Há 49 técnicos em falta nos serviços de Arqueologia da DGPC, denuncia sindicato
Sem reforço das equipas, não há como dar resposta a algumas das necessidades mais elementares na salvaguarda do património. O alerta é dado pelo Sindicato dos Trabalhadores de Arqueologia (Starq), que convocou uma greve para esta terça-feira.
Desde 2000 que o volume de trabalho na área da arqueologia tem vindo a aumentar de forma consistente na Direcção-Geral do Património Cultural (DGPC) sem que tenha havido um reforço das equipas da área. Contratações pontuais ou temporárias para funções permanentes, técnicos que se reformam sem que sejam substituídos e processos administrativos que se avolumam sobre as secretárias. Resultado? Prazos vencidos e empobrecimento da qualidade dos serviços.
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Desde 2000 que o volume de trabalho na área da arqueologia tem vindo a aumentar de forma consistente na Direcção-Geral do Património Cultural (DGPC) sem que tenha havido um reforço das equipas da área. Contratações pontuais ou temporárias para funções permanentes, técnicos que se reformam sem que sejam substituídos e processos administrativos que se avolumam sobre as secretárias. Resultado? Prazos vencidos e empobrecimento da qualidade dos serviços.
Este é o retrato feito pelo Sindicato dos Trabalhadores de Arqueologia (Starq) que, depois de reunir com a direcção da DGPC há uma semana, resolveu manter para esta terça-feira a greve dos funcionários afectos ao sector neste que é o maior dos organismos do Ministério da Cultura (MC). “Sem pessoas não há milagres. Mesmo quando os trabalhadores são dedicados e, por amor à camisola, fazem muito mais horas do que é suposto sem que ninguém lhes pague, há sempre atrasos nas respostas, muita coisa que fica por fazer e outras que são feitas sem que as pessoas possam dedicar-lhes o tempo e atenção que exigem”, diz Jacinta Bugalhão, delegada sindical e arqueóloga do Departamento dos Bens Culturais/Extensão Territorial de Arqueologia de Lisboa, da DGPC.
É precisamente na área de Lisboa, explica, que se nota mais o “crescimento enorme, gradual mas consistente”, que se tem vindo a sentir na actividade arqueológica em Portugal desde 2000, defende esta técnica que trabalha no sector público do património há 30 anos. Nos anos da crise, que teve o seu pico em 2008, houve um abrandamento nalgumas zonas do país, “mas em Lisboa nunca”.
Na capital há agora mais de 300 intervenções arqueológicas por ano, com exigências muito diferentes. Umas implicam apenas algumas horas de trabalho de um arqueólogo da DGPC, outras podem obrigar ao acompanhamento durante o ano inteiro ou até mais.
Propostas concretas
Perante o aumento das obras, sobretudo nos centros históricos das grandes cidades, a crónica falta de técnicos de Arqueologia na DGPC criou uma tempestade perfeita para a qual os funcionários têm vindo a alertar as suas chefias nos últimos anos. “Há cerca de um ano, tornámos as nossas preocupações oficiais. Pusemos tudo por escrito, apresentámos propostas para mudar as coisas e nada. A direcção vai dizendo que tem conhecimento das dificuldades mas não faz nada”, explica Jacinta Bugalhão.
Na reunião da passada terça-feira, de acordo com o Starq, Paula Silva, directora-geral do Património Cultural, voltou a reconhecer estar ao corrente da situação que motiva a greve, mas, depois de elencar os esforços feitos nos últimos tempos para reforçar os serviços quer ao abrigo da mobilidade da Função Pública, quer no âmbito do PREVPAP (Programa de Regularização Extraordinária dos Vínculos Precários na Administração Pública), reiterou que não tem autonomia para resolver a questão de fundo. Só o Governo pode autorizar a contratação de trabalhadores. À DGPC resta comunicar à tutela as suas necessidades, o que tem feito, assegurou Paula Silva.
“Até aqui a DGPC não reconheceu publicamente a necessidade de contratar funcionários, a não ser quando diz que faltam vigilantes para os museus e, mesmo aí, só quando algum director abre a boca e ameaça fechar porque não pode garantir a segurança das suas colecções”, contrapõe Jacinta Bugalhão. “Quando se trata de trabalho administrativo, como aqui, ou das áreas invisíveis dos museus, como a conservação ou o arquivo, a DGPC não diz publicamente nada. Nem nunca apresentou, que saibamos, propostas concretas ao MC a dizer que faltam x técnicos para aqui e x técnicos para ali.”
O mapa das necessidades de funcionários no que toca à Arqueologia foi feito agora pelo Starq. Faltam 49 técnicos, entre arqueólogos (17), conservadores-restauradores (sete), arquivistas (cinco) e investigadores em arqueociências (sete). Só no Museu Nacional de Arqueologia (MNA) são precisos 20 trabalhadores.
“A situação no MNA e no CNANS [Centro Nacional de Arqueologia Náutica e Subaquática] tem sido muito mediatizada, mas da falta de funcionários nos serviços centrais, que põe em causa uma série de processos de licenciamento de obras, a revisão e aprovação de relatórios de trabalhos arqueológicos e até a autorização de novos projectos pelo país todo nunca se fala”, sublinha a arqueóloga. “Isto é tudo muito burocrático, é verdade, mas é esta teia administrativa a primeira garantia da salvaguarda do património do país, e não só de património arqueológico. Quando ela falha – e já tem falhado – é a medida mais básica da protecção do património que não podemos assegurar. As coisas não são mais graves porque, repito, há dedicação dos funcionários.”
Lembra a arqueóloga que, no que diz respeito a Lisboa, por exemplo, como boa parte da cidade está coberta por medidas de protecção, qualquer processo de licenciamento requer a aprovação não apenas dos serviços camarários, mas também da DGPC. Quando aprovadas, muitas destas obras exigem depois trabalhos arqueológicos ou, pelo menos, acompanhamento. “Quando os serviços se atrasam a dar resposta e falham prazos, a lei diz que alguns dos pedidos têm aprovação tácita. Quando os técnicos não conseguem olhar como deve ser para os processos porque não têm tempo ou não puderam sequer ir ao terreno apesar de sentirem que precisavam de o fazer, isso reflecte-se na qualidade dos seus pareceres.”
Para já, a DGPC prometeu um reforço de quatro funcionários: um técnico de conservação e restauro para o CNANS e três funcionários para a área de salvaguarda dos serviços centrais. Pelas contas do Starq faltam 45. “Nós fizemos um diagnóstico de necessidades e justificámos técnica e legalmente cada funcionário em falta. Agora a DGPC tem de agir. Não basta dizer que é o Ministério das Finanças que tem de autorizar a abertura dos quadros de pessoal e que é a Cultura que tem de pressionar. A DGPC não se pode demitir de apresentar propostas concretas à tutela.”
No próximo dia 30, os arqueólogos têm reunião marcada com a secretária de Estado da Cultura para apresentar este diagnóstico.
Entretanto, já esta terça-feira, haverá um piquete de greve nas futuras instalações do Centro Nacional de Arqueologia Náutica e Subaquática, em Xabregas, local escolhido para o lançamento do Programa Cultura, financiado pelo Mecanismo Financeiro do Espaço Económico Europeu — EEA Grants 2014-2021, cerimónia em que participam os ministros da Cultura, Graça Fonseca, e do Planeamento, Nelson de Souza.