A Idade do Ferro, de J. M. Coetzee, é uma viagem no tempo, mas também um aviso. Publicado em 1990, apelava de uma forma tão poderosa contra as tiranias do seu tempo — e a crueldade da África do Sul do apartheid — que é inquietante ler o romance hoje e descobrir quão incomodamente actuais e relevantes são os seus temas. Coetzee faz duas simples perguntas à sua enfraquecida protagonista, questões que vale a pena aprofundar quando tanto do que é feito a pessoas vulneráveis passa diante dos nossos olhos. Nos ecrãs. Nos nossos feeds. E se testemunhar e denunciar os crimes dos governos não for suficiente? Do que estaremos dispostos a abdicar para conseguir que eles parem? Coetzee reconhece que é difícil enfrentar questões políticas desse género quando a vida já é suficientemente existencial. Quando o livro se inicia, a Sr.ª Curren, uma professora de letras clássicas da Cidade do Cabo já reformada, fica a saber que o cancro de que sofre a irá matar. Ninguém a vai buscar ao hospital, ou levar até casa, ou sequer fazer-lhe uma chávena de chá na cozinha. O seu marido faleceu há muito, a filha foi viver para a América. Curren vive sozinha numa casa decrépita com as janelas entaipadas para evitar a entrada de ladrões. O carro que conduz é tão antigo que para arrancar tem que dar à manivela.
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A Idade do Ferro, de J. M. Coetzee, é uma viagem no tempo, mas também um aviso. Publicado em 1990, apelava de uma forma tão poderosa contra as tiranias do seu tempo — e a crueldade da África do Sul do apartheid — que é inquietante ler o romance hoje e descobrir quão incomodamente actuais e relevantes são os seus temas. Coetzee faz duas simples perguntas à sua enfraquecida protagonista, questões que vale a pena aprofundar quando tanto do que é feito a pessoas vulneráveis passa diante dos nossos olhos. Nos ecrãs. Nos nossos feeds. E se testemunhar e denunciar os crimes dos governos não for suficiente? Do que estaremos dispostos a abdicar para conseguir que eles parem? Coetzee reconhece que é difícil enfrentar questões políticas desse género quando a vida já é suficientemente existencial. Quando o livro se inicia, a Sr.ª Curren, uma professora de letras clássicas da Cidade do Cabo já reformada, fica a saber que o cancro de que sofre a irá matar. Ninguém a vai buscar ao hospital, ou levar até casa, ou sequer fazer-lhe uma chávena de chá na cozinha. O seu marido faleceu há muito, a filha foi viver para a América. Curren vive sozinha numa casa decrépita com as janelas entaipadas para evitar a entrada de ladrões. O carro que conduz é tão antigo que para arrancar tem que dar à manivela.