“Brexit”: uma opinião estática?
O problema da participação na União Europeia está em vias de destruir os dois maiores partidos e de reduzir o território e a pluralidade histórica da monarquia britânica.
As eleições europeias no Reino Unido estão a ser analisadas como uma substituição do segundo referendo que o parlamento (e os maiores partidos) se têm recusado a lançar. A ideia de reafirmação da divisão do primeiro referendo tem prevalecido, combinada com surpresa perante a teimosia britânica. É obvio que não houve mudança radical de opinião, pois não se verificam ainda consequências económicas do “Brexit”, se exceptuarmos estagnação de investimento dada a incerteza política. Contudo, há mudanças significativas que prenunciam o desbloqueamento futuro.
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As eleições europeias no Reino Unido estão a ser analisadas como uma substituição do segundo referendo que o parlamento (e os maiores partidos) se têm recusado a lançar. A ideia de reafirmação da divisão do primeiro referendo tem prevalecido, combinada com surpresa perante a teimosia britânica. É obvio que não houve mudança radical de opinião, pois não se verificam ainda consequências económicas do “Brexit”, se exceptuarmos estagnação de investimento dada a incerteza política. Contudo, há mudanças significativas que prenunciam o desbloqueamento futuro.
O pano de fundo tem sido a incapacidade do parlamento em chegar a uma decisão sobre o “Brexit”, tendo sido rejeitado diversas vezes o acordo firmado pelo governo com a União Europeia sem se encontraram alternativas. É esta paralisia que o leitorado decidiu castigar, transferindo votos dos dois maiores partidos, Conservador, que perdeu 15% dos votos, e Trabalhista, que perdeu 11% face às ultimas eleições europeias. Devemos dizer que o universo de votantes não se alterou de forma significativa, de 34 para 37%, bastante abaixo das últimas eleições legislativas de 2017, 69%.
A transferência dos conservadores beneficiou sobretudo o Partido Brexit, que chegou a 32%, ao qual temos que somar o UKIP, que obtivera 27% de votos em 2014, agora 3%, total 35%, mais 8%. Houve transferência massiva dos Conservadores, mas também alguma do partido Trabalhista, sobretudo no Norte.
A posição face à saída ou manutenção na União Europeia estruturou o voto. Os ganhos do remain foram absorvidos pelos Liberais Democratas, que passaram a segundo maior partido com 20% dos votos, mais 13%, e pelos Verdes, com 12%, mais 4% do que tinham obtido em 2014. O Partido Nacional Escocês reforçou a sua posição, com 38% dos votos na Escócia, mais 9%, o que significa 4% no Reino Unido, enquanto o partido Plaid Cymru no País de Gales (1%) e o Partido da Aliança (liberal) na Irlanda do Norte conheceram um progresso significativo.
A clara opinião remain ficou com assim com pouco mais de 37% contra 35% ligados ao “Brexit”. É difícil aplicarmos as sondagens de 70-80% de eleitorado “Brexit” entre os votantes Conservadores e 30-40% entre os Trabalhistas, pois parte deslocou-se num e noutro sentido (não devemos esquecer os conservadores cosmopolitas que votaram Liberais Democratas), sendo impossível neste momento aferir a tendência dos votantes fiéis. Mas é evidente que o “Brexit” radical está em minoria, enquanto as sondagens de uma maioria (ainda diminuta) a favor do remain parecem confirmar-se.
É ainda cedo para prever futuras eleições legislativas, que não estão no horizonte, pois o sistema de democracia britânico permite a substituição do primeiro-ministro pelo partido maioritário sem novas eleições. Os dois maiores partidos estarão unidos em evitar eleições, dada a provável varridela que os afetará. Para quem está farto de ouvir lições sobre as democracias europeias ancilosadas, não deixa de ser irónico o total bloqueio da democracia britânica, paralisada há três anos com a saída da União Europeia.
A boa notícia destas eleições é que os eleitores estão disponíveis para mudar de partido, enquanto os jovens deixaram de estar encantados com Jeremy Corbyn, que persiste no malabarismo de contentar os dois lados do eleitorado. O esboço de uma mudança política na Irlanda do Norte é outro elemento significativo, enquanto o progresso do Partido Nacional Escocês prenuncia novo referendo de independência, já prometido para 2020.
O problema da participação na União Europeia, que não estava na preocupação da esmagadora maioria dos eleitores há quatro anos atrás, está em vias de destruir os dois maiores partidos e de reduzir o território e a pluralidade histórica da monarquia britânica. Talvez se estejam a criar condições para finalmente se escrever uma constituição. Mas haverá maioria para votar o texto?
O autor escreve escreve segundo o novo acordo ortográfico