Militares rasgam acordos com oposição e marcam eleições no Sudão
Conselho Militar de Transição agenda eleições para daqui nove meses, um dia depois da morte de mais de 30 manifestantes às mãos das forças de segurança. Oposição rejeita plano.
As autoridades militares responsáveis pela transição política no Sudão decidiram ignorar os acordos negociados com a oposição e anunciaram o agendamento de eleições para daqui a nove meses.
A verdade faz-nos mais fortes
Das guerras aos desastres ambientais, da economia às ameaças epidémicas, quando os dias são de incerteza, o jornalismo do Público torna-se o porto de abrigo para os portugueses que querem pensar melhor. Juntos vemos melhor. Dê força à informação responsável que o ajuda entender o mundo, a pensar e decidir.
As autoridades militares responsáveis pela transição política no Sudão decidiram ignorar os acordos negociados com a oposição e anunciaram o agendamento de eleições para daqui a nove meses.
A decisão do Conselho Militar de Transição (TMC) surge um dia depois das forças de segurança terem avançado sobre um grupo de manifestantes, em Cartum, que exigia a participação da sociedade civil no processo, numa operação que resultou na morte de pelo menos 35 pessoas.
“O conselho militar decidiu parar de negociar com a Declaração das Forças da Liberdade e da Mudança, cancelar o que foi acordado e realizar eleições gerais dentro de nove meses”, decretou o tenente-general Abdel Fattah al-Burhan, num anúncio televisivo.
O TMC governa o país desde a deposição do Presidente Omar al-Bashir, em Abril, e já tinha acordado com a oposição que a transição sudanesa para a democracia deveria durar pelo menos três meses. Os militares não acederam, porém, à sugestão dos opositores que pretende a nomeação de uma administração civil, que ficaria responsável por liderar o processo.
O responsável militar acusou os líderes dos protestos de quererem “alongar as negociações e excluir outras forças políticas e de segurança” do próximo governo de transição e revelou que o TMC vai agora avançar para a formação de um governo interino, que terá como principal missão preparar o país para umas eleições que serão supervisionadas por um organismo internacional e independente.
Madani Abbas Madani, líder da oposição, já fez saber, no entanto, que a Declaração das Forças da Liberdade e da Mudança não aceita a decisão dos militares, lançando ainda mais dúvidas para o futuro político próximo do Sudão.
O fim abrupto das negociações com a oposição pode “aumentar o risco de violência continuada” no Sudão, considera a antiga embaixadora britânica para o Sudão, Rosalind Marsden. Em declarações à BBC, a diplomata refere ainda que agendamento de eleições tem o condão de “abrir caminho para que uma grande parte do antigo regime regresse ao poder”.
Na segunda-feira o TMC pôs em marcha uma operação militar para desmobilizar o grupo de manifestantes que montou há várias semanas um acampamento junto ao ministério da Defesa, na capital sudanesa, e organizou ali protestos diários contra a intransigência dos militares.
Mas a investida descontrolou-se rapidamente e depois de lançarem gás lacrimogéneo contra os manifestantes, os soldados acabaram por disparar munições reais. Segundo a Associação Sudanesa de Profissionais – uma organização médica com ligações à oposição – morreram pelo menos 35 pessoas e 116 ficaram feridas.
A associação denunciou o “massacre” e criticou os militares, tendo sido acompanhada nas críticas pelas Nações Unidas, Estados Unidos, Reino Unido, Alemanha, Egipto, entre outros.
“A morte, ferimento e humilhação de manifestantes foi uma forma sistemática e planeada de impor repressão à população sudanesa”, lamentou Madani Abbas Madani.
O TMC, por sua vez, justificou a operação com a necessidade de “fazer dispersar elementos desordeiros” que se encontravam perto do local dos protestos.