Lucy Hawkes espia “animais atletas” para os proteger das alterações climáticas
A ecóloga britânica especializada em animais migradores esteve no Porto para a Conferência National Geographic. “Precisamos de saber como é que as alterações climáticas os vão afectar e às suas rotas migratórias.”
Lucy Hawkes inclina a cabeça para a frente, leva as mãos às pequenas argolas que escolheu usar nesse dia e revela: “Estes brincos são o dispositivo de tracking mais pequeno do mundo.” Das orelhas da britânica de 39 anos especializada em animais migradores — ou “animais atletas”, como gosta de lhes chamar — pendem dois pequenos dispositivos verdes, cada um com menos de um grama de peso. “São reais e vou mesmo colocá-los em andorinhas-do-mar-árcticas na Islândia, já em Junho. Achei que seria giro usá-los hoje.” A ecóloga, que decidiu enveredar pela ecologia fisiológica, foi uma das oradoras da Conferência National Geographic (National Geographic Summit), na segunda-feira, no Porto, centrada na questão “Planeta ou Plástico?”.
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Lucy Hawkes inclina a cabeça para a frente, leva as mãos às pequenas argolas que escolheu usar nesse dia e revela: “Estes brincos são o dispositivo de tracking mais pequeno do mundo.” Das orelhas da britânica de 39 anos especializada em animais migradores — ou “animais atletas”, como gosta de lhes chamar — pendem dois pequenos dispositivos verdes, cada um com menos de um grama de peso. “São reais e vou mesmo colocá-los em andorinhas-do-mar-árcticas na Islândia, já em Junho. Achei que seria giro usá-los hoje.” A ecóloga, que decidiu enveredar pela ecologia fisiológica, foi uma das oradoras da Conferência National Geographic (National Geographic Summit), na segunda-feira, no Porto, centrada na questão “Planeta ou Plástico?”.
A investigadora da Universidade de Exeter, no Sudoeste de Inglaterra, dedica-se a seguir animais pelo mundo. “Estudo como é que um animal vai aonde vai”, resume, em entrevista ao P3. Para isso, Lucy Hawkes e a equipa que a acompanha colocam ou implantam em animais dispositivos de tamanho variável — desde os maiores, usados em tubarões, aos mais pequenos, como os que mostrou na Casa da Música, horas antes da palestra — e estudam a informação recolhida.
Tartarugas marinhas, tubarões-frade, atuns-de-barbatana-azul, andorinhas-do-mar-árcticas e gansos-de-cabeça-listada são as espécies que está, neste momento, a seguir, qual “Big Brother do reino animal”, a partir dos dados enviados, via satélite, para o computador. Mas o que é comum a todos estes animais, independentemente de serem da terra, do ar ou da água? “O movimento”, responde: mapear as zonas do planeta por onde viajam é importante para “perceber os seus limites e a razão de irem numa direcção e não noutra”.
“Precisamos de saber como é que as alterações climáticas os vão afectar e às suas rotas migratórias”, diz. E fazê-lo — em conjunto com “milhares de outros investigadores um pouco por todo o mundo” — pode significar, por exemplo, perceber que as tartarugas marinhas macho podem vir a estar em perigo devido ao aquecimento dos oceanos. “Nesta espécie, o género não é determinado pela genética, mas sim pela temperatura: em fase de incubação, os ovos tornam-se fêmeas se estiverem quentes e machos se estiverem frios.” Actualmente, revela, “90% das tartarugas marinhas já são fêmeas”.
O mistério dos tubarões-frade
“As pessoas pensam que a ciência é uma área rígida, mas a monitorização dos animais é algo realmente criativo”, sublinha. “Viajo para todo o lado, tenho o privilégio de pegar em tartarugas marinhas para lhes colocar um dispositivo e vê-las nadar, a seguir.” Mas a história nem sempre tem um final feliz: uma em cada 50 tartarugas acaba num barco de pesca, estima a também exploradora da National Geographic, que se apercebe disto quando os dispositivos mostram rotas lineares.
Neste momento, contudo, o foco da ecóloga são os tubarões-frade que vivem ao largo da Escócia e se deslocam, frequentemente, até aos Açores e à costa de Marrocos. “Ninguém sabe como é que estes animais, com dez metros de comprimento, se reproduzem. Nunca foram observados a acasalar ou a dar à luz. É um mistério total”, conta, entusiasmada. Isto porque o mistério pode estar perto do fim: em 2018 colocou câmaras em alguns indivíduos para “os espiar” e aprender como vivem. “Vamos voltar em Julho e esperamos ter alguma pornografia de tubarões para ver”, admite, a rir — mas a falar muito a sério.
Lucy Hawkes segue o rasto de animais que cruzam o oceano Atlântico várias vezes por ano e exploram o Mediterrâneo, como o atum-de-barbatana-azul, e, durante as migrações, “vêem e sentem o rasto humano”: plástico, poluição, navios, aviões, dióxido de carbono. As alterações climáticas, consente, “requerem uma mudança política a uma escala em massa”; mas, no caso do plástico descartável, “todos podemos fazer algo e ser parte da solução”, nunca é de mais dizê-lo. “Se virem uma banana embrulhada em plástico, não a comprem, por amor de Deus!” A embalagem, se não for reutilizada ou reciclada, vai engrossar os nove milhões de toneladas de detritos plásticos que, todos os anos, atingem os oceanos e interferem com a vida dos animais e as suas rotas migratórias.
Na abertura da conferência que deu na Casa da Música, perante uma Sala Suggia repleta, a ecóloga partilhou uma fotografia sua a cruzar uma meta, de braços levantados em jeito de vitória. Quando correu a maratona de Londres em 2004, durante mais de três horas, apercebeu-se da pequenez do feito: uma andorinha-do-mar-árctica pode voar entre seis a 16 maratonas por dia durante a longa migração desde a Gronelândia até à Antárctida. “O dia mais importante da minha vida não é nada para esta ave.”