G7: Macron oferece ajuda para Amazónia, Bolsonaro responde com insultos
O Presidente brasileiro acusou o seu homólogo francês de tratar o Brasil como se fosse uma “colónia”, depois de este ter anunciado um apoio do G7 ao combate às chamas na Amazónia. Macron respondeu-lhe: “O Brasil merece ter um Presidente à altura do cargo”.
A guerra de palavras em torno da Amazónia continua e nem o anúncio do G7 de enviar uma ajuda de emergência de pelo menos 20 milhões de dólares (quase 18 milhões de euros) para o combate aos incêndios na floresta a serenou. Mas o Presidente brasileiro reagiu violentamente a esta oferta de ajuda, acusando o seu homólogo francês de tratar Brasília como “uma colónia ou terra de ninguém”. Pelo meio, Bolsonaro e membros do seu Governo ofenderam Macron e a sua primeira-dama.
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A guerra de palavras em torno da Amazónia continua e nem o anúncio do G7 de enviar uma ajuda de emergência de pelo menos 20 milhões de dólares (quase 18 milhões de euros) para o combate aos incêndios na floresta a serenou. Mas o Presidente brasileiro reagiu violentamente a esta oferta de ajuda, acusando o seu homólogo francês de tratar Brasília como “uma colónia ou terra de ninguém”. Pelo meio, Bolsonaro e membros do seu Governo ofenderam Macron e a sua primeira-dama.
Emmanuel Macron comentou que os brasileiros merecem um “Presidente à altura do cargo”, depois dos insultos a Brigitte Macron. Bolsonaro fez comentários “desrespeitosos” sobre a idade da primeira-dama francesa, Brigitte — é 24 anos mais velha que Macron. “As mulheres brasileiras têm sem dúvida um pouco de vergonha [de Bolsonaro]”, disse Macron.
Mas nada disso incomodou o Presidente brasileiro, cuja hostilidade em relação a Macron tem sido em crescendo, desde que a União Europeia assinou o acordo comercial com os países do Mercosul, que implica o cumprimento de determinadas regras ambientais na produção agrícola e pecuária para poder exportar para a UE. “Não podemos aceitar que um Presidente, Macron, dispare ataques descabidos e gratuitos à Amazónia, nem que disfarce suas intenções atrás da ideia de uma ‘aliança’ dos países do G7 para ‘salvar’ a Amazónia, como se fossemos uma colónia ou uma terra de ninguém”.
Desde que os incêndios florestais na Amazónia, os piores dos últimos cinco anos, chegaram às manchetes de jornais internacionais e Macron apelou às sete economias mais industrializadas que debatessem a "crise internacional" na cimeira do G7 que Bolsonaro endureceu o discurso da soberania brasileira sobre a maior floresta do mundo. Chegou mesmo a dizer que os incêndios e as polémicas não são mais que tentativas para “enfraquecer o Brasil”, para lhe roubarem os recursos da floresta.
Macron esforçou-se por assumir a dianteira nas críticas ao Presidente brasileiro, numa estratégia de aproximação à esquerda francesa e de conquista do eleitorado preocupado com as alterações climáticas, e não lhe correu como esperava, vendo-se isolado. Reunidos este fim-de-semana em Biarritz, em França, os líderes do G7 recusaram uma abordagem de confronto preferindo o diálogo e a conciliação com Bolsonaro – a chanceler alemã, Angela Merkel, deixou bem claro que não ia pôr em causa o acordo Mercosul-União Europeia. E estenderam-lhe um primeiro ramo de oliveira: ajuda financeira internacional no valor de pelo menos 20 milhões de dólares para operações aéreas de combate aos incêndios.
"Alguém ajuda alguém?”
“Há uma verdadeira convergência para dizer: ‘Estamos todos de acordo em ajudar o mais rápido possível os países afectados por esses fogos”, disse Macron no domingo, sublinhando que se deve ter um objectivo de reflorestação “respeitando a soberania brasileira”. Mas, esta segunda-feira, voltou a deixar avisos, atiçando os ânimos: “Se um Estado soberano toma, de forma clara, concreta, medidas que estão em evidente oposição aos interesses de todo o planeta, há todo um trabalho jurídico e político a ser feito”.
