Kursk, o elogio do profissionalismo
O autor de A Caça e A Festa cumpre o “caderno de encargos” da grande produção europeia de prestígio com profissionalismo, mas sem especial entusiasmo.
É inevitável apontar a ironia: o cúmplice de Lars von Trier que ajudou a “inventar” o Dogma 95 com A Festa aparece agora a assinar um grande filme europeu de prestígio inspirado num caso verídico (exactamente o tipo de coisa contra o qual o Dogma se erguia…).
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É inevitável apontar a ironia: o cúmplice de Lars von Trier que ajudou a “inventar” o Dogma 95 com A Festa aparece agora a assinar um grande filme europeu de prestígio inspirado num caso verídico (exactamente o tipo de coisa contra o qual o Dogma se erguia…).
Visto Kursk, percebem-se duas coisas: a primeira é que, se quisermos olhar para Thomas Vinterberg como um “autor”, reconhecemos nesta reconstituição da tragédia do submarino russo de 2000 marcas autorais, com os seus temas habituais da relação entre o indivíduo e a comunidade, e as zonas de fricção que isso acaba por criar. A segunda é que, se quisermos ver Vinterberg apenas como um “funcionário” incumbido de levar a bom porto um projecto que teve uma gestação longa, reconhecemos em Kursk uma competência eficaz que se coloca ao serviço do argumento o melhor que sabe, mas que parece cumprir os “mínimos olímpicos” do profissionalismo desembaraçado. O argumento de Robert Rodat (O Resgate do Soldado Ryan), aliás, também não pede mais do que isso: sublinha a culpabilidade das autoridades russas, orgulhosas e doutrinárias, na recusa da ajuda que lhes era oferecida, opondo-a à camaradagem dos marinheiros, profissionais unidos na sobrevivência e na convicção de que a mãe Rússia os salvaria.
Mas se o lado da arraia miúda traída pelas altas instâncias numa situação-limite é “Vinterbergiano”, Kursk é um filme razoavelmente impessoal: eficazmente gerido, interpretado, reconstituído, apresentado, mas com qualquer coisa de mecânico e anónimo, que as memórias de A Festa ou de A Caça invocadas pelos primeiros 15 minutos não conseguem dissipar. Kursk está longe de ser mau, mas fica-se pelo meio-termo do filme que se vê sem maçar nem entusiasmar; Thomas Vinterberg continua a ser um cineasta competente que só a espaços é genuinamente inspirado.