Gestação de substituição: deputados revelaram “enorme irresponsabilidade”
Presidente remeteu lei para o Tribunal Constitucional. Associação Portuguesa de Fertilidade lamenta que deputados tenham sido omissos quanto ao direito de arrependimento das gestantes, responsabilizando-os por mais um atraso na lei.
A decisão de remeter para o Tribunal Constitucional a lei da procriação medicamente assistida resulta da “enorme irresponsabilidade dos deputados” que foram incapazes de atender aos reparos prévios que haviam sido já feitos por aquele órgão fiscalizador da constitucionalidade das leis. A acusação, dura e directa, parte da Associação Portuguesa de Fertilidade (APF) que, em comunicado, diz compreender os motivos do Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, e censura o papel dos deputados.
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A decisão de remeter para o Tribunal Constitucional a lei da procriação medicamente assistida resulta da “enorme irresponsabilidade dos deputados” que foram incapazes de atender aos reparos prévios que haviam sido já feitos por aquele órgão fiscalizador da constitucionalidade das leis. A acusação, dura e directa, parte da Associação Portuguesa de Fertilidade (APF) que, em comunicado, diz compreender os motivos do Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, e censura o papel dos deputados.
“Lamentamos que perante a obrigatoriedade de se estabelecer um prazo para que a gestante tenha o direito ao arrependimento, essa omissão de alternativa possa vir a colocar em causa do direito dos beneficiários da lei, o casal, a terem um filho e a constituírem uma família”, lê-se no comunicado.
Em Abril de 2018, o Tribunal Constitucional tinha já declarado a inconstitucionalidade da primeira versão da lei que regula as “barrigas de aluguer”, na sequência de um pedido de fiscalização apresentado pelo CDS-PP e por alguns deputados do PSD, pelo facto de aquela determinar que a gestante não podia revogar o consentimento prestado no contrato até à entrega da criança, isto é, não dava à gestante a oportunidade de arrependimento e a consequente possibilidade de ficar com a criança. Esta restrição constituía, para a maioria dos juízes do Palácio Ratton, “uma violação de direitos fundamentais”.
Posteriormente, em Julho passado, a Assembleia da República aprovou alterações a lei (com os votos contra do PSD, CDS-PP e PCP), ignorando, porém, a declaração de inconstitucionalidade quanto à possibilidade de arrependimento da gestante até ao momento da entrega da criança.
“O acórdão de Abril do ano passado foi claro ao determinar as normas que deveriam consubstanciar a Lei da Procriação Medicamente Assistida quanto à gestação de substituição, e o direito ao arrependimento foi uma delas (…). Aprovar o diploma, mas rejeitar que tal norma fosse incluída foi de uma enorme responsabilidade”, acusa a APF.
Esta associação diz aguardar “com expectativa” a resposta do Tribunal Constitucional, que tem agora 25 dias para se pronunciar, e lembra que, a ter em conta a realidade doutros países, os riscos de a gestante se arrepender durante a gravidez ou após o parto “têm-se revelado excepcionais”.
A proposta de regulação da gestação de substituição – aplicável apenas aos casais heterossexuais ou de duas mulheres que não tenham útero ou sofram de lesões que inviabilizem uma gravidez – tem vindo a marcar passo desde que foi aprovada pela primeira vez no Parlamento, em Maio de 2016, com os votos favoráveis do PS, BE, PEV e PAN e ainda de 24 deputados do PSD. Logo na altura, chamado a promulgar o diploma, Marcelo Rebelo de Sousa vetá-lo ia por considerar que não estavam devidamente salvaguardados o direito das crianças e das gestantes e que o respectivo “contrato de gestação” não tinha “enquadramento adequado”.