É a água, estúpido!

Com Portugal ameaçado na sua existência pela seca, é surpreendente que nenhum político em campanha tenha ainda referido esta questão de vida ou de morte.

Em época de eleições, eleitoralismo. Este é um “clássico” a que a classe política nos habituou. O país tem andado dominado por uma avalanche de revelações a que a Comunicação Social, sempre saudosa do glorioso episódio do “Watergate”, já apelidou de “Familygate".

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Em época de eleições, eleitoralismo. Este é um “clássico” a que a classe política nos habituou. O país tem andado dominado por uma avalanche de revelações a que a Comunicação Social, sempre saudosa do glorioso episódio do “Watergate”, já apelidou de “Familygate".

Com pingue-pongue eleitoralista ou sem, a dimensão e escala do nepotismo no PS ultrapassa o imaginável, e ultrapassa muito a simples acusação de “aristocracia/oligárquica”, para atingir o perfil omnipresente de “Dono Disto Tudo” da democracia portuguesa, ou seja, de grande “gestor” das conquistas de Abril.

Não que este fenómeno seja exclusivo do PS, pois é uma tendência verificada em toda a classe política, mas é o PS que agora é Governo e pretende ser, de novo, Governo.

Mas isto em relação ao tema deste artigo é secundário, e apenas muito importante pelo facto de que em plena campanha eleitoral para o Parlamento Europeu as mentes andam ocupadas por estas fragilidades da democracia representativa, precisamente num momento em que esta é ameaçada por uma inédita crise de credibilidade e de confiança, numa Europa onde o comum cidadão se sente ameaçado e manipulado por uma globalização galopante, que o deixa desprotegido, enfraquecendo progressivamente o seu direito ao trabalho e à habitação. Sentindo-se, ele, traído pela esquerda, esta também globalizada, que substituiu a sua tradicional moral e as suas preocupações sociais pela questões “fracturantes” e colocou todo o seu engagement nas questões migratórias e o multiculturalismo.

Estes sentimentos são também dirigidos à direita que se empenhou numa Europa Federalista, custe o que custar, guiada por uma outra globalização: a do trânsito livre do trabalho e do capital, inspirado pelos dogmas do neoliberalismo.

Pôs-se assim de parte o equilíbrio original do mercado comum que defendia o princípio da unidade europeia baseada na premissa e condição da diversidade cultural e nacional entre os Estados-membros.

As presentes tensões vindas de radicalismos populistas que apregoam a democracia directa e que pretendem penetrar em massa no Parlamento a fim de o erodir e minar por dentro, caos bem ilustrado no ensaio geral do “Brexit”, vai obrigar a UE a uma reforma de elites, linha de conduta e objectivos.

Ora, é neste contexto que Portugal é ameaçado na sua existência, não de forma temporária, mas definitiva, pelas alterações do clima, que estão a tornar os ciclos de seca cada vez mais frequentes, e segundo os avisos dos peritos, com tendência a tornarem-se permanentes, quando afirmam que a Península Ibérica está a evoluir para um padrão de clima do Norte de África.

Este mesmo diário tem dedicado grande atenção à questão do Tejo, e da nossa dependência total da boa ou má vontade de Espanha que controla grande parte da água e dos caudais em Portugal, através da “gestão” das suas barragens e necessidades de regadio através de transvases massivos da indispensável e preciosa água.

É, portanto, surpreendente que nenhum político em campanha tenha ainda referido esta questão de vida ou de morte.

Paulo Rangel teve o desplante surpreendente de afirmar categoricamente, numa conferência organizada pelo Jornal de Notícias na Casa da Música, no Porto: "Há-de chegar um dia em que não vai haver Portugal.” Preocupação, profecia ou ilustração de uma campanha para as eleições europeias? Perdoai-lhe, senhor...