Em Campo de Ourique há um Bicho Mau com comida boa
Rita e Tomás passaram pela Cevicheria, estiveram à frente de um restaurante em Nice e agora abriram o seu espaço em Lisboa, onde servem, por exemplo, um “porco que queria ser ovelha” ou um “Kraken na floresta”.
Rita coloca em cima do balcão um pequeno caderno a caminhar para o desconjuntado onde ao longo dos últimos meses ela e o companheiro, Tomás Andrade Rocha, foram anotando ideias que lhes iam surgindo para o restaurante que queriam abrir. Há listas de ingredientes que gostariam de trabalhar, esquemas de organização, possíveis receitas.
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Rita coloca em cima do balcão um pequeno caderno a caminhar para o desconjuntado onde ao longo dos últimos meses ela e o companheiro, Tomás Andrade Rocha, foram anotando ideias que lhes iam surgindo para o restaurante que queriam abrir. Há listas de ingredientes que gostariam de trabalhar, esquemas de organização, possíveis receitas.
Hoje, precisamente no dia em que conversamos com Rita, o restaurante Bicho Mau, no bairro lisboeta de Campo de Ourique, está finalmente a tornar-se realidade. Abriu portas para receber a Fugas antes da abertura oficial (que aconteceu no dia 24), mas, enquanto falamos, há quem passe na rua e não resista a entrar no espaço acolhedor, com ar de bistrô francês.
Rita tenta gerir o inesperado. Continua a contar-nos esta aventura ao mesmo tempo que recebe os primeiros pedidos e prepara os pratos que os clientes-surpresa começaram já a pedir, de uma lista curta, mas aberta a mudanças ao ritmo que os produtos disponíveis na estação, no dia ou no mercado assim o exigirem.
É, aliás, esse “o grande desafio do cozinheiro”, diz Rita. “É a Rosa [que vende peixe no Mercado da Ribeira] dizer ‘temos salmonetes’ e o Tomás olhar para mim e perguntar ‘Rita, queremos salmonetes?’. Se tivermos uma cozinha muito organizada, de método, isso dá-nos segurança para de manhã perdermos se calhar vinte minutos a discutir o que fazemos com os salmonetes.”
Conheceram-se na Cevicheria, o restaurante de Kiko Martins no Príncipe Real, em Lisboa, e estiveram depois um ano e meio em Nice à frente de um restaurante, projecto de um imigrante português. Foi aí que se deixaram inspirar pelo francês Dominique Le Stanc que, depois de conquistar duas estrelas Michelin, achou que o que queria realmente era ter um bistrô descontraído. Assim, começaram a pensar no espaço que gostariam de abrir em Lisboa.
Ainda puseram a hipótese de criar um pop-up mas as coisas não são assim tão fáceis e quando descobriram este lugar mesmo em frente à Casa Fernando Pessoa, não hesitaram. Era tempo de abrir o Bicho Mau, de “bater o pé”, como diz a Rita, e de anunciar: estamos aqui e não queremos continuar a trabalhar para grandes chefs, mas sim ter o nosso próprio restaurante e fazer a nossa própria comida.
Seguem os princípios da proximidade e sazonalidade e tentam trabalhar com pequenos produtores e projectos diferenciados. O pão é da padaria de Arroios Terrapão, por exemplo, e um dos pratos é feito com o porco mangalitsa, uma raça de origem húngara criada no Fundão por um belga. Como são animais lanzudos, baptizaram o prato como “O porco que quis ser ovelha”. A carne tem “uma gordura incrível”, explica Tomás, que criou um prato, uma espécie de pain perdu, usando os brioches da Terrapão.
Entre as propostas deste menu de estreia, destacam-se as favas alentejanas com rabo de boi e a original apresentação do “Kraken na floresta”, uma lula servida num prato de vidro transparente colocado sobre o base de madeira, na qual Rita e Tomás criaram uma espécie de presépio com madeiras e musgos. Entre as sobremesas, provámos uma que nasceu em Nice, um crème brulée que aproveita um doce francês e o mistura com a muito portuguesa banana com queijo (em França usavam um queijo francês, aqui usam o Serra da Estrela).
“Sempre tivemos o bichinho de ter o Bicho”, conta Rita. E aí está: o Bicho Mau já nasceu e promete “bater o pé” para dizer que existe e que vale a pena.