Programa do PS defende entrada de mais funcionários públicos
Há vinte anos que por cada dois funcionários públicos que saem, só entra um. A erosão deixou a administração pública “no osso”. O PS vai propor a abertura de concursos para melhorar os serviços do Estado.
A necessidade de o Estado contratar mais funcionários públicos para fazer face à degradação dos serviços públicos e dos vários departamentos estatais da administração central vai ser defendida pelo PS na campanha eleitoral e no programa para as legislativas de 6 de Outubro, soube o PÚBLICO.
A verdade faz-nos mais fortes
Das guerras aos desastres ambientais, da economia às ameaças epidémicas, quando os dias são de incerteza, o jornalismo do Público torna-se o porto de abrigo para os portugueses que querem pensar melhor. Juntos vemos melhor. Dê força à informação responsável que o ajuda entender o mundo, a pensar e decidir.
A necessidade de o Estado contratar mais funcionários públicos para fazer face à degradação dos serviços públicos e dos vários departamentos estatais da administração central vai ser defendida pelo PS na campanha eleitoral e no programa para as legislativas de 6 de Outubro, soube o PÚBLICO.
Os socialistas irão propor de forma clara que o próximo Governo abra concursos para admissão de funcionários públicos, contratação que deverá ser feita de forma a responder às necessidades dos serviços da administração central. Esta medida dirige-se à contratação de trabalhadores para a máquina do Estado nos vários ministérios e não inclui as carreiras especiais.
Ou seja, o PS vai propor a eliminação da directiva segundo a qual por cada dois funcionários públicos que saem do activo só entra um, regra que vigora há duas décadas e foi introduzida por Alberto Martins, ministro da Reforma do Estado e da Administração Pública no segundo Governo de António Guterres (1999-2002).
A diminuição de funcionários do Estado tem sido uma constante nos últimos vinte anos e a situação que se vive hoje em dia é de uma administração pública “no osso e envelhecida que se irá agravar nos próximos anos se a situação não for enfrentada”, assumiu ao PÚBLICO um membro do Governo.
Quase 60% acima dos 45 anos
Esta situação é confirmada pelos dados do Boletim Estatístico do Emprego Público divulgado em Junho de 2018. Em 2017, a média de idade dos funcionários públicos era de 47 anos, mais 3,4 anos do que em 2011. Deixando de fora as Forças Armadas, a média subia para 48 anos, sendo 48,7 anos nos homens e 47,7 nas mulheres. Na decomposição etária, 33,1% dos funcionários públicos estavam entre os 45 e os 54 anos, 25% entre os 55 e os 64 anos e 1,9% tinham 65 anos ou mais. Ou seja, 60% situavam-se acima dos 45 anos.
A erosão provocada por duas décadas de reforma de trabalhadores do Estado, cuja saída é compensada apenas em metade, tem sido crescente. Nos últimos três anos, a falta de funcionários público criou um desgaste ainda maior já que o horário de trabalho na função pública voltou a ser 35 horas, depois de ter sido aumentado para 40 horas pelo Governo de Pedro Passos Coelho, no âmbito das medidas tomadas para responder às exigências de reajustamento da máquina do Estado, como garantia para a viabilização do empréstimo de 78 mil milhões de euros feito pela Comissão Europeia, o Banco Central Europeu e o Fundo Monetário Internacional em 2011.
Os efeitos da falta de funcionários nos serviços e departamentos públicos apenas foram atenuados nos últimos três anos pela simplificação administrativa de procedimentos e a sua transferência para meios digitais possibilitada pela aposta feita pelo Governo no programa Simplex+, lançado e orientado pela ex-ministra da Presidência e da Modernização Administrativa, Maria Manuel Leitão Marques, coadjuvada pela ex-secretária de Estado adjunta e da Modernização Administrativa, Graça Fonseca.
Capítulo no programa
A admissão de funcionários públicos pelo Governo do PS a um novo ritmo, caso este partido ganhe as legislativas, será enquadrada no programa eleitoral a aprovar pelos socialistas na Convenção Nacional de 20 de Julho. Concretamente, constará do capítulo sobre “boa governação”, no ponto dedicado à “qualidade dos serviços públicos”.
O assunto foi mesmo já abordado pelo líder do PS na reunião da Comissão Política que se realizou a seguir às europeias. Então, António Costa sublinhou que a actual legislatura tinha sido a da reposição de rendimentos, direitos e carreiras. E anunciou que a próxima será a do reforço dos quadros e do investimento nos serviços. Um investimento que passará por sectores autónomos da máquina do Estado como o Serviço Nacional de Saúde. Ou o investimento em transportes públicos como os ferroviários.
Neste domínio, o actual Governo procurou já tomar medidas para atenuar os problemas que têm surgido, como a abertura de um concurso para a aquisição de 22 novos comboios regionais. Só que o processo é demorado: os comboios só chegam em 2022 ou 2023, devido ao tempo que envolve a sua fabricação. A urgência do investimento na ferrovia terá de ser prolongado para a próxima legislatura devido ao estado de degradação a que o sector chegou. Os comboios mais modernos em Portugal são os Alfa que foram comprados no início dos anos 90.
Para fazer face a este problema, o Governo vai lançar um programa de fundo sobre capacitação da indústria nacional para o sector da ferrovia, como solução a médio prazo de repor a capacidade da EMEF - Empresa de Manutenção de Esquipamento Ferroviário, S.A. para recuperar, reparar e manter as dezenas de comboios parados. E autorizou o reforço de quadros.
Serviços em colapso
Mas o investimento e qualificação dos serviços públicos passará igualmente pela contratação de funcionários para os serviços centrais da administração pública dependentes dos vários ministérios.
A defesa desta medida pela direcção do PS advém da constatação feita no exercício do Governo nesta legislatura de que um dos principais motivos porque se tem feito sentir o mau funcionamento dos serviços públicos é a falta de funcionários. O exemplo que foi referido ao PÚBLICO é o das recentes deficiências na obtenção e renovação de cartões do cidadão e passaportes.
Impossibilitado de contratar funcionários para assegurar o aumento de procura no período do Verão de emissão e renovação de cartões de cidadãos e de passaportes, o Governo teve de se recorrer de medidas noutro plano que permitissem a agilização do processo. A solução foi decretar que, além das lojas do cidadão, os pedidos possam ser feitos nos espaços do cidadão e nas conservatórias.
Outra medida foi autorizar que a renovação do cartão do cidadão a partir dos 25 anos possa ser feita nas lojas do cidadão em cinco minutos, uma vez que os dados estão no sistema e a partir dessa idade os dados biométricos não mudam.
Por outro lado, os SMS que, com dois meses de antecedência, avisam os cidadãos de que o seu cartão de cidadão está a terminar o prazo, passarão a propor uma data de renovação, que as pessoas podem aceitar ou rejeitar e nesse caso sujeitar-se a esperar.
Os constrangimentos que os vários ministérios sentem na gestão do pessoal nos serviços que tutelam ficou patente na audição parlamentar da ministra da Cultura, Graça Fonseca, a 28 de Maio.
Perante os deputados da Comissão da Cultura, Graça Fonseca explicou as dificuldades que tinha em poder contratar funcionários, referindo a Cinemateca, os serviços de arqueologia e os museus. E afirmou que a falta de recursos humanos “é transversal ao Ministério da Cultura e na verdade é transversal ao Estado”.