Em 45 anos, Presidentes entregaram 9477 comendas
Já foi aberto um processo disciplinar com vista à retirada das condecorações a Joe Berardo, na sequência do comportamento na comissão de inquérito da CGD. Marcelo mandou fazer contas ao número de portugueses condecorados.
Quarenta e cinco anos de democracia, cinco presidentes da República, 9477 condecorados. Marcelo Rebelo de Sousa pediu para saber qual o número de portugueses com comendas desde o 25 de Abril, depois da polémica à volta das condecorações oferecidas a Joe Berardo – e do eventual excesso de magnanimidade dos chefes de Estado na distribuição de comendas, um tema que foi amplamente discutido pela opinião pública.
A verdade faz-nos mais fortes
Das guerras aos desastres ambientais, da economia às ameaças epidémicas, quando os dias são de incerteza, o jornalismo do Público torna-se o porto de abrigo para os portugueses que querem pensar melhor. Juntos vemos melhor. Dê força à informação responsável que o ajuda entender o mundo, a pensar e decidir.
Quarenta e cinco anos de democracia, cinco presidentes da República, 9477 condecorados. Marcelo Rebelo de Sousa pediu para saber qual o número de portugueses com comendas desde o 25 de Abril, depois da polémica à volta das condecorações oferecidas a Joe Berardo – e do eventual excesso de magnanimidade dos chefes de Estado na distribuição de comendas, um tema que foi amplamente discutido pela opinião pública.
A conclusão do Presidente é que só um mínimo de portugueses – entre dez milhões – dispõe de comendas entregues pela Presidência da República. Entre os 9477, também há entidades colectivas a quem foram entregues condecorações. Logo, do lado da Presidência, não existe qualquer problema de condecorações no país, nem sequer é necessário melhorar a legislação que rege as comendas.
Tudo começou no início da semana quando o advogado José Miguel Júdice, no seu espaço de comentário na SIC-Notícias, desafiou o Presidente da República a retirar a condecoração a Joe Berardo, afirmando que devolveria a sua condecoração, caso Berardo continuasse Oficial da Ordem do Infante D. Henrique. Júdice e Berardo partilham a mesma condecoração, as duas foram atribuídas pelo ex-Presidente da República Jorge Sampaio – mas Berardo foi “agraciado” primeiro, em Outubro de 2004, enquanto José Miguel Júdice foi condecorado no 10 de Junho de 2005.
Depois de Júdice falar, o CDS veio também defender a retirada da condecoração. Embora, na altura, os centristas omitissem o facto de Celeste Cardona, a histórica centrista que também fazia parte dos órgãos da Caixa Geral de Depósitos quando foram aprovados os empréstimos a Joe Berardo, também deter uma comenda, Nuno Melo já admite que também a condecoração de Cardona possa ser avaliada.
Marcelo Rebelo de Sousa via com bons olhos a abertura de um processo pelo Conselho das Ordens com vista à retirada da condecoração a Berardo. O Presidente da República já tinha afirmado a sua crítica ao comportamento de Joe Berardo na comissão de inquérito quando pediu “respeito” pelas instituições. “Respeitar significa ter decoro, ter uma maneira respeitosa de tratar estas instituições. É bom que as pessoas que são importantes, ou porque alguém as considerou importantes ou porque o foram em determinado momento, tenham a noção de que a importância tem um preço”, disse o Presidente na sequência da ida do ainda comendador à comissão de inquérito à Caixa Geral de Depósitos.
Processo disciplinar em curso
Ontem, o Conselho das Ordens Nacionais presidido por Manuela Ferreira Leite decidiu abrir um processo disciplinar a Joe Berardo que pode culminar com a perda das duas condecorações com que foi distinguido. O processo será instruído por um relator e irá avaliar se o comendador, com as declarações feitas na Assembleia da República na semana passada, violou os deveres a que está obrigado enquanto tal.
“Na sequência da audição do Senhor José Berardo na II Comissão Parlamentar de Inquérito à Recapitalização da Caixa Geral de Depósitos e à Gestão do Banco, o Conselho das Ordens Nacionais recebeu um parecer do presidente da referida Comissão, que constitui a posição final da Assembleia da República sobre o assunto, na qual se considera ‘que a conduta e a natureza das declarações do Senhor José Berardo nesta Comissão podem ser consideradas matéria relevante para avaliação do cumprimento dos deveres legais dos membros das Ordens'”, lê-se no comunicado publicado no site da Presidência da República.
“Tendo em conta a posição daquele órgão de soberania, o Conselho das Ordens Nacionais emitiu parecer favorável à instauração de processo disciplinar nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 55.º da Lei n.º 5/2011, de 2 de Março, a José Manuel Rodrigues Berardo, Grã-Cruz da Ordem do Infante D. Henrique”, conclui o comunicado.
Segundo aquela norma da Lei das Ordens Honoríficas, os membros são obrigados a “defender e prestigiar Portugal em todas as circunstâncias; regular o seu procedimento, público e privado, pelos ditames da virtude e da honra”. O artigo 55.º determina também que, “sempre que haja conhecimento da violação de qualquer dos deveres enunciados no artigo anterior, deve ser instaurado processo disciplinar, mediante despacho do chanceler do respectivo conselho”. O comportamento de Joe Berardo na audiência de inquérito à Caixa poderá não ser entendido como “virtuoso e honroso”, nem sendo dignificador das ordens de que é titular e de Portugal.
O Conselho das Ordens Nacionais é composto pela chanceler, Manuela Ferreira Leite, e os vogais Isabel Mota, José Silva Peneda, Manuel Braga da Cruz (todos com a grã-cruz da Ordem do Infante), Elvira Maria Correia Fortunato, Maria Velho da Costa e Carlos Beato. Agora, cabe à chanceler nomear um relator, que não pode pertencer ao conselho mas tem de ter uma distinção igual à do visado - também a grã-cruz da Ordem do Infante D. Henrique. Esse instrutor tem de ouvir Joe Berardo e depois apresentar um relatório, sobre o qual o conselho delibera e, se for o caso, propõe ao Presidente da República a irradiação do visado.
Só a abertura deste processo de inquérito já é um facto inédito. Até agora, nunca o Conselho das Ordens tinha decidido abrir um processo deste género. Até hoje, só foram retiradas as condecorações em três casos – José Ritto, Carlos Cruz e Armando Vara -, e sempre na sequência de condenações acima de um determinado limite. Nesses casos, aliás, é automático.