Uma viagem no tempo em busca das raízes da ideologia ocidental

Uma recensão ao livro Breve História da Ideologia Ocidental: Um Relato Crítico, de Rolf Petri.

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Neste milénio inaugurado pelo ataque terrorista às Torres Gémeas de Nova Iorque, uma das palavras mais usadas – e abusadas – no debate público, nas agendas políticas, nas conversas do dia-a-dia e na grande praça global constituída pelas redes sociais é “Ocidente”. Mas até que ponto conhecemos de facto as raízes do termo “Ocidente”? Como é que se formou a sua ideologia? Quando é que os seus elementos nucleares se moldaram?

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Neste milénio inaugurado pelo ataque terrorista às Torres Gémeas de Nova Iorque, uma das palavras mais usadas – e abusadas – no debate público, nas agendas políticas, nas conversas do dia-a-dia e na grande praça global constituída pelas redes sociais é “Ocidente”. Mas até que ponto conhecemos de facto as raízes do termo “Ocidente”? Como é que se formou a sua ideologia? Quando é que os seus elementos nucleares se moldaram?

Todas estas perguntas estão na base de Breve História da Ideologia Ocidental: Um Relato Crítico de Rolf Petri, professor catedrático da Universidade Ca’ Foscari de Veneza, recentemente publicado pela Temas e Debates. Num texto denso e, temos de admitir, nem sempre de leitura fácil, o autor convida-nos a realizar uma longa viagem que cruza desde acontecimentos fulcrais do nosso passado (tais como o renascimento humanista, as descobertas, o iluminismo) até às mais recentes guerras no Médio Oriente com os pensamentos de Adam Smith, Thomas Hobbes ou Karl Marx, chegando aos teóricos do movimento ecologista e à ideia de sociedade líquida de Bauman.

O aspecto mais interessante deste périplo é que Petri oferece ao leitor uma experiência dinâmica. O autor não fornece meramente uma lista esquemática de autores e acontecimentos, mas usa uma abordagem holística para lidar com alguns dos pontos centrais da ideologia ocidental: a ideia de Europa, os conceitos de liberdade e soberania, a importância da religião, a relação entre raça e cultura, a história. 

De facto, a História – com H grande – é um dos elementos-chave deste livro. Em primeiro lugar, porque o texto, explorando de forma sistemática a origem dos conceitos, realça o quão importante é a perspectiva histórica, assim como o papel dos historiadores, numa sociedade tão focada no presente, como aquela em que vivemos. Em segundo lugar, porque a tese central do autor é que o que realmente define o Ocidente – utilizado ao longo do livro mais como uma metáfora espacial que como um espaço geográfico bem definido – é o seu elemento teleológico, a sua imparável busca de salvação na História, com tudo o que daí resulta de bom e mau. ​É, de facto, esta visão escatológica da História que, segundo Petri, alimenta o motor da busca da hegemonia colonial, imperial, económica e comunicativa perpetuada pelos ocidentais até hoje. 

No fim da introdução, o autor pergunta ao leitor se seria uma catástrofe para a nossa espécie viver num mundo em que a ideia de que os “valores universais” do Ocidente têm de ser impostos universalmente enquanto menor denominador comum tivesse sido abandonada. A resposta de Petri é-nos oferecida, de forma extremamente clara, depois de quase 300 páginas, mas o que torna este livro uma leitura útil e fascinante é o facto de que, após a sua leitura, cada um de nós, tento tido à disposição uma riquíssima caixa de ferramentas conceptuais, pode chegar à sua própria resposta.