Faz compras online? Conheça as novas regras de protecção do consumidor
Consumidores estarão mais protegidos na compra de bens físicos e digitais. Regras incluem produtos e serviços em troca de partilha de dados pessoais
O Parlamento Europeu aprovou esta terça-feira em plenário a adopção de duas novas directivas comunitárias que reforçam os direitos dos consumidores na compra de todo o tipo de bens em lojas físicas ou online, bem como na aquisição e subscrição de conteúdos e serviços digitais através da internet. A harmonização da legislação aplicável nos 28 Estados-membros visa não só reforçar a confiança dos consumidores no mercado único digital, mas também facilitar a vida às empresas que queiram vender os seus produtos fora das fronteiras nacionais, minimizando custos de adaptação a diferentes regimes legais.
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O Parlamento Europeu aprovou esta terça-feira em plenário a adopção de duas novas directivas comunitárias que reforçam os direitos dos consumidores na compra de todo o tipo de bens em lojas físicas ou online, bem como na aquisição e subscrição de conteúdos e serviços digitais através da internet. A harmonização da legislação aplicável nos 28 Estados-membros visa não só reforçar a confiança dos consumidores no mercado único digital, mas também facilitar a vida às empresas que queiram vender os seus produtos fora das fronteiras nacionais, minimizando custos de adaptação a diferentes regimes legais.
A que tipo de produtos e serviços se aplicam as novas regras?
As duas directivas abrangem os contratos de compra e venda de todo o tipo de bens, físicos e digitais, que sejam adquiridos presencialmente numa loja ou através da internet.
Mas o que é que muda efectivamente?
A grande novidade é passar a haver um enquadramento legal específico e harmonizado, a nível europeu, para a compra e venda de conteúdos digitais (como um vídeo em streaming ou uma aplicação móvel, por exemplo) e de serviços (como o armazenamento em nuvem ou a partilha de dados numa rede social).
Quanto aos bens que são comercializados com serviços e conteúdos digitais já incorporados (como um frigorífico ou uma televisão inteligente) caem sob a alçada da nova directiva de compra e venda de bens, online ou offline, que se aplica a qualquer contrato entre empresas e consumidores, e que vem substituir o enquadramento comunitário que remonta a 1999.
Ou seja, pretende-se garantir, desta forma, que o consumidor tem o mesmo nível de protecção quer compre um CD numa loja ou descarregue uma música através da internet, em qualquer país da União Europeia.
Só estão incluídos produtos e serviços pagos em dinheiro?
Não. A nova directiva abrange explicitamente não apenas os conteúdos e serviços digitais a que se tem acesso contra um pagamento em dinheiro, mas também aqueles que se baseiam no fornecimento de dados pessoais, através de um registo ou subscrição. Isto não se aplica se os dados pessoais só forem solicitados para efeitos de prestação do serviço e não forem usados para outro fim. Aqui, a ideia é permitir que haja uma concorrência leal entre empresas com diferentes modelos de negócio, não obstante terem de ser asseguradas todas as garantias relativas à protecção de dados pessoais.
O que determina se um produto ou serviço é ou não defeituoso?
As directivas estabelecem uma combinação de critérios para avaliar a conformidade dos bens e serviços e, portanto, se existe um defeito que pode ser alvo de reclamação. Desde logo, há que ter em conta o que está estipulado no contrato (critérios subjectivos), no que respeita a questões como qualidade, funcionalidade, compatibilidade e interoperabilidade.
No entanto, quer para produtos físicos, quer para conteúdos e serviços digitais, são ainda previstos critérios objectivos, que têm em conta a expectativa razoável dos consumidores quanto à qualidade e desempenho do produto ou serviço face a outros do mesmo tipo.
Além disso, se a integração (de um software no computador, por exemplo) ou a instalação (de um bem físico, como um móvel) for assegurada pelo vendedor ou, mesmo sendo realizada pelo consumidor, se basear em instruções deficientes, isto também é considerado uma falha de conformidade.
