O Mexe leva as artes performativas aos bairros do Porto com um cartaz feito para todos

Entre 16 a 22 de Setembro, mais de 70 apresentações de seis países diferentes, quase todas gratuitas, passam por 22 espaços fora do circuito artístico da cidade.

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O Mexe arranca no Jardim de São Lázaro NFACTOS/Fernando Veludo

Luísa Nascimento, nascida e criada nas Fontainhas, atira-se a um fado dedicado ao sítio onde mora desde criança. É daquela varanda para o Douro, zona de onde nos últimos anos muitos dos moradores mais antigos têm saído para outras sítios da cidade onde não se vê o rio, que faz juras de amor a um dos bairros mais carismáticos do Porto: “Varanda virada para o Douro, teus bairros são um tesouro. Eu choro quando te canto. Eu te amo Fontainhas”. 

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Luísa Nascimento, nascida e criada nas Fontainhas, atira-se a um fado dedicado ao sítio onde mora desde criança. É daquela varanda para o Douro, zona de onde nos últimos anos muitos dos moradores mais antigos têm saído para outras sítios da cidade onde não se vê o rio, que faz juras de amor a um dos bairros mais carismáticos do Porto: “Varanda virada para o Douro, teus bairros são um tesouro. Eu choro quando te canto. Eu te amo Fontainhas”. 

Mesmo antes de começar a cantar já tinha deixado cair umas lágrimas. Emociona-se quando ouve falar do sítio que considera ser a sua casa, como tinha acontecido antes de subir ao palco improvisado no lavadouro, daquele local, que ainda resiste. É com orgulho e de porta aberta que recebe quem vem de fora. E nesta segunda-feira foram muitos os que ali se deslocaram para assistir à apresentação do programa do 5º Mexe - Encontro Internacional de Arte e Comunidade, que desde 2011 faz chegar várias formas de arte a pontos da cidade onde normalmente ela não chega. Em 2019, entre 16 a 22 de Setembro, a fórmula repete-se, como tem vindo a acontecer, de dois em dois anos, desde que arrancou a primeira edição.

As Fontainhas são um desses sítios, perto geograficamente, mas longe do circuito artístico, habitualmente circunscrito à programação das várias salas de espectáculo que existem. No Mexe deste ano serviu de rampa de lançamento para o cartaz e é também parte do mesmo numa performance criada por Tânia Dinis, Viajar no Tempo dos Outros, na qual participam moradores e antigos moradores daquele sítio, onde a pressão imobiliária já chegou há alguns anos. 

Mas o evento, composto por 30 acções de música, teatro, dança, cinema, performances, instalações artísticas e oficinas de formação, que reúne mais de 400 participantes de seis países diferentes (Portugal, Brasil, Uganda, Tanzânia, Espanha e Itália), chega a muitos mais espaços. São 22 no total. 

Vai até ao Jardim de São Lázaro, um dos mais antigos da cidade, onde o Mexe arranca oficialmente a 16 de Setembro, com uma instalação de criação colectiva, Enxoval, Um Bordado a Muitas Mãos, uma espécie de “bordado feminista”, feito por mulheres e homens. No mesmo dia ali passa Vladimir Safatle, que vem da Universidade de São Paulo para esta conferência, e a peça Ilha-Jardim, produzida pela Pele, que co-produz o evento com o Mexe. 

Até ao encerramento, a 22 de Setembro, a Associação de Moradores do Bairro Social da Pasteleira, Associação Recreativa Malmequeres de Noêda, Escadaria da Igreja de Santo Ildefonso, as Estações de Campanhã e São bento, Feira do Cerco, as praças dos Poveiros e de Lisboa, Faculdade de Belas Artes, o Mira Artes Performativas ou a Escola Alexandre Herculano são outros espaços por onde se move o Mexe. 

Junta-se em apoio ao cartaz o TeCA: Teatro Carlos Alberto, numa parceria com o Teatro Nacional São João, - onde estarão em cena as peças Empty the Space, do Uganda, e Isto é um Negro? E Quem é Gosta?, do Brasil, as duas em estreia nacional, e o espectáculo de dança Synectikos, do Colectivo Lisarco, de Espanha, que trabalha com alguns bailarinos com Síndrome de Down -, e a Fundação de Serralves, que recebe na biblioteca uma conversa onde estarão presentes a Colectiva Ocupação, composta por 15 estudantes brasileiros que entre 2015 e 2016 ocuparam algumas das 100 escolas de São Paulo que o governo do estado queria fechar, conseguindo com esta acção que se mantivessem abertas e contribuindo para mudanças no próprio plano curricular. 

Esta acção deu origem à peça Quando Quebra Queima, que no dia de encerramento estreará em Portugal, na Escola Secundária Alexandre Herculano, e dará origem a uma marcha com partida neste ponto e terminará no Jardim de São Lázaro.

É neste jardim que se concentra a maior novidade desta edição com a criação do Mexe Praça. Durante todo o evento esta área funcionará como uma espécie de epicentro. Naquele ponto de encontro, além do já referido e de outros projectos do programa extenso, decorrerão os concertos do Coro da Fundação Manuel António da Mota, dos OUPA CERCO, de Fado Bicha e do Projecto TumTumTum. Outra novidade é o crowdfunding que a organização lançou para angariar dois mil euros que faltam para completar o orçamento total de 93 mil euros. 

Para esta edição estão marcadas ainda uma “mão cheia” de oficinas, conversas, apresentações de livros e instalações que envolverão directamente mais de 300 cidadãos do Porto. À excepção dos três espectáculos no TeCA, que custam 5 euros, todos os outros são de entrada gratuita e terão interpretação em Língua Gestual Portuguesa.

O director artístico do Mexe, Hugo Cruz, que apresentou o programa, lançou o desafio ao público para que a partir daqui se faça ouvir, avançando com sugestões para o festival que diz ser “inclusivo e aberto a todos” e que “aguenta a crítica”. Sublinhou que os dois anos de preparação do evento exigiram muito esforço. Porém prefere traduzir essa ideia de outra forma: “É uma trabalheira muito saudável”.