Municípios do litoral do Porto querem declarar guerra às gaivotas. Mas como?

O excesso destas aves nas zonas urbanas é considerado uma questão de “saúde pública” e são cada vez mais os organismos que reclamam medidas “urgentes” e “alargadas” para a sua resolução. Gaia já deu o tiro de partida.

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Paulo Pimenta

O alarme foi dado há sensivelmente dez anos (2008) por Rui Rio, então presidente da Câmara do Porto no fim de uma reunião da Área Metropolitana do Porto: o seu município, e todos em redor, estavam a mãos com uma “praga” de gaivotas. Os autarcas enfrentavam um número crescente de queixas apresentadas por moradores e comerciantes por incidentes com estas aves. Os relatos falavam sobretudo em situações de conflito ao nível do excesso de ruído, da sujidade causada pelos dejectos, dos comportamentos agressivos e da excessiva reprodução.

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O alarme foi dado há sensivelmente dez anos (2008) por Rui Rio, então presidente da Câmara do Porto no fim de uma reunião da Área Metropolitana do Porto: o seu município, e todos em redor, estavam a mãos com uma “praga” de gaivotas. Os autarcas enfrentavam um número crescente de queixas apresentadas por moradores e comerciantes por incidentes com estas aves. Os relatos falavam sobretudo em situações de conflito ao nível do excesso de ruído, da sujidade causada pelos dejectos, dos comportamentos agressivos e da excessiva reprodução.

A resposta surgiu ainda no decorrer dessa reunião, com o autarca a estabelecer um protocolo com a Universidade do Porto, mais concretamente com o Centro Interdisciplinar de Investigação Marinha e Ambiental (CIIMAR), com o objectivo de perceber a real dimensão do problema e as melhores formas de o resolver. As respostas chegariam em 2011, através do relatório Controlo da População de Gaivotas na Área Metropolitana do Porto.

Nele pode ler-se que “a redução do impacto negativo das gaivotas sobre o património e as actividades humanas” só seria possível através de três medidas principais. São elas a “eliminação ou redução da disponibilidade de alimento”, a “colocação de dispositivos físicos de protecção” e a implementação de “dispositivos sonoros”. No caso particular desta última, o estudo já avançava com resultados preliminares, decorrentes da instalação de Bird Wailer Mk IIIa na Lota de Matosinhos, e não são positivos. A presença de alimento era um chamariz demasiado atractivo e nem a perturbação sonora parecia demover as aves do local.

Volvidos 11 anos, a Área Metropolitana do Porto e as autarquias que a integram parecem decididos em passar das palavras aos actos — ou, pelo menos, assim se espera. O município de Gaia tornou-se, nesta semana, o primeiro a aprovar, em reunião camarária, a disponibilização de verbas, mais de 22 mil euros, para o Plano de Acção para a Monitorização e Controlo da População de Gaivotas na AMP. O objectivo é que esta se torne uma estratégia concertada entre Gaia, Porto, Vila do Conde, Póvoa de Varzim, Matosinhos e Espinho. Cada município deve contribuir com a sua parte para um bolo total que se estima ser de 135 mil euros.

Na proposta votada na reunião, pode ler-se que a iniciativa se deve às reclamações “cada vez mais frequentes” por incidentes com estas aves, de tal forma que a situação tomou contornos “preocupantes”, principalmente com as espécies Larus fuscus e Larus michahellis. É também feita referência a episódios de “conflito com as populações”. Ainda assim e no que diz respeito a medidas concretas, o plano nada avança. O documento remete as acções para as conclusões de um grupo de trabalho e uma equipa técnica da AMP, organismos que vão ser criados para o efeito e que ainda não têm composição definida.

Um problema de saúde

Eduardo Vítor Rodrigues, autarca de Vila Nova de Gaia e actual líder da AMP, em declarações aos jornalistas depois da reunião camarária, categorizou a problemática da presença destas aves em contexto urbano como “urgente”, tendo em conta que esta é “já uma questão de saúde” e que põe em causa “a segurança pública”. Questionado pelo PÚBLICO sobre as estratégias que vão ser implementadas para fazer face à questão, a autarquia ressalvou que “não há qualquer estratégia de abate indiscriminado ou de envenenamento”, até porque “é preciso não esquecer que as gaivotas circulam em espaço público”. Aquilo que está em cima da mesa é a “destruição dos ninhos de ovos”, uma hipótese que será estudada com membros da comunidade científica, assim como a “esterilização” das ditas aves.

A participação de empresas como a Lipor e Suldouro, a operar no tratamento do lixo da região, é fulcral para a concretização do plano já que um grande número de gaivotas chega atraída pelas lixeiras, ainda que estas tenham sido substituídas por aterros. Esta alteração não é, contudo, a ideal, visto que muitos dos aterros estão a céu aberto, factor que contribui e muito para a proliferação da espécie.

Estudo desactualizado

A data remota do estudo, concluído em 2011, parece ser um factor de desvalorização do plano que nele teve base. O PAN, por exemplo, defende a continuidade do estudo e reclama para o problema uma resolução “sistémica e integrada” com recurso a “estudos regulares”, visto tratar-se de uma questão de âmbito “nacional e internacional”. Para o partido, “o extermínio das gaivotas não é solução”, devendo a mesma passar por soluções mais éticas, nas quais se devem incluir uma mais eficiente gestão e produção dos resíduos urbanos — um dos principais focos de alimentação das gaivotas e razão pela qual estas se fixam em contextos urbanos.

José Teixeira, um dos autores do referido relatório, lamenta que no período decorrido nenhuma medida de fundo tenha sido implementada, com as autarquias a limitarem-se a soluções “pontuais”. Relativamente ao plano que a AMP quer implementar, o investigador antevê que as acções comecem por uma “segunda fase de monitorização” que contemple “uma actualização” do documento pelo próprio. Por se tratar de um “problema difuso” e de “difícil resolução”, José congratula-se com os esforços concertados das autarquias e realça a conjugação da vontade política e da disponibilidade financeira dos municípios para fazer à questão: “é uma notícia muito boa”, refere. No que diz respeito às medidas propriamente ditas, defende que estas se devem centrar, sobretudo, no âmbito da nidificação — período em que são registadas mais situações de conflito —, como “leis e regulamentos que impedisse a nidificação em telhados”. As soluções podem passar, também, pela substituição de ovos e a inviabilização dos mesmos.

Para José Teixeira, a solução deve ser encontrada o mais rápido possível, antes que a situação fique “incontrolável” e com este adjectivo refere-se especificamente aos perigos que as fezes destes animais podem representar dada a presença de agentes patogénicos.

Texto editado por Ana Fernandes