Já foram registados 139 casos de cólera na Beira
Campanha de vacinação começa para a semana e as organizações estão a montar hospitais de campanha e centros de desinfecção. Existe o risco de o surto se agravar, mas "depende da capacidade de controlar”.
O número de casos de cólera na Beira, capital da província moçambicana de Sofala, devastada pelo ciclone Idai, subiu para 139, disse o director nacional de Saúde de Moçambique, Ussein Isse. Cinco novos casos surgiram na quarta-feira.
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O número de casos de cólera na Beira, capital da província moçambicana de Sofala, devastada pelo ciclone Idai, subiu para 139, disse o director nacional de Saúde de Moçambique, Ussein Isse. Cinco novos casos surgiram na quarta-feira.
Na província de Sofala foram instalados nove centros de tratamento de cólera e uma campanha de vacinação deve iniciar-se no princípio da próxima semana, prevendo-se que um milhão de pessoas possam ser vacinadas.
De acordo com o departamento das Nações Unidas para os Assuntos Humanitários, foram ainda detectados 2500 casos de diarreia aguda na região.
O ciclone Idai, que atingiu o país nos dias 14 e 15 de Março, provocou inundações extensas e as águas estagnadas, corpos em decomposição, ausência de esgotos e a falta de higiene são propícias ao aparecimento de propagação da cólera, além de malária e surtos de diarreia.
O balanço provisório da passagem do ciclone indica 493 mortos em Moçambique, onde a área submersa é de cerca de 1300 quilómetros quadrados, segundo estimativas de organizações internacionais.
O ciclone assolou também o Malawi e o Zimbabwe, pelo que pelo menos 2,8 milhões de pessoas nos três países africanos foram afectados.
A cidade da Beira, no centro litoral de Moçambique, foi uma das mais devastadas pelo ciclone, na noite de 14 de Março, e a ONU alertou que 400 mil pessoas desalojadas necessitam de ajuda urgente, avaliada em mais de 40 milhões de dólares (mais de 35 milhões de euros).
Duas semanas depois da tempestade, milhares de pessoas continuam à espera de socorro em áreas que foram atingidas por ventos superiores a 170 quilómetros por hora, chuvas fortes e cheias, que deixaram um rasto de destruição em cidades, aldeias e campos agrícolas.
A Cruz Vermelha Portuguesa (CVP) e a organização não-governamental Médicos do Mundo inauguraram na quinta-feira simbolicamente o início das operações em Moçambique, num complexo de tendas onde também é diagnosticada a cólera.
Sete tendas da CVP e dos Médicos do Mundo estão montadas junto do centro de saúde de Macurungo, um dos bairros mais populosos e com piores condições sanitárias da Beira, ao lado de outras sete tendas montadas pela UNICEF e que vão servir apenas para despistagem e tratamento da cólera.
Enquanto os 20 portugueses de forma simbólica davam início ao trabalho, faziam-se buracos no chão para colocar pilares e uma vedação a isolar a zona da UNICEF, com o apoio da organização Médicos Sem Fronteiras (MSF), especialmente dedicada ao tratamento da cólera.
O centro está a ser preparado “antes que haja uma eclosão dramática de cólera”.
“Só ontem [quarta-feira] quatro casos suspeitos ficaram lá”, disse à Lusa Armindo Figueiredo, médico dos Médicos do Mundo, um veterano neste trabalho, com missões já em países como Timor-Leste, Haiti, Sri Lanka ou Paquistão.
Armindo Figueiredo faz parte de um pequeno grupo de quatro profissionais da organização, que se juntou a outros 16 da CVP e que estão desde segunda-feira na Beira, para prestar apoio médico no hospital de campanha hoje “inaugurado”.
Com eles vieram 35 toneladas de medicamentos, alimentos, material logístico (como geradores) e material médico. Todo esse material deve ser doado a Moçambique no final da missão.
As duas entidades vão ainda preparar um bloco de partos, a pedido das autoridades moçambicanas, e a partir de sexta-feira contam começar a dar consultas, em duas tendas que vão conter seis postos de atendimento.
Lara Martins, vice-presidente da CVP e chefe da missão, também ela veterana mas em missões militares (na Somália por exemplo) em entrevista à Lusa, explicou que ao todo estão no hospital seis médicos e sete enfermeiros, além de outro pessoal, disse que a CVP entregou já 15 toneladas de alimentos ao Programa Alimentar Mundial, e explicou que a missão principal é reforçar o centro de saúde de Macurungo, em termos clínicos e materiais.
Já a funcionar no complexo da CVP/Médicos do Mundo está uma sala (tenda) que serve de centro de coordenação, e está preparada uma sala para doentes em cuidados intensivos e outra para serviço de observação, com equipamento de monitorização e macas. E outras duas tendas serão as duas salas de consulta, para já equipadas com material de desinfecção, cadeiras de rodas e outro material.
Segundo a responsável, o apoio dos portugueses para Moçambique através da Cruz Vermelha já chegou a 1,4 milhões de euros, o que dá à equipa em Macurungu “uma responsabilidade acrescida”.
Os portugueses não vão estar directamente envolvidos na questão da cólera, embora possam fazer reencaminhamento de doentes. Armindo Figueiredo lembrou, em declarações à Lusa, que a cólera exige um grande esforço de desinfecção, e disse que também há muitos casos de malária, pela proliferação de mosquitos devido à água acumulada.
A UNICEF está também a construir uma zona de desinfecção, que é feita à base de cloro, e estão a ser criados sistemas de latrinas. Ninguém da UNICEF fez declarações, remetendo para uma conferência de imprensa futura.
Armindo Figueiredo prevê umas próximas semanas cheias de trabalho e Gonçalo Órfão diz que ainda é cedo para dizer se vai ser grave a situação. “Os dados que são partilhados não são suficientemente concretos. Existe sim, mas depende da capacidade de a controlar”.