Tem mais de 55 anos e nada para fazer? Há quem precise de si

A 55+ é uma organização que pede a pessoas com mais de 55 anos que se encontrem em situação de inactividade, desemprego ou reforma, que partilhem os seus conhecimentos e valências.

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Afinam-se as violas, tocam-se os primeiros acordes, e eis que se ouve uma primeira melodia ecoar pelos corredores da Casa do Impacto, no Convento de São Pedro de Alcântara, em Lisboa. Esta aula de música é dada pelo experiente José Sacramento, músico profissional actualmente inactivo porque a empresa de edição de músicas onde trabalhava faliu, que se empenha em ensinar os meandros da teoria musical à jovem Marta Pereira, enquanto esta vai praticando no instrumento. 

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Afinam-se as violas, tocam-se os primeiros acordes, e eis que se ouve uma primeira melodia ecoar pelos corredores da Casa do Impacto, no Convento de São Pedro de Alcântara, em Lisboa. Esta aula de música é dada pelo experiente José Sacramento, músico profissional actualmente inactivo porque a empresa de edição de músicas onde trabalhava faliu, que se empenha em ensinar os meandros da teoria musical à jovem Marta Pereira, enquanto esta vai praticando no instrumento. 

José, na casa dos 60 anos, e Marta, a contar 29 primaveras, são o exemplo das relações intergeracionais que o projecto 55+ pretende promover, ajudando a combater a solidão e a inactividade com que muitos dos mais velhos se debatem, ao mesmo tempo que oferece serviços de qualidade e utilidade para o dia-a-dia a pessoas da comunidade com vidas mais agitadas e ocupadas. 

“Quem oferece, garante uma vida mais saudável, activa e integrada na comunidade, contando com um rendimento extra para si. Quem procura, encontra o apoio de verdadeiros especialistas com anos de experiência em diversas áreas para as tarefas do dia-a-dia, para além de contribuir para uma causa tão nobre e necessária para a sociedade”, lê-se no site da organização.

“Existem actualmente 2,5 milhões de pessoas inactivas com mais de 55 anos em Portugal, o que representa 35% da população”, alerta Elena Durán, a fundadora e responsável pela organização social 55+. Se para muitos a idade pode representar um impedimento para uma vida mais activa e saudável, “para o projecto 55+ é uma excelente oportunidade para se fazer algo de que se gosta e que possa ser útil para toda a comunidade”.

Elena é natural de Andaluzia mas quando veio para Lisboa, em 2009, sentiu que finalmente tinha encontrado o seu recanto. “Vinha estagiar três meses, mas logo nas primeiras semanas a passear sozinha pelos miradouros, senti que este era mesmo o sítio onde gostava de viver”. 

Na capital viu o palco ideal para finalmente estrear uma ideia que contava já com uma década e, assim, despediu-se do antigo emprego e avançou. 

“O que despertou a primeira ideia foi o facto de o meu pai se ter reformado aos 60 anos, há 10 anos. Ele, que sempre foi uma pessoa socialmente muito activa, dinâmica e apaixonada pelo que fazia – era director de uma escola pública em Andaluzia – ia ficar, repentinamente, numa situação de inactividade”.

Isso deixou Elena e o irmão preocupados. Então, “em segredo para não preocupar o pai”, começaram a pensar em alternativas para que este “continuasse socialmente envolvido e evitasse problemas de saúde físicos ou mentais”. E questionaram-se porque é que depois de ter “uma vida super activa e quando ainda falta imensa vida pela frente, não há opções, oportunidades para as pessoas?”.

“Faltam soluções para uma população que é cada vez maior. Fala-se do envelhecimento da população e do problema do isolamento - que, aliás, está ligado a esta problemática da paragem profissional -, mas não são apresentadas soluções diferentes para uma faixa etária que é também ela diferente”, adverte. 

