férias para ouvir os primeiros argumentos num caso semelhante ao da Escócia, e ficou em aberto a hipótese de anunciar a sua decisão ainda esta sexta-feira.
A acção na Irlanda do Norte foi intentada por Raymond McCord, um activista pelos direitos das vítimas da violência no território, e cujo filho foi morto pela Força Voluntária do Ulster (milícia unionista), em 1997.
Em causa está a questão da fronteira entre a Irlanda do Norte e a República da Irlanda. Se não houver um acordo até 31 de Outubro, isso levará ao regresso das barreiras físicas entre os dois territórios, já que a Irlanda do Norte sairá da UE enquanto a República da Irlanda permanecerá no mercado comum.
O fim das barreiras físicas, ao abrigo do Acordo de Sexta-feira Santa, de 1998, é um dos símbolos mais visíveis do processo de paz que pôs fim a 30 anos de violência. Teme-se que o regresso da fronteira desperte a violência e reacenda um conflito que fez mais de 3500 mortos, entre os quais quase 2000 civis.
Ao mesmo tempo, há um terceiro caso a correr contra a decisão do primeiro-ministro britânico, que está a ser avaliado nos tribunais de Inglaterra e Gales.
Na quarta-feira, a conhecida activista anti-“Brexit” Gina Miller pediu ao tribunal que trave a ordem de Johnson, não por considerar que a suspensão do Parlamento seja ilegal, mas por entender que é ilegal tomar essa decisão nesta fase do processo do “Brexit”.
Esta sexta-feira, o antigo primeiro-ministro John Major, do Partido Conservador – e opositor do “Brexit” –, anunciou que vai juntar-se a esta iniciativa para travar a decisão de Boris Johnson.