Um texto que mete Pardal, Bannon, Rio e desejo de esquecimento
“Conheci gente fantástica: um gajo que é militante socialista que quer mudar a lei da greve para acabar com as palhaçadas do Pardal que, diz ele, é o enviado do Steve Bannon a Portugal para tirar o PS do governo”, disse-me a Vanessa.
A Vanessa ainda se lembra de uma coisa ou outra que aconteceu no passado. Lembra-se de me ter furtado com destreza um candidato a namorado, aposto. Mas tenho outra amiga, que não vou aqui nomear, que não se lembra de nada. Zero. É uma pessoa absolutamente saudável, não tem a ver com qualquer doença.
A verdade faz-nos mais fortes
Das guerras aos desastres ambientais, da economia às ameaças epidémicas, quando os dias são de incerteza, o jornalismo do Público torna-se o porto de abrigo para os portugueses que querem pensar melhor. Juntos vemos melhor. Dê força à informação responsável que o ajuda entender o mundo, a pensar e decidir.
A Vanessa ainda se lembra de uma coisa ou outra que aconteceu no passado. Lembra-se de me ter furtado com destreza um candidato a namorado, aposto. Mas tenho outra amiga, que não vou aqui nomear, que não se lembra de nada. Zero. É uma pessoa absolutamente saudável, não tem a ver com qualquer doença.
A verdade é que quando lhe falamos de coisas que aconteceram há cinco anos, há 10 anos, há 15 ou até há 20, kaputt. Não se lembra. Ninguém sabe por que isso acontece e ela também não se preocupa, porque na verdade não é uma doença. Foram os drunfos que ela tomou em quantidades industriais na faculdade para fazer directas em prol dessa actividade nobre que é o estudo? Eu nunca fiz directas para estudar – não é que não tivesse tentado, mas adormecia em qualquer sítio sem querer – e, não sei se por isso, lembro-me de tudo ou de quase tudo, às vezes com pormenores que em nome de alguma sanidade até dispensava.
O resultado final não é muito abonatório para mim: a minha amiga que não se lembra de nada parece 20 anos mais nova. Eu – com sorte – pareço a idade que tenho. Ah, a bênção do esquecimento, o não ter cargas metidas nos contentores da moleirinha. O dia nasce e um ser acorda virgem para o mundo, cumprimenta-o como se fosse alguém acabado de conhecer: “Olá mundo, prazer em conhecer-te. Deves ser um gajo porreiro. Que ideias fixes tens para me mostrar hoje? Estou pronta”.
O que deve ser acordar como se nunca tivesse acontecido nada – tirando uma ou outra teoria da conspiração - antes do nosso magnífico saltar da cama. A vida podia sempre ser assim, um perfeito papel em branco, sem passado. Quem tem alguma memória inventa uns gatafunhos para estragar a magnificência da candura.
A Vanessa ligou-me de Viana do Castelo onde esteve ontem uma grande caloraça.
- Então estás fixe? Olha isto está maravilhoso. Fiz mesmo bem em vir para aqui. Conheci gente fantástica: um gajo que é militante socialista que quer mudar a lei da greve para acabar com as palhaçadas do Pardal que, diz ele, é o enviado do Steve Bannon a Portugal para tirar o PS do governo. Ah, e andei à procura de Rui Rio na praia do Cabedelo, mas não o encontrei. Tens a certeza que está aqui? Não terá ido para o deserto? Sei lá, se está condenado a uma travessia no deserto se calhar foi já para lá, só para ver como é.
- Não acredito. Vais ver que amanhã ainda o encontras.