Temos que ficar mais um dia… em Saint-Jean-de-Luz
O leitor Miguel Silva Machado partilha a sua experiência no País Basco francês.
Quando entramos no quarto do hotel, contemplamos por breves instantes a vista e... vamos ter que ficar mais um dia, pelo menos! Na recepção ouvimos um simpático “pas de problème”, e então sim, com calma, entramos nesta vila do País Basco francês.
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Quando entramos no quarto do hotel, contemplamos por breves instantes a vista e... vamos ter que ficar mais um dia, pelo menos! Na recepção ouvimos um simpático “pas de problème”, e então sim, com calma, entramos nesta vila do País Basco francês.
Saímos do “La Caravelle”, em Ciboure, no Quai Maurice Ravel – um dos nomes sonantes que por aqui viveu – frente ao canal que liga a baía ao porto, e em dez minutos, depois de atravessarmos a Ponte Charles de Gaulle sobre o La Nivelle, percorremos a baixa. Tempo óptimo, muita mas não demasiada gente neste final de Abril, percebeu-se que o movimento automóvel fora das ruas sem trânsito do centro era intenso. Imagino no Verão.
Restauração e comércio pujantes, de tudo um pouco, ficamo-nos pelas imprescindíveis espadrilles, sapatos de tecido colorido e sola em corda. O número de galerias de arte é surpreendente para uma pequena vila, mas estão lá e vendem! A região parece de facto inspiradora, pela costa, sem dúvida, mas talvez mais pela maioria das habitações, que lhe dão um aspecto característico.
Ao longo da “concha” (baía) há dos pequenos chalets aos ricos palacetes Arte Nova, alguns hoje hotéis e, mais para o extremo norte, relativamente discretos blocos de andares, tudo polvilhado por muitas pequenas vivendas com arquitectura tradicional basca ou nela inspirada. Nada disto fere a vista e os dois faróis que definem o acesso ao porto, desenhados por André Pavlovski em 1936, então alvo de polémica pelas suas linhas, são desde 1993 património protegido por lei e hoje ex-líbris de Saint-Jean-de-Luz e de Ciboure, reproduzidos em obras de arte, livros, postais, ímanes e toda a típica parafernália de souverirs.
Pela Promenade Jacques Thibaud – outro antigo residente famoso –, assente num dique que separa a baixa da praia onde já alguns se aventuravam, visitamos a parte comercial da La Pergola – construção Arte Nova de 1926 que foi muito modificada em 1950 –, onde também funciona um spa com vista para o mar. Acabamos o dia a petiscar ali ao lado num quiosque com o sol a pôr-se para lá do Fort Socoa, onde a baía termina.
A Igreja de Saint-Jean-de-Luz ficou na história: ali se casou, em 1660, Luís XIV com Maria Teresa de Áustria, filha do rei de Espanha, Filipe IV, e assim se alcançou mais uma paz entre os dois países; também visitamos a igreja de São Vicente numas das pequenas vielas de Ciboure, única no País Basco com uma torre octogonal em pagode, e em cujo interior observamos um invulgar conjunto de galerias/varandas em madeira que acompanham quase toda a extensão das suas paredes, e em três andares diferentes.
De volta ao centro, passagem pelo porto de pesca da antiga terra de corsários – reza a história que em tempos de pouco peixe os pescadores viravam piratas ao serviço do Rei –, pela praça Luís XIV, cujo palácio hoje enobrece a praça, que acolhe um sem número de esplanadas, e, novamente a arte, muitos pintores a trabalhar e a vender. Não nos demoramos, seguimos pela Rua Gambetta e, na loja de bijutaria La Petite Tribo: são portugueses? Adoro Portugal, estive de férias na Ericeira e vou voltar, terra incrível! Acto contínuo, o jovem empregado mostra no telemóvel, entusiasmadíssimo, dezenas de fotos que tão bem conhecemos.
De regresso ao hotel, olhando para as varandas da casa onde Henri Matisse viveu e trabalhou nos anos de 1940, e dali certamente muitas vezes contemplou o porto e os então novíssimos faróis de Pavlovski… afinal teremos que voltar, mais um dia não chegou!
Miguel Silva Machado