Marcelo Rebelo de Sousa em entrevista: “As instituições europeias fecham em Agosto – é o contraste total com a realidade”

Numa grande entrevista na edição deste domingo, conduzida por Teresa de Sousa, o Presidente da República afirma que a Europa está hoje mais exposta à “guerra secular que está em curso entre os EUA, a China e a Índia quanto a saber qual será o centro económico do mundo no futuro”.

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Miguel Manso

A Europa não sobreviverá sem um novo projecto. Que ainda não tem. Ser-lhe-á difícil, sem ele, responder aos desafios de um mundo que mudou completamente ou aos anseios dos seus cidadãos. São algumas das ideias de uma entrevista ao Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, a décima de 11 entrevistas da série A Europa e o Presente, e que já pode ler na íntegra no P2 deste domingo.

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A Europa não sobreviverá sem um novo projecto. Que ainda não tem. Ser-lhe-á difícil, sem ele, responder aos desafios de um mundo que mudou completamente ou aos anseios dos seus cidadãos. São algumas das ideias de uma entrevista ao Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, a décima de 11 entrevistas da série A Europa e o Presente, e que já pode ler na íntegra no P2 deste domingo.

Preocupa-o o futuro da Europa num mundo cujo centro se desloca de Ocidente para Oriente. “O mundo que existia na altura [antes da crise de 2008] já não existe e a Europa que existia na altura já não existe”. A Europa está hoje mais exposta à “guerra secular que está em curso entre os EUA, a China e a Índia, quanto a saber qual será o centro económico do mundo no futuro.”

Imagina um G7 dos países mais ricos do mundo daqui a dez ou 20 anos onde “não haverá, praticamente países europeus nas cimeiras”. Talvez a Alemanha. Como é que a União Europeia pode reagir às novas circunstâncias? Marcelo Rebelo de Sousa entende que apenas através de um novo projecto que lhe dê sentido e coesão, como os que existiram ao longo da sua História. “De repente, deixou de haver projecto”, diz. “O último que existiu foi corporizado pela senhora Merkel – um projecto muito alemão, mais do que um projecto do eixo Paris-Berlim, porque a certa altura passou a haver um eixo Berlim-Berlim. Devido à fraqueza da componente Paris.”

Esse projecto, diz ainda o Presidente da República, tem de ser político, económico e com uma dimensão social. “Saiu-se da crise em termos de crescimento, ainda que inferior ao que se registava antes dela. E quer os sacrificados da crise quer os que não recuperaram com a tímida recuperação europeia, constituem um ‘exército de reserva’ de insatisfação crónica para o populismo”. Mas não é só isso: “Há novas gerações com novas visões do mundo e, para essas gerações, os problemas são outros”, diz. “A Europa está muito envelhecida e tem pouco a dizer a esses jovens.” “É uma Europa com mais clivagens, mais divisões, com lideranças fracas, com novos problemas e com velhas questões sociais”, diz o Presidente, considerando que é preciso ir até às causas dos problemas se se quer combater os novos fenómenos do populismo e do nacionalismo.

Adverte também para instituições europeias que ainda não se adaptaram a um tempo e a um espaço que mudou profundamente. “As instituições europeias fecham em Agosto – é o contraste total com a realidade.” Da mesma maneira, as democracias representativas também sentem dificuldade “em ajustar-se a estes tempos aceleradíssimos e a este espaço global” – “a pulsões directas e inorgânicas crescentes” e a um novo panorama mediático “em que os cidadãos são convidados a uma intervenção permanente e instantânea”. O filtro garantido pelos media tradicionais está em crise. Como se deve lidar com partidos antiliberais que ocupam hoje o poder na Hungria ou na Polónia? Marcelo defende a pedagogia, que a Europa não tem praticado, mas diz que os valores são fundamentais. “A Europa é um projecto de valores, ou não é nada.” São eles que devem definir as fronteiras.

Não se espanta com a ausência de partidos populistas ou nacionalistas em Portugal. Atribui o facto a vários factores, que vão da relativa juventude da nossa democracia a uma vasta rede de instituições de solidariedade social, mas também à plasticidade e à solidez institucional que os partidos do sistema, que existem desde o 25 de Abril, revelaram. Mas há sinais, ainda que apenas sinais, de mudança. “Multiplicam-se os movimentos inorgânicos. Há movimentos de opinião à margem dos partidos políticos”, “há agora novas formações que obrigam aquelas de que saíram a ajustarem-se a esse novo desafio.” Para concluir: “Os novos desafios vão exigir novas respostas.”