Moeda do Facebook traz novos riscos para a banca global
O alerta é deixado num relatório do Banco de Pagamentos Internacionais que analisou a entrada das grandes empresas tecnológicas no sector financeiro: a “libra” pode ameaçar a estabilidade financeira, concorrência e protecção de dados.
Os planos do Facebook para criar uma criptomoeda, em paralelo com as iniciativas da Amazon ou da Alibaba que também já disponibilizam meios próprios de pagamento digital, colocam riscos ao sistema bancário internacional e exigem uma resposta rápida e integrada dos decisores políticos ao nível da concorrência e protecção dos dados dos utilizadores.
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Os planos do Facebook para criar uma criptomoeda, em paralelo com as iniciativas da Amazon ou da Alibaba que também já disponibilizam meios próprios de pagamento digital, colocam riscos ao sistema bancário internacional e exigem uma resposta rápida e integrada dos decisores políticos ao nível da concorrência e protecção dos dados dos utilizadores.
O alerta é deixado num relatório do Banco de Pagamentos Internacionais (BIS, na sigla inglesa), um organismo criado pelos bancos centrais de todo o mundo que analisou as vantagens e os riscos da entrada das grandes empresas tecnológicas no sector financeiro.
Empresas como a Alibaba, Amazon, Facebook ou a Google cresceram rapidamente nas últimas duas décadas, baseando-se num modelo assente nas interacções de um elevado número de utilizadores, refere o relatório. A Alibaba e o eBay disponibilizam serviços de pagamento como Alipay e o PayPal. Outras empresas usam as suas plataformas como um canal de distribuição de produtos de terceiros, incluindo seguros automóveis ou de saúde. Outros ainda aventuraram-se na área do crédito, dirigido sobretudo a pequenas empresas e consumidores e emprestando pequenas quantias por curtos períodos.
A disponibilização destes serviços, nota o BIS, tem vantagens mas traz também desafios “complexos” ao nível da estabilidade financeira, da concorrência e da protecção de dados. Por isso, alerta, os decisores políticos devem olhar de forma integrada para estes problemas.
“O objectivo deve ser responder à entrada das grandes tecnológicas nos serviços financeiros, de modo a beneficiar dos ganhos, limitando os riscos. Como as operações destas empresas abrangem diferentes perímetros regulatórios e fronteiras geográficas, a coordenação entre autoridades — nacionais e internacionais — é crucial”, lê-se no relatório divulgado neste domingo, depois de o Facebook ter anunciado o lançamento de uma moeda digital.
Os reguladores também têm um papel determinante e o BIS entende que lhes cabe “garantir condições equitativas entre as grandes empresas e os bancos, tendo em conta a ampla base de clientes das grandes tecnológicas, o acesso à informação e os modelos de negócios abrangentes”.
No relatório, o organismo internacional reconhece que os serviços financeiros disponibilizados pelas tecnológicas trazem também vantagens, dando como exemplo o facto de estas empresas poderem fornecer serviços financeiros básicos em lugares onde grande parte da população continua sem acesso a serviços bancários. Por outro lado, o facto de estas empresas terem acesso a uma grande quantidade de dados, permite-lhes avaliar o risco dos tomadores de empréstimos, reduzindo a necessidade de garantias para assegurar o pagamento.
As grandes tecnológicas, afirma o BIS, “estão posicionadas para aumentar a eficiência da prestação de serviços financeiros, promover a inclusão financeira e permitir ganhos associados à actividade económica”.
Na semana passada, o Facebook anunciou que está a preparar um novo sistema de pagamento assente na tecnologia da bitcoin. A intenção é que a nova criptomoeda (que terá a denominação “libra”) e a carteira electrónica para a guardar (a Calibra) estejam prontas no próximo ano, permitindo processar pagamentos e transferências online a partir de aplicações como o Messenger e o WhatsApp, sem depender dos bancos tradicionais.
Tal como a bitcoin, a “libra” vai circular numa base de dados descentralizada (a blockchain da “libra”) e de código aberto. Mas, contrariamente à bitcoin, a “libra” começa por estar suportada por uma reserva de moedas fiduciárias, como o dólar norte-americano, e para garantir alguma estabilidade à nova moeda cada membro fundador da associação deve contribuir com pelo menos dez milhões de dólares (perto de nove milhões de euros) durante a fase inicial.
A rede social não vai gerir directamente a nova moeda digital e entregou essa responsabilidade a uma associação de 28 empresas e organizações não governamentais, que inclui a Visa, a Uber, o Spotify e a loja de roupa online Farfetch (que tem parte das operações em Portugal). Porém, o Facebook vai ser o responsável pela carteira digital Calibra, que, além de funcionar numa aplicação própria, irá funcionar em várias aplicações detidas pela rede social.