Na Tua Vinharia da Póvoa só se bebe vinho nacional — e pouco convencional

Com cerca de 300 referências de vinho diferentes, na Tua Vinharia, na Póvoa de Varzim, vendem-se vinhos de Norte a Sul e ilhas. Uma nova garrafeira na cidade, mas também um espaço “para estar” — e ficar, já que o vinho a copo é uma opção.

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Em tétum, língua oficial de Timor-Leste, a palavra vinho traduz-se para tua. Foi em Timor que Carla Fonseca e Jaime Xavier viveram durante pouco mais de dois anos, uma vez que a empresa para a qual Jaime trabalhava estava sediada naquele país. Regressaram a Portugal em Abril de 2018. “Nós estávamos em Lisboa antes de ir para Timor. Voltar de um país tão pequenino e idílico e regressar a Lisboa era impensável. Tudo me parecia demasiado barulhento e assustador. Ou ficaríamos no Porto ou aqui [na Póvoa de Varzim], onde eu tenho a minha família. O Jaime adorou a Póvoa e acabámos mesmo por ficar”, recorda Carla, 46 anos.

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Em tétum, língua oficial de Timor-Leste, a palavra vinho traduz-se para tua. Foi em Timor que Carla Fonseca e Jaime Xavier viveram durante pouco mais de dois anos, uma vez que a empresa para a qual Jaime trabalhava estava sediada naquele país. Regressaram a Portugal em Abril de 2018. “Nós estávamos em Lisboa antes de ir para Timor. Voltar de um país tão pequenino e idílico e regressar a Lisboa era impensável. Tudo me parecia demasiado barulhento e assustador. Ou ficaríamos no Porto ou aqui [na Póvoa de Varzim], onde eu tenho a minha família. O Jaime adorou a Póvoa e acabámos mesmo por ficar”, recorda Carla, 46 anos.

Agora são os proprietários da mais recente garrafeira da cidade, a Tua Vinharia na Póvoa, nome que ganhou em homenagem a Timor e ao rio Tua, afluente do Douro, “uma das zonas preferidas do país” de Jaime. Sem um “projecto profissional definido” após regressarem a Portugal, acabaram por criar a empresa Tua com outros sócios, em Setembro do ano passado, inicialmente pensada apenas para a exportação de vinho para Timor.

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Adriano Miranda

“Fomos conhecendo outros produtores de vinhos e outras regiões. Andámos por aí a beber vinho, a provar, e sentimos que não conseguíamos comprar todos os vinhos de que gostávamos”, explica Jaime, 46 anos. Aí, a ideia de exportação cresceu. E nasceu a Vinharia, com ambas as vertentes — têm os vinhos que representam no exterior e aqueles que gostavam de comprar diariamente e que “não dá para arranjar por perto”. Com o nascimento da empresa, havia também a “necessidade de ter um espaço físico”, com a vontade de “receber pessoas, inclusivamente pessoas que vinham de Timor”, conta Jaime.

Avançaram, então, com o projecto Vinharia. Um espaço “onde as pessoas se sentissem à vontade”, onde pudessem “estar a consumir ou a não consumir”, a “falar sobre vinho” ou até sobre “outra coisa qualquer” — era essa a vontade do casal. E em pouco tempo fizeram acontecer. Quem entra, sente-se em casa. A exposição dos vinhos, “diferente das habituais garrafeiras que, aparentemente, fazem com que as pessoas não se sintam muito à vontade”, na Tua Vinharia é “quase de supermercado”. As garrafas estão nas prateleiras, todas de pé, organizadas por produtor e à vista dos clientes.

“Vinhos tranquilos”, num espaço (ainda mais) tranquilo

“Sem querer parecer demasiado petulante”, Jaime arrisca-se a dizer que, ali, cada vinho tem “uma história”. E começa: Nã te rales, Cantando e Tá Somente, os novos projectos da Herdade da Figueirinha (14,90 euros), vêm directamente do Alentejo e trazem com eles o sotaque. “[Os produtores] foram buscar os nomes dos vinhos à forma como se fala no Alentejo”, explica. Do Dão, o Tricana (4,70 euros).

