Trump nomeia “o congressista mais conservador do Texas” para liderar os serviços secretos
John Ratcliffe foi eleito em 2014 com o apoio do movimento Tea Party e é um dos mais fortes apoiantes do Presidente norte-americano. Foi escolhido para substituir Dan Coats, que se demitiu ao fim de um mandato marcado por divergências com Trump.
O coordenador das agências de serviços secretos dos Estados Unidos, Dan Coats, apresentou a sua demissão ao Presidente Donald Trump, pondo fim a uma relação de dois anos e meio marcada por divergências sobre temas como a interferência da Rússia nas eleições de 2016 e os programas nucleares da Coreia do Norte e do Irão. Para o lugar de Coats, o Presidente Trump nomeou o congressista John Ratcliffe, um dos seus mais fortes apoiantes no Partido Republicano.
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O coordenador das agências de serviços secretos dos Estados Unidos, Dan Coats, apresentou a sua demissão ao Presidente Donald Trump, pondo fim a uma relação de dois anos e meio marcada por divergências sobre temas como a interferência da Rússia nas eleições de 2016 e os programas nucleares da Coreia do Norte e do Irão. Para o lugar de Coats, o Presidente Trump nomeou o congressista John Ratcliffe, um dos seus mais fortes apoiantes no Partido Republicano.
Dan Coats, de 76 anos, era um dos últimos responsáveis de topo na Casa Branca alinhado com a ala mais tradicional do Partido Republicano, e um dos poucos que não tem um passado de apoio incondicional ao Presidente Trump.
Eleito no estado do Indiana durante 24 anos – primeiro para a Câmara dos Representantes e depois para o Senado –, Coats foi também embaixador dos EUA em Berlim entre 2001 e 2005.
Nessa altura, foi um apoiante da guerra no Iraque e contribuiu para a aproximação entre a Casa Branca de George W. Bush e a então líder da oposição alemã, Angela Merkel – também ela apoiante da intervenção militar norte-americana contra a posição do chanceler Gerhard Schröder.
O cargo de director dos Serviços Secretos, que Coats vai ocupar até ao dia 15 de Agosto, foi criado em 2005 para coordenar as várias agências de espionagem norte-americanas. Uma necessidade sentida no país na sequência das falhas de comunicação nos anos que antecederam os atentados terroristas de 11 de Setembro de 2001 em Nova Iorque e no Pentágono.
"Dizer a verdade ao poder"
Desde que foi nomeado pelo Presidente Trump para o cargo e confirmado pelo Senado, em 2017, Dan Coats nunca deixou de contradizer publicamente a Casa Branca. Na hora da saída, foi elogiado por figuras ligadas ao Partido Republicano e ao Partido Democrata.
“O meu amigo e antigo colega Dan Coats dedicou décadas da sua vida ao serviço do nosso país. Fiquei tranquilo por saber que na liderança da nossa comunidade de serviços secretos estava um homem como ele, com uma abordagem imparcial, ponderada e previdente”, disse o líder da maioria do Partido Republicano no Senado, Mitch McConnell.
No lado do Partido Democrata, os elogios vieram do vice-presidente da Comissão de Serviços Secretos do Senado, Mark Warner: “A missão dos serviços secretos é dizer toda a verdade ao poder. Como director, Dan Coats manteve-se fiel a essa missão.”
A tensão entre Coats e o Presidente Trump foi visível em várias ocasiões.
Em 2018, quando o Presidente norte-americano se encontrou com o Presidente russo, Vladimir Putin, em Helsínquia, Dan Coats reafirmou que as agências de serviços secretos norte-americanas concluíram que a Rússia interferiu nas eleições presidenciais de 2016 nos EUA.
No final da cimeira na Finlândia, o Presidente Trump repetiu a versão de Moscovo quando foi questionado sobre se acreditava nas conclusões das agências norte-americanas sobre a interferência russa: “O Presidente Putin diz que não foi a Rússia. Não vejo nenhuma razão para que tenha sido.”
Poucos dias depois, a meio de uma entrevista numa conferência sobre segurança em Aspen, no estado do Colorado, Dan Coats reagiu com surpresa e sarcasmo à notícia de que Trump teria convidado Putin para visitar a Casa Branca: “Pode repetir?”, disse o responsável à entrevistadora, perante a gargalhada da audiência. “Bem, isso vai ser especial.”
O director demissionário também discorda das posições do Presidente dos EUA sobre o Irão e a Coreia do Norte. Enquanto Trump diz que Teerão violou o acordo internacional sobre o seu programa nuclear e que Pyongyang admite entregar as suas armas nucleares, Coats diz precisamente o contrário – afirma que o Governo iraniano não está perto de desenvolver armas nucleares e que o regime norte-coreano nunca admitirá perder o seu poder nuclear.
Apoio no Congresso
No domingo, o Presidente norte-americano anunciou no Twitter que escolheu o congressista John Ratcliffe para substituir Dan Coats. Esta escolha depende ainda de uma confirmação pela maioria do Senado (o Partido Republicano tem 53 senadores e o Partido Democrata tem 47, mas são conhecidas as críticas de alguns senadores republicanos ao nome proposto pelo Presidente Trump).
