Fórum para o VIH/sida denuncia “retrocesso preocupante” com novo modelo de financiamento
Coordenadora do Programa Nacional para a Infecção VIH/sida assume mudanças, mas defende que “realidade anterior era perfeitamente insustentável”. Em causa está o modelo de financiamento dos projectos de base comunitária.
As alterações ao modelo de financiamento de projectos desenvolvidos ao abrigo Programa Nacional para a Infecção VIH/sida são um “retrocesso preocupante”, alegam as organizações que integram o Fórum Nacional da Sociedade Civil para o VIH/sida num comunicado enviado nesta quarta-feira.
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As alterações ao modelo de financiamento de projectos desenvolvidos ao abrigo Programa Nacional para a Infecção VIH/sida são um “retrocesso preocupante”, alegam as organizações que integram o Fórum Nacional da Sociedade Civil para o VIH/sida num comunicado enviado nesta quarta-feira.
Em Abril, a Direcção-Geral da Saúde (DGS) instituiu alterações ao modelo de financiamento dos projectos de base comunitária. Até agora, “os concursos públicos possibilitavam às organizações da sociedade civil implementar respostas abrangentes e adequadas junto de populações em situação de vulnerabilidade e de difícil acesso”, mas “passaram a prever apenas a realização de sessões de rastreio de infecções sexualmente transmissíveis”, lê-se em comunicado enviado pelo Fórum Nacional da Sociedade Civil para o VIH/sida.
“Este modelo apresenta-se como uma descontinuidade de financiamento e assume-se, sobretudo, como uma ruptura nos serviços integrados disponíveis na comunidade”, defendem as organizações que integram o fórum — a Abraço, a ILGA Portugal e o Grupo de Activistas em Tratamento (GAT) são três das 20 entidades que o constituem.
Contactada pelo PÚBLICO, Isabel Aldir, coordenadora do Programa Nacional para a Infecção VIH/sida, reconhece que houve alterações e explica porquê: "Nós financiávamos projectos de rastreio em que não havia uma ligação entre o número de sessões de rastreio e a atribuição do financiamento. Uma das situações que nós vínhamos a verificar é que havia organizações que estavam a ser financiadas com valores substanciais e que, por vezes, nem 100 sessões de rastreio por ano faziam.”
Outra das razões para a mudança tem a ver com a necessidade de encontrar as pessoas que estão infectadas mas não sabem e para isso é preciso aumentar o número de rastreios. "Felizmente, já atingimos as três metas da ONU/sida e temos 92% da população que tem a infecção já conhecedora do seu diagnóstico”, nota a coordenadora do programa nacional. Mesmo assim, estima, “falta-nos diagnosticar mais ou menos 3 mil pessoas”. "Isso é encontrar uma agulha no palheiro.”
A mudança “não foi uma decisão irreflectida”, garante Aldir. “Fizemos um levantamento exaustivo do modo de funcionamento [nos outros países].” E defende que manter a situação anterior seria "perfeitamente insustentável”.
21 euros por sessão
O Fórum Nacional da Sociedade Civil para o VIH/sida queixa-se da “significativa redução no valor máximo de financiamento” e da nova “metodologia do preço compreensivo”. Resultado: cada instituição recebe 21 euros por sessão de rastreio.
Isabel Aldir justifica esse número: “O GAT celebrou um contrato com a ARSLVT [Administração Regional de Saúde de Lisboa e Vale do Tejo] para fazer exactamente esta tarefa e cujo financiamento é de 21 euros.”
As organizações que integram o fórum alegam ainda que esta “lógica limitadora e economicista” levou à “impossibilidade de dar continuidade a serviços [de proximidade junto de públicos específicos]”. Sobre esta questão, Aldir detalha que “dois concursos ficaram vazios — um era na área de Aveiro e outro no Porto entre trabalhadores sexuais e seus clientes”. A responsável diz ainda que as “organizações é que decidiram não concorrer”, e defende que “se consideram o trabalho interessante, é melhor dar continuidade”.
Durante a tarde desta quarta-feira, a coordenadora do Programa Nacional para a Infecção VIH/sida e o Fórum Nacional da Sociedade Civil para o VIH/sida vão estar reunidos. “Claro que eu percebo o lado deles”, assegura Aldir.