“Trouxemos o Tricana porque as roupas que as mulheres usam nas Rusgas de São Pedro fazem lembrar uma moda que nasceu na Póvoa nos anos 1920 e que perdura até hoje: as tricanas”, conta. Do Douro, a Quinta do Isaac (17 euros), o “novo carinho” do casal. Acharam interessante o facto de haver um vinho com o mesmo nome do filho de ambos. Então, provaram. E depois, “encantados com a quinta, encantados com as pessoas e encantados com o vinho”, trouxeram-no para a Vinharia. Nos Verdes, fizeram uma “selecção cuidada”. O Caves da Cerca (5 euros), produtor de Vinhos Verdes de Amarante, faz parte da casa. “Eu podia ficar aqui a tarde toda” a dar exemplos, termina Jaime Xavier.

Além do Alentejo, do Dão, do Douro e dos Verdes, na Tua Vinharia também há vinhos de Lisboa e Tejo, como a Quinta do Gradil (10 euros), de Trás-os-Montes, das Beiras, como é o caso do vinho da Quinta dos Termos (12 euros), da Bairrada e dos Açores. Os da Madeira já fazem parte da lista de encomendas, mas ainda não têm previsão de chegada. Ao todo, são cerca de 300 referências diferentes de 50 produtores, com o mais barato a custar 2,50 euros e o mais caro 64 euros.

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Adriano Miranda

A maior parte dos vinhos que se vendem na Tua são vinhos de mesa, “vinhos tranquilos”. No entanto, sejam tranquilos ou generosos, todos podem ser provados em loja: “Nós abrimos qualquer garrafa para as pessoas consumirem aqui, com um custo extra e com garantia de que a levam depois”, explica Jaime. Mas o vinho a copo é uma opção diária na Vinharia. O casal selecciona, em cada dia, alguns vinhos que os clientes podem experimentar. Os preços variam entre os 2 e os 3 euros, com o copo de vinho do Porto a custar 2,50 euros. Alguns espumantes, aguardentes e bebidas espirituosas, caso sejam produzidos pelos produtores que Carla e Jaime vendem na loja, também fazem parte do menu.

Mas nem só de vinhos se faz a Tua. Não podiam faltar as conservas da Póvoa (entre os 2,20 e os 5,10 euros). Caviares e geleias da Wine to Eat, um projecto português de produtos gourmet feitos “à base de produtos vínicos”, também estão para venda. O chá Camélia (18,50 euros), a “única plantação” de chá verde no continente europeu e que é feita em Vila do Conde, teve um lugar especial na Vinharia. Isto porque a primeira plantação do chá teve este ano a “primeira colheita para venda”. Antes disso, em 2017, foi feita uma colheita experimental, que não chegou a ser comercializada. Por último, mas não menos importante, o café de Timor-Leste, a principal cultura do país. “Nós mandamos para lá vinho — para nós, provavelmente o melhor do mundo —, e achámos que era justo trazer para cá o melhor café do mundo”, explica Carla.

Ainda assim, o conceito de tapas & wine não é, para já, uma opção. “Se alguém quiser beber um copo de vinho e acompanhar com uma conserva, pode fazê-lo. Estamos preparados para abrir uma conserva e servi-la num prato”, mas não mais do que isso, explica Jaime, que anseia, tal como Carla, ver “como é que as coisas evoluem”.

O maior desafio é explicar o conceito às pessoas. “Não é muito convencional”, diz Jaime. “As pessoas têm o hábito saudável de beber vinho, de acompanhar as refeições e momentos sociais com vinho, mas entrar numa loja como esta e não conhecer quase nenhum dos vinhos que cá está é um desafio para nós”, admite. Quando isso acontece, tentam explicar às pessoas que, provavelmente, o vinho que procuram não está na garrafeira, mas que “há um muito parecido dentro daquilo que é o seu hábito de consumo”.

Abriram apenas em Julho, mas já sabem que vão ter “dois públicos muito diferentes”: os turistas, público “de Verão”, e, depois, os poveiros. As pessoas que entram dizem que “fazia falta” um espaço destes. “Não há grande oferta de garrafeiras aqui na Póvoa”, admite Carla, apesar de saber que há bastantes espaços do mesmo género espalhados pelo país, “com uma ou outra característica diferente”. A Tua Vinharia prima pela “perspectiva” que o casal tem em relação ao vinho. “É nosso”, dizem, em uníssono. “Toda a gente tem a sua relação com o vinho. Ou, então, não tem. Mas é certo que é única”, conclui Carla.

Texto editado por Sandra Silva Costa