Homicídios matam mais do que conflitos armados
Cerca de 464 mil pessoas em todo o mundo foram vítimas de homicídios em 2017, diz relatório da ONU. Um número superior às 89 mil mortes em guerras.
Cerca de 464 mil pessoas em todo o mundo foram vítimas de homicídios em 2017, número que supera as 89 mil mortes registadas em conflitos armados durante o mesmo ano, revela um relatório divulgado esta segunda-feira pela ONU.
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Cerca de 464 mil pessoas em todo o mundo foram vítimas de homicídios em 2017, número que supera as 89 mil mortes registadas em conflitos armados durante o mesmo ano, revela um relatório divulgado esta segunda-feira pela ONU.
O crime organizado foi responsável por 19% dos homicídios registados em 2017 e outra das principais conclusões do relatório Global Study on Homicide 2019 é que as vítimas dos assassínios contabilizados nesse mesmo ano foram maioritariamente do sexo masculino (80%).
O documento, da responsabilidade da agência das Nações Unidas para as Drogas e Crime (UNODC), também destaca, entre outros aspectos, que as mulheres assassinadas em 2017, num total de 87 mil, foram mortas na maioria dos casos de forma intencional por familiares e pelos companheiros.
“O estudo procura clarificar o quadro relativo aos assassínios relacionados com as questões de género, com a violência de grupos organizados e com outros aspectos, para apoiar a prevenção e as intervenções necessárias para reduzir as taxas de homicídio”, disse o director-executivo da UNODC, Yury Fedotov, citado num comunicado.
“Os países comprometeram-se com metas, ao abrigo dos objectivos para o desenvolvimento sustentável, para reduzir todas as formas de violência e as respectivas taxas de mortalidade até 2030”, lembra o representante.
O relatório assinado pela UNODC indica que o número total de pessoas no mundo que foram assassinadas aumentou nos últimos 25 anos, de 395.542 em 1992 para 464 mil em 2017. No entanto, e como realça o documento, uma vez que a população mundial cresceu a um ritmo mais rápido do que o aumento registado de vítimas de homicídios, o risco global de uma pessoa ser assassinada tem vindo a diminuir de forma constante.
Em 1992, a taxa média global de homicídios registada era de 7,2 por cada 100 mil pessoas. Um quarto de século depois, a taxa média de homicídios para cada grupo de 100 mil pessoas foi de 6,1. Uma das conclusões apresentadas pelo documento é o peso que o crime organizado tem no número total de homicídios registados a nível mundial.
“Só o crime organizado foi responsável por 19% de todos os homicídios em 2017”, sublinha o estudo, destacando ainda que “desde o início do século XXI” a violência de grupos criminosos organizados “matou tantas pessoas como todos os conflitos armados em todo o mundo no seu conjunto”.
Ainda neste capítulo, a UNODC frisa que, tal como acontece com conflitos armados, o crime organizado “desestabiliza os países, mina o desenvolvimento socioeconómico e corrói o Estado de Direito”.
A agência da ONU também mostra as disparidades e as particularidades existentes quando a análise é focada na questão do género. Globalmente, cerca de 80% das vítimas de homicídios registadas em 2017 eram homens ou jovens adultos e mais de 90% dos suspeitos deste tipo de crime eram também do sexo masculino.
Já no caso das vítimas do sexo feminino, e com base nas estimativas de mais de 40 países, a UNODC refere que um total de 87 mil mulheres foram mortas de forma intencional em 2017. Mais de metade (58%), cerca de 50 mil, foram mortas pelos respectivos companheiros ou familiares, o que significa que, por dia, 137 mulheres em todo o mundo são mortas por um membro da sua própria família. “Mais de um terço (30.000) das mulheres foram mortas intencionalmente pelo seu parceiro, actual ou antigo, alguém que normalmente esperariam confiar”, destaca o estudo.
A agência da ONU observa também que as taxas de homicídio variam muito em termos geográficos, indicando que os continentes americano e africano são as regiões do mundo com a maior incidência deste tipo de crime.
“A taxa média global de homicídios [6,1 em cada grupo de 100 mil pessoas] mascara variações regionais dramáticas”, diz o relatório, revelando que a taxa observada no continente americano (17,2) foi a mais alta registada naquela região desde 1990, ano em que começaram a ser recolhidos dados relacionados com esta matéria.
A taxa de África (13 em cada 100 mil pessoas) também estava acima da média global, enquanto os níveis da Ásia (2,3), Europa (3,0) e Oceânia (2,8) estavam abaixo da média global.
Em tom de conclusão, a UNODC defende que a aplicação de intervenções direccionadas e eficazes para combater a prática deste crime “exige uma compreensão abrangente da escala e dos respectivos catalisadores”. Entre esses “catalisadores”, segundo frisa o estudo, estão “as desigualdades sociais, o desemprego, a instabilidade política, a prevalência de estereótipos de género na sociedade e a presença do crime organizado”.
Para reduzir a taxa de crimes violentos, a agência da ONU considera ser fundamental “um modelo de governação centrado no Estado de Direito, um controlo da corrupção e um investimento no desenvolvimento socioeconómico, incluindo na área da educação”. O acesso às armas de fogo, as drogas e o álcool, igualmente considerados como “facilitadores do homicídio”, precisam ser igualmente abordados, conclui o estudo.