Pelo planeta que somos nós
Agora que milhares de estudantes, provavelmente a maioria oriundos de escolas do ensino básico e secundário, saem à rua em manifestação e greve estudantil pela defesa do Planeta, talvez os mais velhos comecem a acreditar que a mudança de hábitos é possível.
“Nós mesmos sentimos que o que fazemos é uma gota no oceano. Mas o oceano seria menor se essa gota faltasse.” (Madre Tereza)
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“Nós mesmos sentimos que o que fazemos é uma gota no oceano. Mas o oceano seria menor se essa gota faltasse.” (Madre Tereza)
À medida que assistimos, em pleno século XXI, a catástrofes na Natureza e no Ambiente e a acidentes em infraestruturas e instalações industriais, temos a sensação de que, apesar dos avanços científicos, tecnológicos e do conhecimento em geral, o nosso planeta parece cada vez mais frágil ou um lugar pouco seguro.
Situações catastróficas e dantescas sempre ocorreram e algumas delas até passaram a constituir marcos históricos, mas o que convém realçar é que a Humanidade parece impotente para contrariar os efeitos nefastos causados por essas situações, e até assume que a culpa é sua ao ter consciência que interfere diretamente nas leis da Natureza. (Nota: natureza na língua grega diz-se “fýsi”, no grego antigo “physis”, o que constitui o étimo de “física”).
Existem situações e acidentes com escala diferente. Para lá das diferenças na escala dos danos provocados, importa estudar e considerar todas elas. Afinal, de muitas gotas se faz um oceano... Um furacão ou um ciclone, uma rotura de uma barragem, um terramoto, um tsunami, associados ou não a grandes inundações, são situações responsáveis por centenas ou milhares de mortos, e por um número muito maior de desalojados. Por outro lado, cada acidente numa mina ou numa pedreira, numa fábrica ou armazém, ou no simples manuseamento de produtos perigosos para a saúde, provoca um número menor de vítimas, mas somados todos esses acidentes chegamos igualmente a números impressionantes.
A defesa do nosso Planeta merece e exige a contribuição de todos. Agora que milhares de estudantes, provavelmente a maioria oriundos de escolas do ensino básico e secundário, saem à rua em manifestação e greve estudantil pela defesa do Planeta (Greve pelo clima: “É uma das manifestações mais bonitas que já vi”), talvez os mais velhos comecem a acreditar que a mudança de hábitos é possível.
Ética, Ciência, Filosofia, Espiritualidade(s), Humanidade(s)... são essências e também ferramentas para cuidarmos da nossa grande sala de estar comum, o Planeta Terra. Existem muitas questões para as quais deveríamos ter respostas e, se não as tivermos, deveríamos ao menos ter consciência dessa nossa incapacidade.
A pensar sobretudo nos estudantes, mas também nos seus mestres, coloco aqui apenas uma questão: será que é possível à Humanidade viver num planeta no qual se erradicaram de vez importantes indústrias extrativas tradicionais? Não há exploração de petróleo, nem de gás natural, nem de gás de xisto. Não se extraem minérios, nem rochas. Não se eliminam florestas.
Talvez, para claro entendimento, seja bom ter presente uma definição do que se designa por “indústrias extrativas”, pois as atividades relacionadas com a agricultura, bem como com a pesca, não entram habitualmente na definição. Tradicionalmente consideram-se indústrias extrativas todos os processos que implicam a extração de matérias-primas do solo ou subsolo do nosso planeta (incluindo os fundos marinhos) para satisfazer a procura em grande escala dos consumidores, ou seja, do mercado. A variedade de indústrias extrativas é significativa. Extração de minérios para obtenção de metais, extração de materiais pétreos e de agregados geológicos para utilização por outras indústrias, nomeadamente de produtos não-metálicos, como por exemplo: indústrias de produtos químicos, cimenteiras, e outras visando o fabrico de materiais para a construção, etc.
Só o conhecimento científico e tecnológico no domínio dos processos extrativos, logística, poupança energética, segurança e prevenção de riscos na indústria permite evidenciar e chamar a atenção da sociedade em geral e das entidades políticas em particular para a necessidade de alterar hábitos e mobilizar vontades.
Portugal é um país com tradição nas indústrias extrativas. Temos minas, temos pedreiras. Como qualquer outro país enfrentamos o futuro em concorrência aberta. Quais vão ser as metas, os desígnios, as ações? Dou um exemplo que conheço mais em pormenor. A indústria portuguesa de rochas ornamentais e dimensionais envolve centenas de empresas, algumas delas detentoras hoje em dia de boa ou muito boa tecnologia, design e mercados externos; são das melhores do mundo neste sector.
Em 2012, Portugal organizou um congresso mundial do sector. Este evento, com a designação de Global Stone Congress, já passou pelo Brasil em 2005 (Guarapari), Itália em 2008 (Carrara), Espanha em 2010 (Alicante) e Turquia em 2014 (Antalya), tendo voltado a ter expressão no Brasil em 2018 (na Bahia). Estes congressos tiveram, desde o seu início, uma perspetiva global, e visam constituir um fórum mundial de discussão do setor da Pedra Natural, abordando diversas temáticas, dando ênfase aos avanços científicos e tecnológicos de interesse para a indústria. O evento de 2012 decorreu no Alentejo, tendo Borba como base, e não temos dúvidas em afirmar que a organização portuguesa foi a melhor de todas até hoje. No entanto, atualmente o sector tem alguns paradoxos a contornar, nomeadamente a segurança das pedreiras. Os acidentes não podem ser atribuídos, como ouvi ainda há dias alguém dizer, ao risco inerente à profissão ou atividade.
Acresce que, de acordo com os normativos já existentes, este importante sector económico tem pela frente o desafio de também ele poder contribuir para a sustentabilidade. Constituindo um cluster industrial importante em Portugal, envolvendo várias vertentes (extração, transformação, aplicação, conceção e fabrico de equipamentos e ferramentas, design e arquitetura, etc.), o cluster dos recursos pétreos e minerais tem hoje à sua disposição as tecnologias e os equipamentos mais sofisticados. As parcerias com os institutos e centros de investigação são formas para motivar todos os protagonistas envolvidos, difundindo e aplicando o saber. Por exemplo, para garantir a estabilidade dos taludes de uma mina ou pedreira já se podem usar modelos numéricos 3D, cujos resultados ou previsões se podem comparar com os obtidos com modelos físicos.
Para terminar, estou certo que as indústrias extrativas vão caminhar no bom sentido, pois os profissionais que nelas trabalham são os primeiros a ter consciência do seu papel e da necessidade de encontrar alternativas. Reduzir, reutilizar, reciclar são verbos bem conhecidos por quem está há muito tempo no sector. Afinal, uma resposta global só é viável através de um contributo de todas as gotas do oceano.
O autor escreve segundo o novo Acordo Ortográfico