Parlamento Europeu ameaça travar nomeação de Ursula von der Leyen
Líderes europeus atiram para o lixo sistema dos cabeças de lista e arriscam confronto com os eurodeputados ao nomear a ministra alemã para a presidência da Comissão.
A ministra da Defesa da Alemanha, Ursula von der Leyen, é a aposta dos líderes europeus para suceder a Jean-Claude Juncker na chefia do executivo comunitário. Numa reviravolta surpreendente engendrada pela chanceler alemã, Angela Merkel, para desbloquear o processo negocial para a distribuição dos cargos de topo das instituições comunitárias, os 28 chefes de Estado e de Governo da União Europeia aceitaram fazer tábua rasa das posições defendidas até aqui e numa penada deitaram fora todos os cabeças de lista que se apresentaram nas eleições europeias.
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A ministra da Defesa da Alemanha, Ursula von der Leyen, é a aposta dos líderes europeus para suceder a Jean-Claude Juncker na chefia do executivo comunitário. Numa reviravolta surpreendente engendrada pela chanceler alemã, Angela Merkel, para desbloquear o processo negocial para a distribuição dos cargos de topo das instituições comunitárias, os 28 chefes de Estado e de Governo da União Europeia aceitaram fazer tábua rasa das posições defendidas até aqui e numa penada deitaram fora todos os cabeças de lista que se apresentaram nas eleições europeias.
Foi uma jogada arriscada e que não oferece totais garantias de vir a ser bem-sucedida. Do Parlamento Europeu (PE), que terá agora de votar a nomeação de Von der Leyen, vieram imediatamente críticas à solução. “Espero que o Conselho não tenha subavaliado a importância do PE e a sua capacidade de decisão”, afirmou o primeiro-ministro, António Costa, que votou a favor do compromisso.
“Não sou profeta e não me compete a mim avaliar as reais hipóteses de sucesso [deste acordo] no Parlamento. Penso que os primeiros-ministros farão tudo para convencer os colegas no PE a aprovar a solução”, declarou o presidente do Conselho Europeu, Donald Tusk, cuja condução das negociações foi muito criticada pelos líderes.
Muitos eurodeputados, com os socialistas do alemão SPD à cabeça, insurgiram-se contra o acordo, por este desrespeitar o sistema de escolha de um dos Spitzenkandidaten. Esta oposição levou, aliás, a que a Alemanha tivesse sido o único país a se abster na votação do Conselho: Angela Merkel não podia endossar uma proposta que não tem o apoio do outro partido da coligação.
“Foi muito claro no Conselho que o sistema dos Spitzenkandidaten não era uma obrigação legal que tivesse de ser cumprida. Mesmo assim, penso que o resultado final é uma demonstração de que os lideres quiseram respeitar tanto os cabeças de lista como o próprio mecanismo”, justificou Tusk.
O impasse que se prolongou por três dias de cimeira extraordinária em Bruxelas foi vencido com base na proposta desenhada pela líder alemã para vencer a minoria de bloqueio constituída pelos países do grupo de Visegrado e alguns líderes conservadores do PPE (Croácia, Irlanda, Letónia e Roménia), que se juntaram numa frente comum de bloqueio ao chamado “acordo de Osaca” que esteve em cima da mesa e acabou por ser retirado da discussão pelo presidente do Conselho Europeu, Donald Tusk, ao fim de 18 horas de negociação inconclusiva.
A chanceler prescindiu da nomeação de um dos Spitzenkandidaten para a presidência da Comissão e assim conseguiu manter o executivo comunitário nas mãos do PPE. Depois de muito se ter dito sobre uma eventual transferência de poder do centro-direita para o centro-esquerda, Merkel ultrapassou a concorrência socialista e assegurou que a sua família política continuará a dominar o xadrez comunitário.