No caso de conteúdos e serviços digitais, o vendedor está ainda obrigado a fornecer actualizações, nomeadamente de segurança, durante um tempo razoável. Já se for um serviço digital prestado em continuidade, esta obrigação mantém-se durante todo o período do contrato. Mas se houver problemas, a responsabilidade recai sobre o consumidor se este não as for instalando em tempo útil.
O vendedor pode ser responsabilizado por um produto defeituoso?
Sim. O vendedor pode ser responsabilizado, desde logo, por qualquer falha de fornecimento (no caso de um produto ou serviço digital) ou por um defeito no produto no momento de entrega.
Os Estados-membros podem, aliás, continuar a contemplar, na legislação nacional, a possibilidade de rescisão e reembolso imediatos nestes casos. Bruxelas determina apenas que esta opção só possa vigorar por um prazo máximo de 30 dias.
Para os bens físicos, impõe-se ainda uma garantia mínima de dois anos em todo o espaço comunitário e os Estados-membros podem até dar prazos mais extensos. A Suécia, por exemplo, já exige hoje uma garantia de três anos e, na Finlândia e nos Países Baixos, as garantias têm por base a vida útil esperada dos produtos.
Neste âmbito, a nova directiva comunitária estipula também que se a empresa oferecer uma garantia de durabilidade no acto de venda, fica responsável pela reparação ou substituição do produto até ao fim desse período.
E como funciona o prazo de garantia para serviços digitais?
Para os conteúdos e serviços digitais, não foram harmonizados prazos a nível europeu para defeitos que se descubram após algum tempo. Mas, caso os Estados-membros optem por introduzir limites temporais na legislação nacional, Bruxelas exige que este prazo não seja inferior a dois anos. Já se for um serviço subscrito por um determinado período, por exemplo, esta garantia existe enquanto o contrato durar.
Como posso provar que o produto já estava defeituoso quando o recebi?Não terá de o fazer se o defeito for detectado no prazo de um ano, quer se trate de bens físicos ou digitais. Ou seja, durante este período, pressupõe-se que o defeito já existia no momento de compra e é o vendedor que tem de demonstrar o contrário. Os Estados-membros, se assim o entenderem, podem estender este prazo até dois anos. Isto é já o que já acontece em Portugal e França e foi assegurado que, apesar da harmonização europeia, continuará a ser assim.
Se for um serviço ou conteúdo digital prestado em continuidade, a inversão do ónus da prova mantém-se durante a duração do contrato. Mas já não é a mesma coisa se se tratar, por exemplo, de um bem físico, com uma componente digital incluída (como o tal frigorífico inteligente): nestes casos, passado dois anos, é o consumidor que terá de passar a fazer prova de que o defeito já existia.
Apesar de não ser vinculativo, a directiva permite aos países prever, a nível nacional, uma exigência de notificação aos consumidores. Ou seja, terão de informar a empresa no prazo máximo de dois meses após a descoberta do defeito para poderem usufruir destes direitos. Actualmente, há 14 Estados-membros que já impõem esta exigência.
Se o produto for defeituoso, posso rescindir imediatamente o contrato?
Só no caso de defeitos graves. Isto porque as duas directivas estabelecem uma hierarquia na aplicação de compensações e a primeira opção é sempre a reposição da conformidade (no caso de produtos ou serviços digitais) ou a reparação e substituição (no caso de bens físicos). Ou seja, os consumidores têm de dar uma segunda oportunidade ao vendedor de resolver o problema, ainda que este tenha de o fazer num tempo aceitável e sem custos adicionais.
Só após este passo, e no caso de o vendedor se recusar ou não for bem-sucedido, é que o consumidor pode avançar para as opções seguintes: solicitar uma redução do preço ou rescindir o contrato. A rescisão não é possível no caso de defeitos menores, mas está do lado do vendedor provar que é assim. Quanto ao desconto, terá de ser proporcional, ou seja, corresponder à perda de valor que resulta do defeito encontrado.
A directiva de venda de compra e venda bens contempla ainda a possibilidade de suspensão do pagamento por parte do consumidor até o vendedor cumprir as suas obrigações legais, mas serão os Estados-membros a definir a forma e as condições para o exercício deste direito.
