Portugal em ponto morto no combate à manipulação de competições desportivas
Portugal foi o primeiro, e até hoje o único, Estado-membro da União Europeia a assinar a Convenção do Conselho da Europa sobre a Manipulação de Competições Desportivas - brevemente conhecida por Convenção de Macolin, em alusão à cidade Suíça onde foi aberta a assinatura em 18 de Setembro de 2014, na 13.ª Conferência de Ministros responsáveis pelo Desporto.
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Portugal foi o primeiro, e até hoje o único, Estado-membro da União Europeia a assinar a Convenção do Conselho da Europa sobre a Manipulação de Competições Desportivas - brevemente conhecida por Convenção de Macolin, em alusão à cidade Suíça onde foi aberta a assinatura em 18 de Setembro de 2014, na 13.ª Conferência de Ministros responsáveis pelo Desporto.
Volvidos quase cinco anos deste que é o único instrumento de direito internacional de combate àquela que é por muitos considerada a maior ameaça à integridade do desporto, apenas após a recente ratificação da Suíça está reunido o mínimo exigido de cinco Estados-membros para que finalmente esta convenção entre em vigor no dia 1 de Setembro.
Este grupo (Suíça, Moldávia, Noruega, Ucrânia e Portugal) traduz a incapacidade da União Europeia em materializar na agenda política o discurso de “tolerância zero” a este flagelo, pois sob o argumento das objecções de Malta (um Estado cujo PIB depende fortemente da indústria do jogo) à definição de jogo ilegal residem os mais diversos condicionalismos para outros Estados-membros da UE seguirem o caminho que Portugal trilhou.
Pese embora o forte apelo de organizações do movimento olímpico, autoridades públicas, lotarias nacionais e reguladores do mercado de apostas à célere ratificação e entrada em vigor das disposições previstas neste instrumento jurídico indispensável para articular diversas jurisdições e proporcionar uma resposta coordenada entre parceiros - através de plataformas nacionais - a uma ameaça global com crescente nível de sofisticação e complexidade, são manifestas as dificuldades em materializar tais intenções.
Perante este bloqueio a uma abordagem integrada na prevenção, detecção e sanção da criminalidade associada ao desporto têm sido tomados dois rumos: aguardar a resolução do impasse para que a convenção entre em vigor, ou implementar um quadro de cooperação estratégica e medidas para atacar o problema através da criação de plataformas nacionais e outras acções aí previstas.
O país tem hoje um quadro regulador que reforça a moldura sancionatória, possibilitando a utilização de meios de prova relevantes na investigação que até então não eram admissíveis, mas está longe de oferecer garantias no que respeita ao seu cumprimento, nomeadamente no que toca ao registo em fonte aberta de beneficiários efectivos dos capitais de sociedades anónimas desportivas, à implementação de programas de prevenção, sensibilização e formação em integridade e disposições neste domínio nos regulamentos disciplinares das federações desportivas, sem que se vislumbre a aplicação das medidas legalmente previstas para os casos de incumprimento.
A formação de agentes desportivos, ao não providenciar competências básicas, orientadas para a acção, sobre como prevenir, detectar e proteger em relação à manipulação de resultados, expõe as suas vulnerabilidades, e das organizações que representam, ao crime organizado, que aqui encontra janelas de oportunidade florescentes, enquanto se esgotam recursos públicos a tratar a ética no desporto ao nível dos seus princípios e menos das suas circunstâncias práticas.
Na generalidade, as organizações desportivas descuram este fenómeno, o qual está longe de representar uma prioridade nas suas agendas, pois não cuidam de implementar medidas de integridade alinhadas com a convenção ou as recomendações do Comité Olímpico Internacional (COI) e outras entidades de referência, excepto quando danos reputacionais batem à porta, ou se trata de reclamar o justo retorno de receitas oriundas do mercado de apostas.
Algo, aliás, que não diverge dos operadores do mercado de apostas, os quais, segundo o Observatório do Jogo Responsável, e ao arrepio de outras jurisdições, orientam a sua intervenção pública por critérios de sustentabilidade económica em torno da redução da carga fiscal e burocrática, mais do que a salvaguarda dos consumidores ou da ordem pública que justificam o facto de o jogo ser uma reserva do Estado que o diferencia, desde logo no plano legal, de outras actividades económicas. Ou quando se patrocinam federações desportivas sem as vincular a obrigações contratuais em matéria de integridade das suas competições.
Neste contexto, perante um quadro legislativo que veio progressivamente abrir o mercado de apostas a operadores licenciados - e por isso fundamentou que nessa ocasião Portugal ratificasse a Convenção de Macolin -, o regulador envida os seus esforços no cumprimento da legislação pelos operadores licenciados, pois tem clara noção das debilidades dos instrumentos que lhe são conferidos para suster o mercado ilegal.
Urge, com efeito, implementar políticas, concertar acções e reforçar a investigação, pois não será mais possível alegar a entrada em vigor da convenção para adiar e deixar em ponto morto estas e outras medidas da maior urgência.
É com este propósito que Portugal recebe um programa de capacitação do COI-Interpol para investigadores policiais e membros de órgãos disciplinares de federações desportivas e, no próximo dia 6 de Junho, o auditório da Polícia Judiciária acolhe a Conferência Internacional de Integridade Desportiva, numa organização conjunta do Comité Olímpico de Portugal com diversos parceiros internacionais e órgãos nacionais de prevenção, investigação e polícia criminal, inaugurando um quadro de cooperação no reforço de competências destas entidades no combate à criminalidade no desporto.