“Mais Espanha” numa Europa invadida pelos soberanismos

As eleições europeias não apaixonam a Espanha. As atenções estão centradas nas eleições regionais e municipais. Mas têm relevância estratégica grande e deverão reforçar o papel de Madrid na UE.

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A Espanha é favorável a um reforço da integração europeia Susana Vera/REUTERS

A situação resume-se assim: a Espanha espera reforçar o seu papel na Europa, enquanto a União Europeia precisa de “mais Espanha”. A moeda tem, no entanto, outra face: “A coincidência entre as eleições europeias e as regionais e locais fez centrar a campanha na política interna. “Os líderes nacionais esqueceram-se de falar da Europa na campanha eleitoral [das legislativas]”, lamentou o socialista Joaquín Almunia, ex-vice-presidente da Comissão Europeia. Na campanha das europeias pouco mudou. O mais importante virá quando reabrir o Parlamento Europeu (PE).

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A situação resume-se assim: a Espanha espera reforçar o seu papel na Europa, enquanto a União Europeia precisa de “mais Espanha”. A moeda tem, no entanto, outra face: “A coincidência entre as eleições europeias e as regionais e locais fez centrar a campanha na política interna. “Os líderes nacionais esqueceram-se de falar da Europa na campanha eleitoral [das legislativas]”, lamentou o socialista Joaquín Almunia, ex-vice-presidente da Comissão Europeia. Na campanha das europeias pouco mudou. O mais importante virá quando reabrir o Parlamento Europeu (PE).

Perante uma ofensiva soberanista à escala europeia, que põe em causa os equilíbrios do PE, Madrid enviará para Bruxelas uma representação marcadamente europeísta. A extrema-direita, Vox, deverá eleger cinco eurodeputados. O PSOE, com 19-20 mandatos, o PP, com 12-13, o Cidadãos com 9-10 integrarão, respectivamente, os grupos Socialistas e Democratas, Partido Popular Europeu e Democratas e Liberais. O Unidas Podemos, com sete ou oito mandatos, reforçará o grupo Esquerda Unitária. O resto vai para nacionalistas, catalães e bascos. A Espanha elege 54 eurodeputados.

A entrada da extrema-direita no Congresso espanhol causou pânico em meios europeus, tendo alguns jornais chegado a profetizar uma deriva eurocéptica em Madrid. Terão levado a sério o americano Steve Bannon: “[O Vox] pode chegar aos 15% e desencadear uma vaga de fundo na Europa.” De facto, a extrema-direita representa um décimo do eleitorado. É uma incógnita quanto ao futuro mas, de momento, falhou a aposta de mudar o rumo da Espanha.

A atitude dos espanhóis perante a UE pode ser resumida em dois números. Quantos avaliam positivamente a participação espanhola na UE? 75%. E se houvesse um referendo sobre a saída da União? Votariam contra 74%; a favor, apenas 10%.

Além de determinante na consolidação da democracia, a integração europeia “constituiu uma espécie de Plano Marshall para Espanha”. Desde há décadas, há um consenso pluripartidário sobre a UE. Falta agora os partidos concertarem uma nova estratégia comum sobre a política europeia.

O paradoxo espanhol

Sobre o papel da Espanha na UE, lê-se num relatório do Real Instituto Elcano: “A conjuntura europeia do Brexit, por um lado, e o eurocéptico governo italiano, por outro, podem tornar a Espanha num sócio indispensável para o eixo franco-alemão avançar na integração. (…) A presença espanhola no PE será uma peça chave para tirar partido deste contexto favorável [e permitir] um impulso espanhol na UE.”

Na Itália, partilha-se esta análise. Figuras como os antigos primeiros-ministros Romano Prodi ou Enrico Letta denunciam o isolamento europeu da Itália e lançam alertas sobre a “ultrapassagem” do seu estatuto europeu pela Espanha.

Descontada a deriva da era de José Maria Aznar, que tinha uma concepção “utilitária” da UE e fez uma inflexão pró-americana, a Espanha permanece fiel à opção europeísta, sem esquecer as vertentes da sua vocação histórico-geográfica: a mediterrânica e a atlântica – é a ponte para a América Latina.

A política mediterrânica da UE será uma ficção enquanto se cruzarem, por exemplo, as ambições contraditórias de Paris e Roma. É um terreno em que Madrid poderá ter um papel estabilizador. O mesmo se pode dizer da América Latina, que a Espanha sempre procurou colocar, sem grande sucesso, no centro das agendas europeias.

A Espanha é favorável a um reforço da integração europeia. Deverá ter um papel fulcral na questão das migrações. Outro ponto relevante é antiterrorismo. Desde a luta contra a ETA e na dura experiência da jihad islamista, a Espanha é líder na matéria. Segundo a Europol, é o país que mais jihadistas deteve na UE desde 2016.

Por fim, há em Espanha debates em curso sobre a cooperação política dos países do Sul que, por imperativos internos, se têm afirmado menos do que outros “blocos”, como o Grupo de Visegrado.

A política externa espanhola tem estado limitada por factores internos, da crise económica à crise nacionalista catalã. Previne o estudo do Elcano: “A estabilidade nacional também definirá o papel que que a Espanha poderá desempenhar a nível europeu. Se continuar refém das tensões independentistas na Catalunha, serão afectados os seus esforços na política europeia. (…) Resolver esta crise potenciaria uma maior influência espanhola no exterior.” Inversamente, uma maior influência no Parlamento Europeu ajudaria Madrid a neutralizar os intentos independentistas de internacionalizar a crise catalã.

O La Vanguardia, de Barcelona, define assim o paradoxo destas eleições: “Em termos estratégicos, as eleições europeias são as mais importantes de quantas se celebraram esta primavera neste país.” Explica o director-adjunto, Enric Juliana: “São as de maior importância estratégica e talvez sejam as que despertam menos paixão, uma vez esclarecidas as dúvidas das eleições gerais. A União Europeia joga o seu futuro nos próximos anos e a Espanha pode pesar mais na definição da política europeia nesta fase difícil. A Espanha e Portugal.”