Os líderes do G7 (EUA, Reino Unido, Japão, Canadá, França, Alemanha e Itália, e a União Europeia como convidada) mandataram o chefe de Estado francês para orientar os trabalhos de cooperação com os países afectados pelos incêndios na Amazónia – Brasil, Venezuela, Colômbia e Bolívia – e a troca de insultos não augura bons resultados. “Estamos a trabalhar num mecanismo de mobilização internacional para poder ajudar de maneira o mais eficaz possível estes países”, disse no domingo Macron.
“Macron promete ajuda de países ricos à Amazónia. Será que alguém ajuda alguém, a não ser uma pessoa pobre, sem retorno? Quem é que está de olho na Amazónia? O que eles querem lá?”, questionou Bolsonaro pouco depois de saber da oferta do G7.
A estratégia de ajuda internacional está dividida em duas fases, explicou o Presidente francês. A primeira é imediata e sustenta-se no envio de ajuda financeira e a segunda é a médio prazo com a apresentação na próxima Assembleia-Geral das Nações Unidas, em Setembro, de um plano para reflorestar a Amazónia – o Presidente da Colômbia, Ivan Duque, já disse querer negociar um pacto para conservar a maior floresta tropical do mundo. Na primeira, Bolsonaro terá de aceitar a oferta e, na segunda, de trabalhar lado a lado com organizações não-governamentais que acusou recentemente de serem responsáveis pelos incêndios e populações locais, exigem os líderes mundiais.
Poucas horas depois de uma nova vaga de insultos entre os dois chefes de Estado e de o Presidente da Bolívia, Evo Morales, ter voltado atrás e aceitou ajuda internacional, o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, reagiu à oferta de 20 milhões de euros dizendo ser “uma excelente medida”, “muito bem-vinda”, e que Brasília vai decidir como serão usados, num claro desafio soberanista ao G7. Segundo a proposta inicial, as verbas seriam usadas para financiar uma frota de aviões de combate aos incêndios Canadair e o Governo brasileiro sempre deixou bem assente não estar disposto a aceitar ajuda que imponha condicionantes.
Desafio que contrasta com a política de braços abertos à ajuda oferecida por Israel. O primeiro-ministro israelita, Benjamin Netanyahu, disponibilizou um avião e técnicos especializados em operações de combate a incêndios e Bolsonaro aceitou de imediato, à semelhança da oferta feita após o colapso da barragem em Brumadinho, no estado de Minas gerais, no início deste ano. Brasília e Telavive aproximaram-se bastante desde que o antigo capitão se sentou no Palácio do Planalto.
Militares mobilizados
Entretanto, a Amazónia arde com incêndios descontrolados e até esta segunda-feira já se tinham registado 80.626 focos de incêndio em todo o Brasil, segundo o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais. O Governo brasileiro recusa-se a revelar a área ardida até ao momento, sendo criticado por isso, mas sabe-se, por exemplo, que na Bolívia, perto da fronteira com o Paraguai e o Brasil, já arderam pelo menos um milhão de hectares.
Os incêndios começaram há quase três semanas e, perante críticas internas e internacionais de inacção, o Governo foi obrigado a activar os três ramos das forças armadas para combater os incêndios cujas suspeitas recaem sobretudo em mão humana. Anunciou ter disponível uma força de 44 mil militares no Norte do país, sem no entanto avançar números nem quando estariam nos sete dos nove estados amazónicos que pediram ajuda federal. E a verdade é que são poucos os relatos de militares avistados nas linhas de combate aos fogos.
Por agora, só dois aviões Hércules C-130 da Força Aérea parecem estar a actuar no estado de Rondónia e vídeos das suas descargas de água com químicos foram divulgadas por Bolsonaro, numa tentativa de dirimir as críticas quando as ruas brasileiras eram inundadas por manifestações em defesa da Amazónia. “Amazónia fica, Bolsonaro sai”, gritou-se, com muitos a exigirem a demissão do ministro do Meio Ambiente.