Eles estão a melhorar o bairro, “sem orçamento e apenas com voluntários”

Cidadãos disseram sim e estão fazer acontecer no bairro de Santiago, em Aveiro. O primeiro laboratório cívico português está em marcha e cheio de força. Tem dez projectos já a avançar.

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O x-acto quase que atinge um dos dedos das mãos de Ana Catarina. “Nunca tive jeitinho para estas coisas de trabalhos manuais”, confessa, sem deixar de cumprir a tarefa de cortar rolhas de cortiça em metades iguais. Arquitecta paisagista de profissão, decidiu dizer sim ao apelo lançado por um grupo de cidadãos aveirenses que está a promover um laboratório cívico no bairro de Santiago. Ana Catarina foi incluída no grupo que está a trabalhar em torno do projecto “A horta da vizinha é melhor que a minha”, que irá entregar vasos - feitos em cortiça e aproveitando rolhas usadas - com ervas aromáticas e morangos a alguns moradores do bairro. A esta proposta juntam-se outros nove projectos, seleccionados a partir de um total de 34, que estão já a passar do papel para a prática.

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O x-acto quase que atinge um dos dedos das mãos de Ana Catarina. “Nunca tive jeitinho para estas coisas de trabalhos manuais”, confessa, sem deixar de cumprir a tarefa de cortar rolhas de cortiça em metades iguais. Arquitecta paisagista de profissão, decidiu dizer sim ao apelo lançado por um grupo de cidadãos aveirenses que está a promover um laboratório cívico no bairro de Santiago. Ana Catarina foi incluída no grupo que está a trabalhar em torno do projecto “A horta da vizinha é melhor que a minha”, que irá entregar vasos - feitos em cortiça e aproveitando rolhas usadas - com ervas aromáticas e morangos a alguns moradores do bairro. A esta proposta juntam-se outros nove projectos, seleccionados a partir de um total de 34, que estão já a passar do papel para a prática.

Este que é o primeiro laboratório cívico português foi buscar inpiração ao Experimenta Distrito promovido pelo MediaLab-Prado em vários bairros de Madrid, mas com uma grande diferença. Na capital espanhola, o projecto tem um orçamento, que atinge o montante de “50 mil euros”, e “conta com mediadores a trabalhar a tempo inteiro e pagos para tal”; em Aveiro, a experiência está a fazer-se “sem orçamento e apenas com voluntários”, nota José Carlos Mota, um dos promotores do Lab Cívico de Santiago. Como conseguem? “Há empresas a doar os produtos ou serviços necessários para cada um dos projectos”, revela, sem deixar de reparar que o facto de o laboratório estar a ser promovido sem financiamento “não quer dizer que o dinheiro não seja necessário”.

Exemplo disso é o projecto “Fotojornalismo na redacção Santiago”, proposto pelo fotojornalista do PÚBLICO Adriano Miranda, e que acaba de lançar uma campanha de crowdfunding para angariar os 2.800 euros necessários para a sua concretização. “Vamos promover workshops de fotografia com miúdos do bairro e entregar-lhes máquinas fotográficas descartáveis para eles fotografarem o bairro”, introduz Ângela Fernandes, uma das promotoras do Lab Cívico Santiago e mediadora do projecto de fotojornalismo. “Nesta era das fotografias digitais, tiradas com o telemóvel e em que não há limites, vai ser interessante eles perceberem que só vão poder tirar 27 fotos e, depois, esperar pela revelação para ver o resultado final”, nota.

E, tal como acontece em qualquer redacção, em Santiago terão de ser analisadas, discutidas e escolhidas as melhores fotografias de cada “repórter fotográfico” – uma por cada - para as apresentar numa exposição final, a concretizar no bairro. “A ideia será ter telas grandes colocadas nos prédios”, acrescenta Ângela Fernandes, explicando que é precisamente para esta componente do projecto que é necessário dinheiro. “É preciso pagar a impressão destas imagens, em grande formato”, vinca.  

Dia dos Vizinhos com bifanas e caldo verde

Nesta primeira edição do laboratório que visa envolver a comunidade na construção de soluções para melhorar as condições de vida no bairro, estão, ainda, a ser desenvolvidos projectos que vão desde os sabores à tecnologia. Através do “Tec para todos”, por exemplo, serão promovidas oficinas de tecnologia tanto para as pessoas idosas, como para os mais novos – ainda que com abordagens completamente diferentes. “E é curioso ver aqui pessoas de empresas como a Inovaria a ajudar e a associarem-se a este projecto”, realça José Carlos Mota.

Na vertente gastronómica, os projectos “Partilha de saberes e de sabores” e “Receitas da CPLP” prometem conquistar os habitantes do bairro pelo estômago (e não só). E porque é com comida, e à volta de uma mesa, que quase todas as pessoas gostam de conviver, no próximo dia 24, a comunidade é chamada a participar nas comemorações do “Dia do Vizinho” – outro dos projectos seleccionados. “Vai ser um dia de convívio, com música e animação, em que vamos oferecer bifanas e caldo verde, mas convidando os habitantes do bairro a trazerem qualquer coisa para partilhar”, destaca Moisés Ferreira, que foi chamado a dar uma ajuda na coordenação deste projecto. “Como a minha ideia ficou em 11.º lugar e só era possível avançar com dez propostas, vim dar uma ajuda neste projecto”, explica.

Em fase de preparação – tal como previsto, estão a ser desenvolvidas oficinas colaborativas para preparar a implementação dos projectos – estão, também, as  propostas “Sê Fixe, Não Lixe”, “A PróximaAÇÃO”, “Dar vida a Santiago” e “Uma anamorfose em Santiago”. Esta última prevê a criação de um desenho, em conjunto com as crianças do jardim de infância do bairro, para ser reproduzido numas escadas (anamorfose). “A ideia até passa por ligar este projecto ao ‘Sê Fixe, Não Lixes’, no âmbito do qual as crianças vão sensibilizar a população para a reciclagem e os perigos dos plásticos”, desvendou Gil Moreira, mediador do projecto.

A 10 de Junho as propostas e ideias deverão estar já todas implementadas. A organização perspectiva um momento de festa e de reconhecimento a todos quantos deram (e continuam a dar) de si a esta experiência piloto que é também uma forma de democracia participativa. “Com essa nota de agradecimento especial à instituição Florinhas do Vouga, que cedeu os seus espaços aqui no bairro e também a sua equipa para tornar este laboratório cívico possível”, refere José Carlos Mota, destacando, igualmente, as dezenas de voluntários que estão a participar nas oficinas para a implementação dos projectos.