A reforma chegou para Alan Moore, génio dos comics, com a publicação do seu último livro
Quarto volume de Liga dos Cavalheiros Extraordinários confirma a despedida do autor de Watchmen e V de Vingança.
Em 2016 já era um facto: Alan Moore estava a trabalhar no seu último livro e depois seguir-se-ia a reforma de um dos mais importantes escritores de banda-desenhada de sempre. Três anos depois, o último volume de Liga dos Cavalheiros Extraordinários foi publicado e o fim da carreira do criador de V de Vingança e Watchmen concretiza-se. O britânico que nunca aceitou o termo que simboliza o seu próprio contributo para uma nova dignidade da BD, “novela gráfica", é autor de algumas das novelas gráficas que mais influência tiveram na cultura contemporânea, das máscaras dos Anonymous à adoração de Hollywood pelo universo dos comics e à própria forma como estes passaram a contar as suas histórias.
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Em 2016 já era um facto: Alan Moore estava a trabalhar no seu último livro e depois seguir-se-ia a reforma de um dos mais importantes escritores de banda-desenhada de sempre. Três anos depois, o último volume de Liga dos Cavalheiros Extraordinários foi publicado e o fim da carreira do criador de V de Vingança e Watchmen concretiza-se. O britânico que nunca aceitou o termo que simboliza o seu próprio contributo para uma nova dignidade da BD, “novela gráfica", é autor de algumas das novelas gráficas que mais influência tiveram na cultura contemporânea, das máscaras dos Anonymous à adoração de Hollywood pelo universo dos comics e à própria forma como estes passaram a contar as suas histórias.
Alan Moore tem 65 anos e a sua escrita redefiniu heróis do século XX como Batman (The Killing Joke, com o artista Brian Bolland) e ofereceu novos olhares sobre o mercado dos super-heróis com Miracleman ou o negrume político e psicológico de Watchmen desenhado por Dave Gibbons. Publicadas na década de 1980, essas novelas gráficas acabariam por ditar o tom e a abordagem que muitos outros autores viriam a adoptar ao criar novas vinhetas e argumentos. Ao lado do ilustrador David Lloyd criou V de Vingança, cujas máscaras de Guy Fawkes se transformaram num “símbolo universal de resistência à opressão”, como disse o desenhador ao PÚBLICO em 2016, adoptadas pelo grupo Anonymous e propagadas na era da austeridade por movimentos como Occupy ou Indignados. Moore apoiou o uso da máscara que Lloyd desenhou para a sua história em V de Vingança pelo movimento Occupy.
Figura avessa aos media, não lhe é conhecida uma palavra de apreço por outro dos fenómenos populares que tocou – a adaptação das suas obras para filmes, uma tendência Hollywoodesca que se tornou no mainstream do cinema das últimas décadas. Liga dos Cavalheiros Extraordinários, que marca agora a sua despedida oficial com o seu quarto volume intitulado The Tempest, é a sua obra final e também o nome de um desses filmes que renegou. E cuja produção atribulada levou mesmo Sean Connery a abandonar o cinema em 2003. From Hell, V de Vingança, Watchmen são outros dos seus escritos adaptados para cinema, além de ter influenciado as abordagens e guiões de filmes como os que constam da trilogia Batman realizada por Christopher Nolan. O filão não se esgota e Watchmen será uma série da HBO dentro de alguns meses.
O final anunciado da sua carreira põe fim ao percurso de, como centra Sam Thielman no diário britânico The Guardian no universo mais alargado da literatura, “um dos escritores de ficção mais significativos da língua inglesa”. Alan Moore assinou também dois romances, Jerusalem e Voice of the Fire, e também desenha. Trabalhou com as duas grandes editoras de comics norte-americanas, a Marvel e a DC, mas também com chancelas de menor dimensão ou maior liberdade criativa como a Image.
Abandona, como disse ao Guardian em 2016, por sentir que já fez “o suficiente na BD. Fiz tudo o que podia. Penso que se continuasse, inevitavelmente, as ideias iriam ressentir-se e ver-me-iam a cozinhar velhas receitas e penso que vocês e eu merecemos algo mais do que isso.” Numa entrevista em 2011, apontava críticas no mesmo espírito às majors do sector: “A indústria dos comics provavelmente já excedeu há muito o seu potencial total”, disse à chancela britânica Honest Publishing, “sem ideias originais que a sustenham”.