Se é para falar de milagres, não se deve ter medo da palavra: os milagrosos Tawnies merecem todos os nossos cuidados

Comprei onze Tawnies mais ou menos ao calhas. Provei-os bebendo-os em pares, dois de cada vez, ao longo de uma hora, a várias temperaturas. A primeira conclusão incrível é que são todos muito bons. Não havia um único que fosse simplesmente bom.

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Rui Farinha/NFactos

Continuo com os meus conselhos para os principiantes no vinho do Porto - que é quase toda a gente que desconhece os Tawnies de 20 anos e os Vintages pelos quais se esperou as décadas necessárias.

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Continuo com os meus conselhos para os principiantes no vinho do Porto - que é quase toda a gente que desconhece os Tawnies de 20 anos e os Vintages pelos quais se esperou as décadas necessárias.

Um primeiro conselho parece óbvio mas não é: compre os seus Tawnies a uma loja que mantenha os vinhos do Porto em condições ideais de escuridão e baixa temperatura. Para garantir uma temperatura baixa e estável é necessário ar condicionado.

Perguntei a um perito amigo e ele recomendou-me uma única loja: a garrafeira Dom Pepe, no Porto e online. Encomendei 10 Tawnies de 20 anos e no dia seguinte já cá estavam: são rapidíssimos. As garrafas estavam nas melhores condições e os engarrafamentos eram os mais recentes. Em pelo menos dois casos mostraram-me que eu no passado tinha bebido Tawnies das mesmas casas mas deteriorados, prejudicados por má conservação.

Os tawnies de 20 anos aguentam-se umas três semanas no frigorífico mas depois começam a estragar-se lentamente, ficando medicinais e oxidados. É uma pena isto acontecer. A tragédia reinante, porém, é ter garrafas de Tawny velho abertas há meses e guardadas como se fossem garrafas de whisky, à temperatura ambiente.

Os cálices com que se bebe vinho do Porto são pequenos e apertados de mais - mais vale bebê-los num copo Glencairn para whisky ou num copo para Porto ou Jerez da Riedel. Os copos da Schottt Zwiesel desenhados por Siza Vieira para vinho do Porto são mais pequenos mas são bonitos e prestáveis. Têm a vantagem de ser baratos: um par de copos custa à volta de 5 euros.

A temperatura a que se bebe é essencial. Os Tawnies de 20 anos querem-se frescos, saídos do frigorífico e servidos em pequena quantidade. A nossa língua e a nossa boca aquecem o vinho, permitindo-nos saboreá-lo a várias temperaturas.

Também gosto de esperar cinco minutos. O Tawny também abre em contacto com o oxigénio. Acabados de servir de uma garrafa acabada de abrir até os melhores Tawnies têm um sabor medicinal. A acidez também precisa de uns minutos para se afirmar.

Os Tawnies de 20 anos são criações supremas. Desta vez os chavões são mesmo verdade: há muita arte e muita sabedoria e há, também, uma grande quantidade de vinhos diferentes, de idades diferentes, com que brincar. Para fazer-se Tawnies destes é preciso ser-se muito sábio, muito competente e ser muito rico em vinhos do Porto.

Não podiam ser baratos, mas comparados com os Tawnies de 30 e 40 anos até são. A minha regra é simples: pago 2 euros por cada ano de envelhecimento. Assim, por um Tawny de 20 anos espero pagar à volta de 40 euros.

Já um Tawny de 30 anos custa muito mais do que 60 anos e um Tawny de 10 anos custa mais de 20 - é por isso que os de 20 anos valem mesmo a pena. Têm todas as qualidades de um Tawny de 10 anos - frescura, acidez, leveza - porque contêm Tawnies dessa idade e menos.

Mas são muito mais moreish (quer-se sempre mais um bocadinho), mais redondos, mais ricos, “amoscatelados, profundos, com mais sabores e mais prolongamentos. Comprei onze Tawnies mais ou menos ao calhas: os dez que tinha a Dom Pepe e outro comprado aqui em Lisboa, o Quinta do Vallado.

Provei-os bebendo-os em pares, dois de cada vez, ao longo de uma hora, a várias temperaturas. A primeira conclusão incrível é que são todos muito bons. Não havia um único que fosse simplesmente bom. Também se há-de ver que em provas profissionais é muito raro um Tawny de 20 anos proveniente de uma casa prestigiada ter uma pontuação abaixo dos 80%/16 valores.

O Taylor's, o Ferreira, o Fonseca e o Andresen pareciam mais velhos, mais profundos, mais longos, mais digestivos sem abdicar da acidez e frescura como contrapontos. Os mais leves e frescos, mas sem abdicar de nenhuma das virtudes da velhice, foram o Niepoort e o Sandeman, ambos com uma acidez maravilhosa.

Tanto o VZ como o Quinta do Vallado conseguiram evocar Moscatéis de Setúbal de 30 anos ou mais, não me perguntem como. Têm laranja amarga, marmalade de laranja e todas as qualidades de um Tawny velho.

O Graham's, que tinha sido recomendado pelo perito meu amigo, estava também afinadíssimo. Consegue reunir todas as qualidades de um Tawny velho e de um Tawny novo, sem sacrifícios.

O Dow's, sendo delicioso e complexo, foi o único que não me encheu as medidas, que não me pareceu impossível de explicar e conseguir. É obra.