Há um mandado de detenção europeu por uma infracção que não é punível em Portugal? Já não poderá ser executado
Na lei actual, a recusa de execução de um mandado europeu referente a uma infracção que não seja punível em Portugal era meramente facultativa. Com a nova proposta de lei, passa a ser obrigatória
O Governo apresentou à Assembleia da República uma proposta de lei “com pedido de prioridade e urgência” que vai acabar com uma ambiguidade na actual legislação nacional sobre os mandados de detenção europeus. O regime em vigor não é taxativo quanto à obrigatoriedade de não cumprir o mandado de detenção, caso este incida sobre uma infracção que não é punível em Portugal. Com a actual proposta de lei, essa situação passa a constar claramente dos motivos para a recusa do mandado.
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O Governo apresentou à Assembleia da República uma proposta de lei “com pedido de prioridade e urgência” que vai acabar com uma ambiguidade na actual legislação nacional sobre os mandados de detenção europeus. O regime em vigor não é taxativo quanto à obrigatoriedade de não cumprir o mandado de detenção, caso este incida sobre uma infracção que não é punível em Portugal. Com a actual proposta de lei, essa situação passa a constar claramente dos motivos para a recusa do mandado.
Na exposição dos motivos para a apresentação da proposta de lei explica-se que ela pretende “adequar o regime jurídico do mandado de detenção europeu ao regime de decisão europeia de investigação, harmonizando-se a execução do mandado de detenção europeu com a execução de uma decisão europeia de investigação que inclua a audição da pessoa procurada ou a sua transferência temporária.” Ao mesmo tempo, acrescenta-se, “aproveita-se para corrigir uma deficiência há muito reconhecida na lei”, a incongruência entre dois dos seus artigos.
É que a lei em vigor, de 2003, refere, num dos artigos, que “só é admissível a entrega da pessoa reclamada se os factos que justificam a emissão do mandado de detenção europeu constituírem infracção punível pela lei portuguesa”; enquanto num outro artigo se afirma que o mandado “pode ser recusado”, e apenas isso, se “o facto que motiva a emissão do mandado de detenção europeu não constituir infracção punível de acordo com a lei portuguesa”. Ou seja, na versão actual “a não execução do mandado é meramente facultativa e não obrigatória”, refere-se nas motivações para a apresentação da proposta de lei.
“A contradição entre as duas normas é inegável”, afirma-se no texto que acompanha a proposta de lei, especificando-se que, com o novo documento, “passa a dispor-se inequivocamente que a não verificação da dupla incriminação, nos casos em que a mesma seja condição de admissibilidade da entrega da pessoa procurada, constitui um motivo de não execução obrigatória do mandado de detenção europeu em causa.”
A clarificação é conseguida com uma nova redacção que especifica: “A execução do mandado de detenção europeu é recusado quando o facto que [o] motiva […] não constituir infracção punível de acordo com a lei portuguesa (…)”.
O documento é acompanhado por pareceres favoráveis do Conselho Superior de Magistratura e da Procuradoria-Geral da República. No primeiro caso, refere-se que a nova redacção deste ponto clarifica “o que já resultava do controlo da dupla incriminação”.