Líderes afegãos e taliban dão primeiro passo para um “roteiro para a paz”
Encontro no Qatar termina com compromisso para proteger os civis no conflito e abre caminho a progressos nas negociações entre talibãs e os EUA para a retirada das tropas norte-americanas no território.
A cimeira entre líderes taliban e representantes de vários sectores da sociedade afegã, incluindo funcionários do Governo, em Doha, no Qatar, terminou com um compromisso promissor para se iniciar um “roteiro para a paz” e acabar com as vítimas civis, na guerra que se arrasta há 18 anos no Afeganistão.
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A cimeira entre líderes taliban e representantes de vários sectores da sociedade afegã, incluindo funcionários do Governo, em Doha, no Qatar, terminou com um compromisso promissor para se iniciar um “roteiro para a paz” e acabar com as vítimas civis, na guerra que se arrasta há 18 anos no Afeganistão.
Num comunicado conjunto, divulgado na noite de segunda-feira, as partes asseguraram um “compromisso para respeitar e proteger a dignidade, a vida e a propriedade da população, e a reduzir para zero o número de vítimas civis”. Para além disso, defenderam a urgência em “garantir a segurança das instituições públicas, como as escolas, as madraças, os hospitais, os mercados, as barragens e outros locais de construção”.
“É o primeiro passo na direcção certa e a redução das hostilidades é importante. É mais do que eu esperava antes destas conversas”, assumiu Anwar-ul-haq Ahadi, ex-ministro das Finanças afegão, em declarações à Al-Jazira. “Mas não podemos chamar-lhe acordo de paz”, alertou, no entanto.
O encontro juntou cerca de 50 políticos e activistas afegãos, incluindo dez representantes do movimento associativo feminino, que conseguiram incluir no comunicado a necessidade de protecção dos direitos das mulheres “dentro do enquadramento islâmico”.
“Não é um acordo, mas uma base para se iniciar a discussão. A parte boa é que ambas as partes concordaram”, disse à AFP Mary Akrami, directora-executiva da Rede de Mulheres Afegãs e delegada no encontro.
Segundo as Nações Unidas, mais de 3800 civis morreram – incluindo 900 crianças – e outros 7 mil ficaram feridos, só em 2018, o ano mais mortífero do conflito, iniciado em 2001. Nos primeiros três meses deste ano, o número de mortes superou as cinco centenas, a grande maioria vítimas de atentados terroristas reivindicados pelo grupo islamista.
A viabilização de um processo de paz depende, no entanto, de uma série de condições que ainda terão de ser negociadas e tratadas a nível governamental. Entre as exigências dos participantes na cimeira de dois dias Doha, iniciada no domingo, destaca-se a repatriação da população deslocada pela guerra e a “não-interferência” de actores regionais no processo.
O desfecho da reunião traz algum optimismo à próxima ronda de negociações entre representantes dos taliban e dos Estados Unidos, agendada para esta terça-feira. As delegações voltam a sentar-se à mesa, pela sétima vez, para discutir os termos da retirada das tropas norte-americanas do território, passo obrigatório para o grupo islamista – que controla partes do território do Afeganistão – aceitar reunir-se com o Governo afegão.
“As negociações continuarão até que as partes cheguem a um acordo claro para ser implementado. E o palco está agora montado para um acordo político entre os EUA e os taliban. Podemos esperar um anúncio dos EUA, muito brevemente, sobre a retirada das tropas”, disse um funcionário envolvido nas negociações à Reuters.
Também por essa recusa dos talibãs em discutir com o Presidente Ashraf Ghani é que a cimeira de Doha trouxe novidades importantes. Secunder Kermani, correspondente da BBC no Afeganistão, destaca o simbolismo da reunião e do comunicado conjunto.
“O simples facto de altos funcionários do Governo afegão e de representantes dos taliban se terem sentado, juntos, na mesma sala, é um passo significativo para um processo de paz”, sublinha Kermani. “Até agora, os taliban recusaram negociar directamente com a Administração de Ghani, considerando-a ilegítima. Mas o compromisso assumido neste encontro foi declararem que todos os participantes seriam avaliados pelas suas ‘capacidades pessoais’”.