Portugal só usou 25% das verbas europeias para integrar refugiados e imigrantes
Tribunal de Contas analisou a forma como Portugal geriu e utilizou os fundos europeus destinados a receber refugiados e imigrantes, desde o pedido de asilo até à sua integração ou regresso ao país de origem, entre 2014 e 2018. Relatório é publicado esta quarta-feira.
Portugal apenas gastou 11,6 milhões de euros dos mais de 45 milhões de euros de que dispunha em verbas aprovadas pela Comissão Europeia para o programa nacional do Fundo para o Asilo, a Migração e a Integração (FAMI). Assim, e porque o concretizado ficou muito abaixo dos objectivos específicos a cumprir em prazos definidos, o Estado poderá ver anulados montantes já aprovados pela União Europeia (UE) para o apoio, acolhimento e integração de imigrantes ou refugiados.
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Portugal apenas gastou 11,6 milhões de euros dos mais de 45 milhões de euros de que dispunha em verbas aprovadas pela Comissão Europeia para o programa nacional do Fundo para o Asilo, a Migração e a Integração (FAMI). Assim, e porque o concretizado ficou muito abaixo dos objectivos específicos a cumprir em prazos definidos, o Estado poderá ver anulados montantes já aprovados pela União Europeia (UE) para o apoio, acolhimento e integração de imigrantes ou refugiados.
As conclusões estão no relatório de uma auditoria do Tribunal de Contas (TdC) ao programa nacional do FAMI, a que o PÚBLICO teve ontem acesso, e que será tornado público esta quarta-feira. O documento conclui que o Estado português apenas executou 25% das verbas aprovadas.
E salienta que o nível de execução dos projectos junto de refugiados e imigrantes baixa drasticamente – para os 6,4% – se não forem contabilizadas as verbas disponibilizadas para os refugiados que afluíram em grande número à Grécia e a Itália, a partir de 2015, e foram depois recolocados de emergência noutros países europeus, incluindo Portugal. “De facto, foi o esforço adicional decorrente do apoio aos requerentes de protecção internacional que aumentou o grau de execução do programa”, lê-se no relatório.
Do asilo à integração
Antes de 2015, os compromissos de Portugal com a UE repartiam-se por quatro grandes áreas: o asilo, através do qual se pretendia reforçar a capacidade e a qualidade no tratamento dos pedidos de protecção internacional, e melhorar o acolhimento e a resposta (às necessidades das pessoas acolhidas); a integração e migração legal a que correspondiam medidas para acelerar a concessão e a renovação dos títulos de residência; o apoio a um regresso aos países de origem dos cidadãos de países estrangeiros que o solicitassem; e por fim a solidariedade, descrita no programa como a protecção dos direitos e das expectativas das pessoas que procuram protecção internacional mas que não teve qualquer projecto executado.
Para concretizar esses objectivos, são apresentadas em Bruxelas candidaturas de projectos que podem ou não ser aprovados, e depois executados. Nessas quatro áreas, apenas foram executados 1,1 milhões de euros dos 17,1 milhões de euros aprovados, de acordo com a auditoria que incidiu entre 1 de Janeiro de 2014 e 31 de Dezembro de 2017, mas que se prolongou até Julho de 2018 nalgumas actividades analisadas.
Com efeito, no objectivo da recolocação, Portugal conseguiu ver aprovados mais 28,6 milhões de euros. E foi aqui, com a atribuição em quantias fixas a atribuir aos refugiados recolocados de emergência a partir da Grécia e da Itália, entre o final de 2015 e o início de 2018, que foram utilizados 10,5 milhões de euros (desses 28,6 milhões). Isso permitiu elevar o valor total dos projectos concretizados para os 11,6 milhões de euros.
Assim, o TdC conclui que, do ponto de vista “financeiro”, os resultados alcançados “são muito limitados” e sublinha que “foi o esforço adicional decorrente do apoio aos requerentes de protecção internacional que aumentou o grau de execução”.
Em síntese: a maior parte do que foi executado diz respeito à colocação de refugiados na crise dos migrantes a partir de 2015. E mesmo assim, dos 1545 refugiados recolocados em Portugal até Março de 2018 cerca de metade (mais de 700) abandonou o país. Isto acontece, lembra o TdC, apesar de as regras estabelecidas em 2014 preverem que este Fundo para o Asilo, a Migração e a Integração, “deverá não só apoiar os esforços dos Estados-membros para proporcionar no seu território protecção internacional aos refugiados mas também apoiar uma solução duradoura para os mesmos, tendo em vista promover a sua integração efectiva”.
Valores irrisórios
Dos quatro milhões aprovados para iniciativas destinadas ao asilo em Portugal apenas foram usados 265 mil euros – ou seja 6,6%. Dos mais de nove milhões aprovados para dar respostas aos migrantes legais e à sua integração, foram executados menos de 321 mil euros – o que representa 3,5%. Desses nove milhões de euros, 7,7 milhões estavam destinados à integração em Portugal dos imigrantes e refugiados; dos mais de 1,4 milhões de euros atribuídos à capacitação, apenas foram concretizados projectos abaixo dos 17 mil euros.
O regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho Europeu, aprovado em 2014 para a concretização do Programa Nacional para o FAMI, prevê a anulação das verbas quando os projectos não atingiram determinadas etapas até dois anos passados sobre a data da autorização orçamental.
A fraca execução do fundo disponível para Portugal levou a Comissão Europeia a considerar em Março de 2018 anular parte dos compromissos, o que resultaria numa perda de 16,7 milhões de euros para Portugal. No final do ano, porém, a Comissão Europeia permitiu diferir a utilização de verbas não aproveitadas para a recolocação dos refugiados e a sua utilização noutros objectivos.
No contraditório apresentado no relatório pelas entidades envolvidas ou visadas, a Secretaria-Geral do Ministério da Administração Interna (SGMAI) considera que não existe já o risco de anulação das verbas e garante que “as autoridades nacionais estão a preparar as alterações necessárias ao programa nacional do FAMI para garantir a redistribuição de 15,8 milhões de euros não utilizados” no âmbito da recolocação de emergência dos refugiados que tinham afluído em grande número à Grécia e à Itália.
A SGMAI invoca “dificuldades e constrangimentos” relativas às “circunstâncias particularmente difíceis da história recente” de Portugal e da UE, que diz terem sido superadas para “cumprir os objectivos alcançados”.
Além da SGMAI, a quem compete gerir e executar o programa nacional juntamente com o Alto Comissariado para as Migrações (ACM), foram ainda envolvidos nesta auditoria o SEF, a missão em Portugal da Organização Internacional para as Migrações, a Cruz Vermelha Portuguesa e o Serviço Jesuíta de Apoio aos Refugiados. O ministro da Administração Interna e o SEF não se pronunciaram.
No entanto, o TdC considera que se mantém “latente o risco de anulação de verbas” face ao “baixo nível de execução” nos objectivos das quatro áreas iniciais – Asilo, Integração e Migração Legal, Regresso e Solidariedade – a realocação de verbas agrava a necessidade de execução (nesses objectivos). E conclui: “Para não haver perda de verbas é necessário apresentar mais despesa certificada à Comissão Europeia”, o que, tendo em conta “o ritmo de execução referido, será difícil”.