“Tenho o prazer de anunciar que o muito respeitado congressista John Rattcliffe, do Texas, será nomeado por mim director dos Serviços Secretos. Antigo procurador, o John vai liderar e inspirar grandeza pelo país que ama”, disse Trump, limitando-se a agradecer o serviço do director demissionário: “Dan Coats, o actual director, vai sair do cargo no dia 15 de Agosto. Quero agradecer ao Dan pelo grande serviço prestado ao nosso país.”
John Ratcliffe, de 53 anos, tem-se destacado nos últimos anos como um dos mais fortes apoiantes do Presidente Trump na Câmara dos Representantes, um lugar que ocupa desde que foi eleito em 2014 com o apoio do movimento conservador Tea Party.
No final de 2016, foi considerado o segundo congressista mais conservador do país, e o mais conservador no estado do Texas, pela organização Heritage Action for America, do grupo Heritage Foundation.
Em 2017, apoiou o decreto do Presidente Trump que proibiu a entrada nos EUA de cidadãos de países de maioria muçulmana, mas foram as suas duras críticas à investigação do procurador especial Robert Mueller, sobre a interferência da Rússia nas eleições de 2016, que lhe valeram a atenção da Casa Branca.
No Twitter, Ratcliffe mostrou-se “profundamente agradecido ao Presidente Trump pela oportunidade de liderar os serviços secretos”.
“Não podia ignorar o convite do Presidente Trump, e estou-lhe incrivelmente agradecido por esta grande honra”, disse o congressista.
Ataque a Robert Mueller
Na semana passada, dias depois de ter sido entrevistado para o cargo que poderá vir a ocupar, Ratcliffe foi um dos congressistas mais agressivos durante a audição de Robert Mueller na Comissão de Serviços Secretos da Câmara dos Representantes.
O congressista do Texas partilha a ideia, muito difundida nos sectores mais conservadores do Partido Republicano, de que o Presidente Trump foi vítima de uma campanha negra coordenada pelo Partido Democrata nas eleições de 2016. Segundo esta tese, o dossier que foi entregue ao FBI pelo antigo agente britânico Christopher Steele, com informações não confirmadas de que Trump participou em orgias com prostitutas na Rússia e outras acusações, foi preparado pelo Partido Democrata com o objectivo de dar crédito à suspeita de conspiração.
O dossier em causa foi encomendado a Christopher Steele pela empresa Fusion GPS, contratada pela direcção do Partido Democrata em Abril de 2016, durante as eleições primárias no Partido Republicano e no Partido Democrata, para encontrar informações comprometedoras sobre Trump – um trabalho comum entre campanhas adversárias.
A empresa Fusion GPS fez o mesmo trabalho de investigação sobre Trump e outros candidatos do Partido Republicano, entre Outubro de 2015 e Maio de 2016, a pedido do site conservador Washington Free Beacon. Entre Abril e Maio de 2016, a Fusion GPS trabalhou, ao mesmo tempo mas de forma independente, para o Partido Democrata e para o site conservador.
O Presidente Trump e os seus apoiantes, como o congressista agora nomeado para o cargo de director dos Serviços Secretos, dizem que o dossier de Christopher Steele foi a razão para o lançamento da investigação que viria a ser liderada pelo procurador especial Robert Mueller. Mas os responsáveis dos serviços secretos, como o ex-director do FBI James Comey – despedido em Maio de 2018 pelo Presidente Trump – dizem que já havia uma investigação em curso antes de as autoridades terem recebido aquele dossier.
A investigação da equipa de Mueller, cujas conclusões foram apresentadas em Abril, durou quase dois anos, teve a participação de 19 experientes advogados e 40 agentes do FBI e produziu um relatório com 448 páginas. Durante esse período, 42 pessoas foram ouvidas pelos investigadores ou depuseram perante um grande júri, e 34 pessoas e três empresas foram acusadas formalmente ou deram-se como culpadas. Foram feitas 500 entrevistas a testemunhas e emitidos 500 mandados de busca e 2800 intimações.
No final, a equipa do procurador Mueller não encontrou “provas concretas” de uma coordenação entre a campanha de Donald Trump e o Governo russo para prejudicar Hillary Clinton nas eleições de 2016. Quanto à suspeita de que o Presidente Trump tentou sabotar a investigação, a equipa do procurador especial decidiu à partida que não iria formular uma acusação (seguindo a política do Departamento de Justiça, segundo a qual um Presidente em exercício não pode ser acusado), e decidiu descreveu dez casos que podem ser vistos como obstrução da Justiça.
Na audição da semana passada, o congressista John Ratcliffe centrou muitas das suas acusações contra Robert Mueller na conclusão do relatório sobre a suspeita de obstrução da Justiça – o procurador especial disse que, apesar de ter decidido à partida que não iria acusar o Presidente, também não pode “exonerá-lo”.
“Concordo com a sua conclusão de que a interferência da Rússia foi abrangente e sistemática”, disse o congressista a Robert Mueller. “Agora quero descobrir se a Rússia interferiu nas nossas eleições dando falsas informações a Christopher Steele sobre uma conspiração de Trump que você determinou que não existiu”, disse Ratcliffe.