Moro opôs-se a investigação a Fernando Henrique Cardoso por “melindrar apoio” à Lava-Jato
O Ministério Público Federal de São Paulo avançou com uma investigação ao antigo Presidente brasileiro para “mostrar imparcialidade” quando a Lava-Jato estava a ser alvo de duras críticas.
Sergio Moro opôs-se à abertura de uma investigação da Lava-Jato ao antigo Presidente Fernando Henrique Cardoso, só para dar a ideia de “imparcialidade”, porque isso poderia pôr em causa o apoio de alguém demasiado importante para a continuidade da operação, revelou na terça-feira à noite o site The Intercept Brasil, A notícia é baseada em conversas entre Moro e o procurador federal Deltan Dallagnol através da aplicação Telegram.
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Sergio Moro opôs-se à abertura de uma investigação da Lava-Jato ao antigo Presidente Fernando Henrique Cardoso, só para dar a ideia de “imparcialidade”, porque isso poderia pôr em causa o apoio de alguém demasiado importante para a continuidade da operação, revelou na terça-feira à noite o site The Intercept Brasil, A notícia é baseada em conversas entre Moro e o procurador federal Deltan Dallagnol através da aplicação Telegram.
A troca de mensagens entre o antigo juiz e agora ministro da Justiça e o procurador aconteceu um dia depois de a TV Globo ter noticiado que a operação anti-corrupção Lava-Jato estava a investigar Fernando Henrique Cardoso (conhecido como FHC) no âmbito de uma denúncia sobre financiamento eleitoral ilícito. O processo foi porém abandonado, porque por os possíveis crimes já tinham prescrito.
“Tem alguma coisa mesmo séria do FHC? O que vi na TV pareceu muito fraco?”, questionou Moro, perguntando de seguida se era sobre a “caixa 2 de 96”, a que Dallagnol respondeu: “Em princípio sim, o que tem é muito fraco”.
O crime em questão, como ressalvou Moro, estaria prescrito, mas o procurador garantiu que o caso foi enviado para o Ministério Público Federal de São Paulo “sem se analisar [a] prescrição”. “Suponho que de propósito. Talvez para mostrar imparcialidade”, esclareceu Dallagnol. Decisão que não agradou a Moro, pois “melindra alguém cujo apoio é importante”.
As mensagens foram trocadas, diz o The Intercept Brasil, num momento em que a Lava-Jato estava a ser alvo de duras críticas por ser selectiva e poupar políticos do Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB), a que Fernando Henrique Cardoso pertence.
Na altura, recorda o site brasileiro, o antigo chefe de Estado declarou “nada temer” e reafirmou o seu apoio à Lava-Jato. “O Brasil precisa de transparência. A Lava-Jato está colaborando no sentido de colocar as cartas na mesa”, disse.
A possibilidade de a Operação Lava-Jato avançar contra políticos do PSDB para silenciar os seus críticos já vinha de trás. Em 2015, revela o site de investigação jornalística, o procurador Roberson Pozzobon sugeriu numa conversa do Telegram colar-se os pagamentos da construtora Odebrecht aos institutos Lula e FHC. “Assim ninguém poderia indevidamente criticar nossa actuação como se tivesse viés partidário”, escreveu.
Mas os procuradores acabaram por decidir não avançar. Concluíram que os crimes se poderiam limitar a crimes fiscais e que os argumentos do Instituto FHC poderiam ser usados pela defesa do antigo Presidente Lula da Silva. Além disso, Moro opôs-se à investigação em mensagens a Dallagnol.
“Será que não será argumento pra defesa da Lils [empresa que gere as palestras de Lula] que é a prova que não era corrupção?”, questiona o procurador Diogo Castor de Mattos na mesma conversa. “Pensei nisso também. Temos que ter um bom indício de corrupção do FHC/PSDB antes”, responde Pozzobon.
Desde 2016 que o Ministério Público tinha conhecimento do possível envolvimento do antigo Presidente brasileiro, mas permaneceu em segredo até Abril de 2017. “Ajuda de campanha eu sempre dei a todos eles. E a ele também dei. E com certeza teve a ajuda de caixa oficial e não oficial”, disse o empresário Emílio Odebrecht, da Construtora Odebrecht.
Os crimes prescreveram entretanto e uma acusação formal não podia avançar, e o Ministério Público sabia-o, como revelam as mensagens entre Moro e Dallagnol. O caso acabou foi arquivado três meses depois, mas, naquele momento, transmitiu a imagem de a Lava-Jato não ter qualquer motivação político-partidário no desenvolvimento do seu trabalho.