Deste modo, foram criados sete serviços prestados por estes diversos especialistas com mais de 55 anos. Por agora, pode contar-se com apoio familiar a seniores e a crianças, serviço de jardinagem, aulas de música, pet sitting, pequenas reparações, e até ter um chef em casa. Mas a equipa não quer ficar por aqui. “O objectivo é alargar os serviços para mais áreas, até porque estamos a constatar que faz todo o sentido” face à diversidade de experiências que os inscritos possuem. “No entanto, precisamos de estar organizados e preparados para expandir”, assume a fundadora, não escondendo o entusiasmo.

Os serviços variam, podem ser ocasionais ou permanentes, e cada um tem um valor estabelecido por hora. Dar um passeio com um animal de estimação custará ao dono cinco euros e meio; o acompanhamento de crianças entre os seis meses e os 13 anos tem o valor de seis euros e meio; a preparação de refeições ao domicílio, assim como a manutenção e conservação de um jardim, têm um preço de oito euros; as pequenas reparações domésticas, como trabalhos de bricolagem e de pintura, já vai para os 10,5 euros por hora; por 12 euros, pode contar-se com apoio e acompanhamento familiar a seniores, seja ao domicílio ou em deslocações necessárias; e as aulas particulares de música, sejam em casa do professor ou ao domicílio, têm um custo de 18 euros. Ao cliente final, será sempre cobrada uma taxa máxima de 20% que contribui para a sustentabilidade do projecto.

O serviço mais requisitado até agora é o de confecção de refeições ao domicílio. “Temos tido imensos pedidos de pratos vegan e os 55+ adoram pois é também como uma superação para eles, visto já conhecerem e dominarem perfeitamente a comida tradicional portuguesa”. Vera é das mais entusiastas, começou logo a fazer pesquisa de receitas. “Agora também sou vegan”, dizia, empolgada com o desafio, conta Elena. 

“Mesmo que seja a um outro ritmo, pois não querem um ritmo de compromisso com 40 horas semanais, o objectivo é fazer um serviço aqui, conhecer pessoas acolá, enquanto fazem algo de que gostam e que os preencha”, adianta.

Neste momento, são já 250 pessoas acima dos 55 anos a integrar este projecto. E surgem vozes, desde o “Porto, Aveiro, Coimbra, Alentejo, Algarve e até Ponta Delgada, com vontade que cheguemos a outras zonas do país”.

Até se equaciona a expansão para além-fronteiras. “Acho que este projecto é muito valioso e necessário em Espanha e em muitos países europeus que também tenham esta falta de soluções para uma população cada vez mais numerosa. A ambição vai nesse sentido, no de colocar a plataforma em qualquer sítio que seja necessário. Mas uma coisa de cada vez”, visto ser necessário financiamento para levar a organização a outros palcos. 

Para arrancarem com o projecto que já está no terreno contaram, no início com o apoio da Aga Khan – fundação que trabalha em projectos de investigação-acção em contexto urbano – que apoia o desenvolvimento comunitário e “ajudou a nível de parceria, contactos, informação técnica e demais”. 

Posteriormente candidataram-se ao concurso da Santa Casa da Misericórdia, no âmbito do programa PAES (Programa de Apoio a Empreendedores Sociais). “De cento e tais programas candidatos, ficaram dez para um programa de aceleração, e dos dez, três ficaram finalistas e tiveram então acesso à Casa do Impacto”.

O financiamento necessário para implementarem o projecto veio também da Câmara Municipal de Lisboa, no valor de 50 mil euros, através do programa Energia BIP/ZIP (Bairros e Zonas de Intervenção Prioritária de Lisboa). 

No site está disponibilizada toda a informação acerca do projecto e é a partir de lá que tanto os interessados em prestar serviços, como os curiosos pela sua aquisição se podem inscrever. Para as pessoas que não tenham acesso à plataforma digital podem dirigir-se directamente ao nº 8 da Travessa de São Pedro, no Bairro Alto, ou contactar o 930556575.

Texto editado por Ana Fernandes