Portugal precisa de um Consenso Estratégico sobre Produtividade
Desde a adesão às comunidades europeias não houve uma liderança estratégica capaz de estabelecer um objectivo mobilizador para a sociedade portuguesa.
A produtividade traduz o nível de vida das populações. Portugal é mais pobre do que a Alemanha ou Holanda porque é menos produtivo. Mas para sermos mais produtivos não é necessário que os portugueses estejam mais tempo no local de trabalho. Os portugueses já passam mais horas no trabalho do que alemães ou holandeses, mas uns estarão a trabalhar de uma forma pouco produtiva e outros não estarão sequer a trabalhar.
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A produtividade traduz o nível de vida das populações. Portugal é mais pobre do que a Alemanha ou Holanda porque é menos produtivo. Mas para sermos mais produtivos não é necessário que os portugueses estejam mais tempo no local de trabalho. Os portugueses já passam mais horas no trabalho do que alemães ou holandeses, mas uns estarão a trabalhar de uma forma pouco produtiva e outros não estarão sequer a trabalhar.
É para que os portugueses possam estar menos horas no local de trabalho e tenham um melhor nível de vida que a produtividade deve ser uma prioridade para a sociedade portuguesa. Daí a necessidade de haver um consenso estratégico que seja transversal a governos, a partidos e a profissionais de todas as áreas.
O exemplo da Irlanda ajuda-nos a perceber porquê. O país era relativamente atrasado nos anos 1950 e a sociedade chegou a um consenso estratégico que se consolidou progressivamente e que incluiu governo, oposição, empresas e sindicatos: orientar a Irlanda para o exterior.
A sociedade abandonou políticas proteccionistas de fomento nacional, apostando na competitividade fiscal e em instituições públicas criadas para atrair investimento estrangeiro e fomentar exportações.
A alteração estrutural e a exigência acrescida daí resultante levaram a um reforço significativo da educação e formação a partir dos anos 1960. Mas o aumento da escolaridade e do ensino superior técnico e universitário não foi feito pela razão vaga de que é necessário investir na educação. A escolha foi direccionar esta aposta para as novas necessidades das empresas que a abertura ao exterior trazia.
Estas e outras políticas na área das infra-estruturas e do ambiente institucional foram sendo reforçadas e adaptadas nas décadas seguintes, tendo sempre em vista o objectivo estratégico do país. A aposta irlandesa beneficiou com a segunda globalização nos anos 1980 e com o acesso sem barreiras ao Mercado Único europeu nos anos 1990. A Irlanda tornou-se um dos países mais ricos da Europa, e os irlandeses não só têm hoje um elevado nível de vida como não passam muitas horas no trabalho.
Habitualmente associa-se este desenvolvimento ao investimento estrangeiro captado pelo país nas últimas décadas, pois desde os anos 1950 que existe uma política contínua de base institucional e fiscal com este fim. Mas o nível de investimento na Irlanda nunca foi significativamente superior ao que se realizou em Portugal. O desenvolvimento da Irlanda deveu-se essencialmente a melhor capital humano, orientado para as necessidades das empresas, e melhores infra-estruturas físicas e institucionais.
Dito de outra forma, o sucesso da Irlanda deveu-se ao crescimento mais rápido da produtividade por via de um maior nível de eficiência agregada. Em termos simples, os irlandeses passaram a trabalhar menos e muito melhor.
Um Consenso Estratégico sobre Produtividade
Os portugueses implementaram a primeira estratégia global a partir do século XV, abrangendo o Atlântico e Índico, e três continentes: África, Ásia e Europa. Hoje, o contexto é outro, diferente do século XV e dos anos 1950. Mas a ambição deveria ser a mesma.
Portugal tem seguido opções estratégicas baseadas na competitividade e na internacionalização da economia, focando-se no triângulo Europa-África-Brasil e juntando a integração europeia ao reforço das relações com os PALOP. Mas esta aposta numa estratégia bidimensional Europa-Atlântico tem sido insuficiente para garantir um aumento mais rápido do desenvolvimento económico.
Esta insuficiência indica que Portugal, um país com influência reduzida a nível internacional, com um mercado doméstico pequeno e pouco aberto ao exterior em termos económicos, deve procurar novas fontes de rendimento fora da Europa, em regiões onde a dinâmica populacional e económica for muito superior e as empresas portuguesas consigam ganhar dimensão e competir pela qualidade dos seus produtos e serviços.
Este pode ser o ponto de partida para um consenso estratégico que aposte no crescimento da produtividade em Portugal. Mas para que isso seja uma realidade, falta reforçar a capacidade de acção estratégica em Portugal: uma liderança que, com estruturas de apoio apropriadas, defina um objectivo de longo prazo e prioridades na sua implementação em todas as áreas relevantes, considerando o contexto global, e riscos e obstáculos.
Desde a adesão às comunidades europeias não houve uma liderança estratégica capaz de estabelecer um objectivo mobilizador para a sociedade portuguesa. A ideia referência reafirmada por sucessivos governos foi sempre a melhoria das condições de vida da população, o que abrange o crescimento económico e as diferentes dimensões do desenvolvimento sustentável. Mas estes objectivos são comuns a todas as sociedades e não chegam para a definição de uma estratégia própria e original.
Num contexto em que o centro do sistema internacional se desloca do Atlântico para o Pacífico e para o Índico e se fracciona em diferentes agentes (empresas, ONGs, etc.), Portugal corre o risco de cair numa situação de dependência absoluta face a uma Europa com uma população estagnada e uma dinâmica económica muito limitada.
Portugal substituiu o afunilamento na manutenção do Império no Estado Novo com o afunilamento na UE e a dependência de fundos europeus, “abandonando” a presença no Oriente e adoptando uma atitude meramente reactiva de copiar as opções económicas de países mais desenvolvidos e com mais recursos.
Mas uma aposta limitada à sucessiva imitação das políticas das nações mais desenvolvidas dificilmente conduzirá a uma convergência das condições de vida dos portugueses com as populações desses países. Um consenso estratégico sobre produtividade seria mais do que simplesmente reagir ao curso dos acontecimentos.
Como Democracia que ambiciona o melhor nível de vida para a sua população, Portugal precisa de construir um consenso estratégico que reforce a sua interdependência face ao resto do Mundo e que previna situações futuras de dependência absoluta. Coordenador do Conselho para a Produtividade