O compromisso funcionou porque a moeda de troca nas negociações exigida pelo Presidente francês, Emmanuel Macron, lhe foi garantida: a francesa Christine Lagarde, actual directora do Fundo Monetário Internacional, será a próxima presidente do Banco Central Europeu e responsável pela política monetária da União. Os líderes tinham dito que a indicação do sucessor de Mario Draghi não faria parte deste pacote global de nomeações, uma vez que a selecção do presidente do banco central assenta em critérios mais técnicos do que políticos. Mas, para garantir o apoio da França, e também para que os líderes pudessem cumprir a sua promessa de promoção da igualdade de género, o nome de Lagarde foi incluído na solução de compromisso: pela primeira vez na história, haverá duas mulheres à frente de instituições comunitárias.
Os liberais, que ao lado dos socialistas viram no resultado das eleições europeias uma oportunidade de ouro para quebrar o domínio do PPE e se projectarem para os lugares cimeiros das instituições europeias, podem festejar a indicação de Charles Michel para a presidência do Conselho Europeu. O primeiro-ministro belga, que se encontra em funções desde Dezembro quando o partido nacionalista flamengo NVA fez desmoronar a coligação de Governo, comprometeu-se a “respeitar a diversidade nacional” e a fazer valer os princípios de solidariedade, liberdade e respeito mútuo” em que assenta a União Europeia,
Já os socialistas tiveram de se resignar com a manutenção dos mesmos cargos que lhes foram atribuídos em 2014: a presidência do PE e o alto-representante da União Europeia para a Segurança e Política Externa. O ministro dos Negócios Estrangeiros de Espanha, Josep Borrell, foi o homem escolhido para o cargo. Quanto ao nome para o PE, terá agora de ser indicado pelo grupo dos Socialistas & Democratas, no pressuposto de que obterá os votos necessários das outras bancadas para alcançar a maioria necessária para ser eleito.
Depois de quase terem conseguido concretizar a sua ambição de regressar à liderança do executivo comunitário, com a nomeação do holandês Frans Timmermans, o desfecho não pode ser apresentado como uma vitória para os socialistas. António Costa, que foi um dos negociadores da sua família política, reconheceu que este “não foi o melhor resultado”. Mas destacou a atitude construtiva e responsável dos socialistas, que, confrontados com o bloqueio dos “países do PPE que são perigosamente permeáveis às pressões e ao canto de sereia do senhor Salvini e da sua base territorial nos países de Visegrado”, privilegiaram o compromisso que evita a paralisia institucional e “permite à Europa seguir em frente”. “Imitar minorias de bloqueio é a pior forma de as combater”, afirmou.
O compromisso inclui um prémio de consolação para Timmermans, que cumprirá um segundo mandato como primeiro vice-presidente da Comissão Europeia, e também para a cabeça de lista dos liberais, a dinamarquesa Margrethe Vestager, que deixará a pasta da Concorrência e será promovida a vice-presidente. Os dois pertencem a partidos que não estão no governo nos respectivos países, mas os líderes nacionais confirmaram que os vão indicar para o executivo comunitário.
Já o cabeça de lista do PPE, Manfred Weber, terá a possibilidade de ser eleito presidente do PE na segunda metade da legislatura. O eurodeputado alemão, que foi reeleito líder da bancada dos democratas-cristãos no Parlamento Europeu, anunciou o fim da sua jornada como Spitzenkandidat.
Os países do grupo de Visegrado e os membros do PPE que ensaiaram uma revolta contra Merkel para travar a nomeação de Timmermans para a Comissão saíram vencedores no braço de ferro que mantiveram com a chanceler alemã e o Presidente francês, Emmanuel Macron. Conseguiram arrasar com o chamado “acordo de Osaca”, que punha fim ao domínio do centro-direita no executivo comunitário, e ainda recolheram louros por fazer aprovar o plano B que elevou Von der Leyen à presidência da Comissão.
Aliás, através do seu porta-voz, o primeiro-ministro da Hungria, Viktor Orbán, reclamou a autoria dessa solução. “Na sua unidade, o grupo de Visegrado demonstrou mais uma vez a sua crescente força e influência sobre a direcção da UE. Depois de derrotarem Weber, os quatro países eliminaram Timmermans e puseram em cima da mesa um pacote para a eleição de Ursula von der Leyen que pode ser aceite por todos”, escreveu Zoltan Kovacs no Twitter.
“Manifestamente, não é verdade”, desmentiu António Costa.