E acabar com o direito dos médicos à greve?
Façamos o exercício simples de fechar os olhos e imaginar que estas decisões de “serviços máximos” eram tomadas por Pedro Passos Coelho ou Aníbal Cavaco Silva. O que diriam os partidos de esquerda, a começar pelo PS?
O que se está a discutir por estes dias em Portugal é, efectivamente, se o direito à greve ainda existe. A resposta musculada e os “serviços máximos” decretados pelo Governo – um dos argumentos é o turismo e as férias – é um corte epistemológico na história de Portugal do pós-25 de Abril. Se obviamente não fosse um governo PS, apoiado por partidos à sua esquerda, a fazê-lo, a reacção da esquerda seria substancialmente diferente. Façamos o exercício simples de fechar os olhos e imaginar que estas decisões de “serviços máximos” eram tomadas por Pedro Passos Coelho ou Aníbal Cavaco Silva. O que diriam os partidos de esquerda, a começar pelo PS? Ontem, o PCP ainda admitiu que o Governo está a pôr em causa o direito à greve, enquanto o Bloco de Esquerda se recusou a falar sobre o assunto. A coerência, ainda que sobre valores matriciais do regime, é como as ondas do mar: vai e vem.
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O que se está a discutir por estes dias em Portugal é, efectivamente, se o direito à greve ainda existe. A resposta musculada e os “serviços máximos” decretados pelo Governo – um dos argumentos é o turismo e as férias – é um corte epistemológico na história de Portugal do pós-25 de Abril. Se obviamente não fosse um governo PS, apoiado por partidos à sua esquerda, a fazê-lo, a reacção da esquerda seria substancialmente diferente. Façamos o exercício simples de fechar os olhos e imaginar que estas decisões de “serviços máximos” eram tomadas por Pedro Passos Coelho ou Aníbal Cavaco Silva. O que diriam os partidos de esquerda, a começar pelo PS? Ontem, o PCP ainda admitiu que o Governo está a pôr em causa o direito à greve, enquanto o Bloco de Esquerda se recusou a falar sobre o assunto. A coerência, ainda que sobre valores matriciais do regime, é como as ondas do mar: vai e vem.
Compreende-se a irritação que produz em muitos portugueses a figura do advogado Pardal Henriques – aliás iminente candidato pelo partido de Marinho e Pinto – mas uma irritação não é suficiente para justificar tanta complacência com a resposta musculada ao anúncio de uma greve de um sindicato que, ainda que tenha interrompido um processo negocial que estava em curso, tem razões de queixa que não são de somenos.
Se é para reduzir o direito à greve para o horário “das seis e meia às sete em frente ao cassetete” (como escreveu Sérgio Godinho na canção “Arranja-me um emprego”), vale então repensar as greves dos médicos. A saúde é um bem de valor maior do que as férias ou o turismo. Francisco George, o antigo director-geral da Saúde, já manifestou publicamente que as greves de médico deveriam ser ilegalizadas. “A greve não é um direito de médicos e enfermeiros”, disse George em recente entrevista ao PÚBLICO e à Renascença. “O doente não é o patrão dos grevistas. O grevista está a lesar o doente. Nenhum doente, a meu ver, devia ser molestado quando vai a uma consulta e vê que há greve e depois são mais seis meses”. Para George “isto é inaceitável, intolerável no plano da ética”.
É por aqui que queremos ir?
[Pequena nota histórica: Afonso Costa, uma das principais figuras da primeira República, autor da lei de separação da Igreja e do Estado, antepassado político de muitos socialistas, ficou conhecido como o “racha-sindicalistas” pela maneira violenta como tratou o movimento operário, prendendo trabalhadores e fechando as suas associações]