Espanha divulga manuscrito emblemático da literatura medieval portuguesa
Folha manuscrita do manual de caça e cavalaria que D. João I mandou fazer na primeira metade do século XV foi mostrada em Madrid. Foram precisos cinco anos para que uma cuidada investigação conduzisse a 24 fragmentos da obra, reutilizados para guardar outros documentos num arquivo da Galiza.
O Ministério da Cultura de Espanha e a Polícia Nacional espanhola apresentaram esta terça-feira, em Madrid, uma folha manuscrita restaurada do Livro da Montaria, redigido no século XV, na corte de D. João I de Portugal.
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O Ministério da Cultura de Espanha e a Polícia Nacional espanhola apresentaram esta terça-feira, em Madrid, uma folha manuscrita restaurada do Livro da Montaria, redigido no século XV, na corte de D. João I de Portugal.
Trata-se de um “fragmento” de uma obra “emblemática da literatura medieval portuguesa” e “fundamental” para o estudo da arte de caçar dessa época, explicou o director-geral das Belas-Artes espanholas, Román Fernández-Baca.
A “preciosa” folha manuscrita, que tinha sido roubada em 1995 e recuperada em 2014, foi “restaurada, estudada e digitalizada”, e vai agora ser devolvida esta quinta-feira, 4 de Abril, ao Arquivo Provincial de Lugo (Galiza). O Livro da Montaria original está desde 1600 na biblioteca do colégio da Companhia de Jesus de Monforte de Lemos (concelho de Lugo). Pensa-se que a obra teria sido doada a essa instituição pelo cardeal Rodrigo de Castor Osório, filho da III condessa de Lemos, com ligações à família real portuguesa.
Após a expulsão dos jesuítas de Espanha, no século XVIII, a obra desapareceu e foi considerada destruída. O Livro da Montaria, escrito por iniciativa directa do rei D. João I, entre 1415 e 1433, descreve ensinamentos práticos sobre a arte da cavalaria e técnicas específicas para caçar diferentes presas, sobretudo o urso e o javali.
O livro só era conhecido através de testemunhos medievais, entre eles as referências feitas pelo filho e sucessor do monarca português, o rei D. Duarte, e pelos registos na sua biblioteca.
Até à recuperação deste manuscrito, considerava-se que havia apenas três exemplares do Livro da Montaria, todas elas cópias posteriores ao período medieval. A mais antiga, datada de 1626 e feita a partir do livro a que pertence o fragmento hoje apresentado, está guardado na Fundação Oriente, em Lisboa. Os dois posteriores foram elaborados em 1844 e em 1897 e estão, respectivamente, na Biblioteca Nacional de Lisboa e na Biblioteca Geral da Universidade de Coimbra.
“A montaria era muito importante naquela época, porque era uma forma de preparação para a guerra”, explicou Severiano Hernández, subdirector-geral dos Arquivos Estatais.
A investigação sobre a localização do Livro da Montaria foi iniciada em Fevereiro de 2014, quando o Arquivo Provincial de Lugo localizou outros 24 “fragmentos” dessa obra que tinham sido “reutilizados” para proteger vários livros com actos ou escrituras notariais feitas em Monforte de Lemos, no século XVIII. De acordo com o que então foi explicado, sendo as folhas de pergaminho mais resistentes do que o papel comum, os “fragmentos” do Livro da Montaria foram utilizados para embrulhar as escrituras notariais.
“A folha recuperada foi devolvida em 2014 pela família de uma pessoa que supostamente tinha subtraído o fragmento” em 1995, disse o comissário-chefe da Unidade de Delinquência Especializada e Violenta da Polícia Nacional espanhola, Enrique Juárez.
Escrito entre 1415 e 1433, o livro tem 70 capítulos divididos por três volumes e estava erradamente classificado como contendo um texto musical.