Desligar para ligar
Numa era em que a exacerbação pelo tecnológico luta taco a taco para levar a melhor sobre o tradicional, são as redes sociais e, mais importante, os rebanhos sociais os principais responsáveis pela volatilidade do que é ser cool ou démodé.
Se a vida fosse uma receita, não haveria versão da mesma em que não estivesse lá a “sabedoria popular a gosto”; “clichés q.b” ou “uma colher de chá de seguir o que os outros afirmam como verdade”. Não há como fugir. Venha de um canal de Youtube de cozinhados instantâneos ou do Pantagruel, o certo é que a nossa concepção opinativa tem sempre umas raspas de informação pouco útil, perfilhadas por outros e sem que nos dignemos a confirmar.
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Se a vida fosse uma receita, não haveria versão da mesma em que não estivesse lá a “sabedoria popular a gosto”; “clichés q.b” ou “uma colher de chá de seguir o que os outros afirmam como verdade”. Não há como fugir. Venha de um canal de Youtube de cozinhados instantâneos ou do Pantagruel, o certo é que a nossa concepção opinativa tem sempre umas raspas de informação pouco útil, perfilhadas por outros e sem que nos dignemos a confirmar.
Numa era em que a exacerbação pelo tecnológico luta taco a taco para levar a melhor sobre o tradicional, são as redes sociais e, mais importante, os rebanhos sociais os principais responsáveis pela volatilidade do que é ser cool ou démodé. Nos dias que correm – porque já nenhum deles anda – será mesmo o fora de moda o que vinga? Ou a moda é estar com um pé e meio no que, entendemos para nós, ser arrojado?
O certo é que precisamos de ser influenciados. Não obrigatoriamente por uma influencer de creme de mãos. Seja de forma for, precisamos de sentir uma pressão social para agir. Mesmo quando, num acto heróico, de capa no rato e de teclado em punho, decidimos fazer o que já outros mártires fizeram e cortar o tubo do soro dos likes. Queremos que o nosso grito do Ipiranga seja ficar só com o Linkedin como rede social e ver as notícias no Google News ou, para os mais afoitos, num qualquer quiosque de rua em que paramos para ler as “gordas”.
Há uma necessidade tão grande pela diferença, como há pela semelhança. O diferente é o novo igual. Quando nos apercebermos que há tanta gente a esforçar-se para ser distinta, procuramos voltar ao ponto e partida para recalibrar. Dormir sobre o assunto e espreguiçarmo-nos enquanto arranjamos outra corrente alternativa à qual nos iremos ligar. Pelo meio, vamos perdendo o cariz único que o selo da nossa personalidade tem. Já não há carimbo que nos caiba na carta de nós para nós.
O espreguiçar vai até onde nos podermos esticar. Bocejamos como se tivéssemos acordado de um coma internáutico e, mal apagamos qualquer rede social, é como se fossemos o João Garcia, depois de ter chegado ao cume do Everest. Não dá para se cortar o contacto com o Facebook e Instagram sem gritar ao mundo que o fizemos. Antes, ainda hesitando sobre a decisão a tomar, valorizamos as pessoas que fazem textos infindáveis de suor, migalhas e a ajuda do Priberam para criticar a era em que vivemos. Estraçalhar as redes sociais, apontar para o seu veneno enquanto o erguem, dizendo: “Digam deste veneno não beberei. Farei o mesmo”. Numa retórica sagaz, fica só a faltar a coerência, que não vem juntamente com as frases nos pacotes de açúcar. A coerência, essa, esbarra no desejo pela acumulação de gostos, partilhas e exposição da sua opinião nas…redes sociais. Usam este veículo poluente – como frisam na dissertação – para propalar a opção de “desligar para ligar”, tendo como certo a reconexão com o “eu” interior e com o espaço em redor, tal e qual quando nos livramos das alergias e podemos respirar fundo sem espirrar ao passar por qualquer malmequer. É esta a ideia vendida, através do que assentem como o mal maior.
Tal como quando decidimos deixar de fumar, é preciso saber onde devemos deixar os pretextos morais. Ou ficam lado a lado com o maço e o isqueiro e nunca mais somos tentados a relembrar-nos deles; ou andamos com eles na algibeira e, em caso de necessidade, lá puxamos de uma razão pela qual deixámos o tabaco e a exibimos com a pretensão de estarmos certos. É importante decidir como agir, antes de nos perdermos e colidirmos com o IQOS e a pergunta incómoda do “porquê que fumas isso? Não tinhas deixado de fumar?”.
Vivemos num paradoxo. Estamos todos um pouco à deriva e a rosa-dos-ventos da qual temos a app no telemóvel não se conecta com a irreverência de permitir que o destino escolha se devemos ou não deixar migalhas no chão para voltar ao ponto de partida. Desligamos para nos ligarmos, conquanto, a grande parte das vezes só o fazemos para nos sentirmos superiores e hastearmos a bandeira da diferença, enquanto procuramos aprovação pela decisão que tomámos.