Se rescindir o contrato, devolvem-me o dinheiro na totalidade?
Sim. Com a rescisão do contrato, o vendedor terá de reembolsar o consumidor na totalidade e este reembolso terá de ser feito em menos de 14 dias. O valor devolvido só é proporcional quando se trata de conteúdos ou serviços digitais assegurados por um dado período. Neste caso, é reembolsável a quantia correspondente ao período em que este não esteve a ser fornecido correctamente.
Tenho direito a recuperar os conteúdos fornecidos ou criados por mim?Sim. Se o consumidor o solicitar, o operador de uma rede social, por exemplo, está obrigado a disponibilizar os conteúdos fornecidos ou criados pelos utilizadores, mesmo após a cessação do serviço. Tem direito a recuperar estes conteúdos de forma gratuita, num prazo razoável e num formato comummente utilizado.
E posso solicitar uma indemnização?
Só ao abrigo de legislação nacional. O direito a exigir indemnizações, nomeadamente por danos causados no ambiente digital do consumidor (por uma falha de actualização de segurança, por exemplo), será regulado a nível nacional por cada Estado-membro.
Estas regras serão iguais em todos os países da União Europeia?
Sim, as regras são vinculativas e transversais a todo o espaço comunitário. Para assegurar um nível pleno de harmonização no mercado único, os Estados-membros não podem manter ou introduzir regras diferentes, a nível nacional, mesmo tendo em vista um maior grau de protecção dos consumidores. No entanto, para não prejudicar os consumidores daqueles países – como Portugal – que já tinham em vigor disposições mais favoráveis do que as regras comunitárias, foram permitidas excepções, mas estão explicitadas na directiva.
Quando entram em vigor as novas regras?
Após a publicação no Jornal Oficial da União Europeia das duas directivas, os Estados-membros terão dois anos para transpor as novas disposições para o ordenamento jurídico interno.
Há muitas pessoas na União Europeia a comprar online? Quem compra mais?
Cerca de 60% dos europeus admitem ter realizado, pelo menos, uma compra online nos últimos 12 meses, segundo as mais recentes estatísticas do Eurostat. Isto representa um crescimento de 19% no comércio electrónico desde 2008. Entre os europeus que mais utilizam a internet para adquirir bens e serviços, estão os cidadãos da Dinamarca, Suécia e Países Baixos. Noutros países, como a Roménia ou a Bulgária, menos de um quarto dos residentes recorre à internet para fazer compras.
E em Portugal? O que é que se compra mais online?
Apesar de o comércio electrónico em Portugal ter aumentado substancialmente na última década – cresceu 22% desde 2010 –, os portugueses continuam a estar muito aquém da média europeia: apenas 37% usou a internet para fazer compras no último ano.
À semelhança do que acontece noutros países europeus, o que os portugueses mais compram online são roupas e equipamentos desportivos. A internet é também muito usada para reservar viagens e alojamentos, adquirir artigos para a casa e comprar bilhetes para espectáculos ou eventos culturais e desportivos.
No entanto, segundo os dados apresentados pela Comissão na apresentação das duas propostas de directiva, apenas 12% dos portugueses encomendavam produtos online de outros países europeus. E quanto às empresas portuguesas, ainda que 35% já vendessem os seus produtos na internet, somente 14% o fazia fora do mercado nacional.
Qual o impacto esperado no mercado único com a aprovação das duas directivas?
A harmonização legal agora aprovada pretende encorajar o comércio electrónico em todo o espaço comunitário, onde residem 70 milhões de consumidores. Espera-se também que, num clima de maior concorrência, os preços desçam e o consumo suba. Segundo as contas da Comissão, o crescimento da actividade económica resultante de um reforço da confiança dos compradores e da eliminação de barreiras jurídicas aos vendedores poderá contribuir para um aumento do PIB europeu de 4 mil milhões de euros. O impacto no PIB nacional foi estimado em 52 milhões.