Suspeito de assassinar Marielle foi detido, agora falta encontrar “os mandantes”

Dois antigos agentes da Polícia Militar brasileira com ligações ao crime organizado foram detidos esta terça-feira, quase um ano depois da morte da vereadora do Rio de Janeiro. Família e colegas dizem que o crime não foi cometido "por razões pessoais".

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Três meses antes do assassínio de Marielle Franco, em Março de 2018, no Rio de Janeiro, um sargento da Polícia Militar na reforma com ligações ao crime organizado começou a seguir a agenda pública da vereadora brasileira através da Internet, no seu telemóvel. Mais de um ano depois, na madrugada desta terça-feira, foi detido na sua casa e acusado pelo Ministério Público de ter sido ele a disparar contra Marielle Franco no atentado que também matou o motorista da vereadora, Anderson Gomes.

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Três meses antes do assassínio de Marielle Franco, em Março de 2018, no Rio de Janeiro, um sargento da Polícia Militar na reforma com ligações ao crime organizado começou a seguir a agenda pública da vereadora brasileira através da Internet, no seu telemóvel. Mais de um ano depois, na madrugada desta terça-feira, foi detido na sua casa e acusado pelo Ministério Público de ter sido ele a disparar contra Marielle Franco no atentado que também matou o motorista da vereadora, Anderson Gomes.

Para além do sargento na reforma Ronnie Lessa, de 48 anos, o grupo de combate ao crime organizado no Rio de Janeiro deteve Elcio de Queiroz, de 46 anos, também ele um antigo agente da Polícia Militar, acusado de ser o condutor do automóvel que perseguiu o carro onde seguiam Marielle Franco, Anderson Gomes e Fernanda Chaves – a assessora da vereadora, que sobreviveu ao atentado de 14 de Março de 2018.

Ainda é cedo para se saber que razões específicas estão por trás do assassínio, e se se confirma que Lessa e Queiroz agiram como assassinos contratados. Mas sabe-se que Marielle Franco era umas das vozes mais críticas das matanças nas favelas do Rio de Janeiro e que denunciou as relações de antigos e actuais polícias com o crime organizado, uma ligação que povoou a cidade brasileira com gangues violentos de extorsão e homicídios a soldo.

É isso que se lê no despacho de acusação do Ministério Público do Rio de Janeiro contra Ronnie Lessa e Elcio de Queiroz: “É inconteste que Marielle Francisco da Silva foi sumariamente executada em razão da actuação política na defesa das causas que defendia. A barbárie praticada na noite de 14 de Março de 2018 foi um golpe ao Estado Democrático de Direito.”

Os dois suspeitos ficaram presos, e o Ministério Público pediu também que o sargento reformado deixe de receber a sua pensão e fique sem a autorização de porte de arma. Para além disso, há ainda um pedido de indemnização à família das vítimas, por danos morais, e de pagamento de uma pensão ao filho de Anderson Gomes até aos 24 anos de idade.

A imprensa brasileira nota que Ronnie Lessa mora no condomínio onde também vive o Presidente do Brasil, Jair Bolsonaro, mas não avança qualquer outra ligação entre os dois.

A referência pode dever-se ao facto de o filho mais velho do Presidente, Flávio Bolsonaro, ser amigo de Adriano da Nóbrega, líder de uma milícia de extorsão e assassínios no Rio de Janeiro suspeita de envolvimento na morte de Marielle Franco, e de ter empregado no seu gabinete, durante anos, a mãe e a mulher de Nóbrega.

E o jornal Folha de S. Paulo publica esta terça-feira uma fotografia, retirada do Facebook, em que um dos acusados, Elcio Queiroz, surge ao lado de Jair Bolsonaro.

"Quem mandou matar?”

Os familiares e antigos colegas de Marielle Franco acusam as autoridades de agirem com lentidão por terem feito as primeiras detenções um ano após o assassínio – e de avançarem pouco para identificarem os “mandantes”.

“Parece-me óbvio que um crime dessa envergadura não foi cometido por razões pessoais desses PM [polícias militares]. É fundamental chegarmos aos mandantes desse crime político”, disse o vereador Tarcísio Motta, colega de Marielle Franco na bancada do Partido Socialismo e Liberdade no Rio de Janeiro.

A viúva da vereadora, Mônica Benício, disse ao jornal britânico The Guardian que as detenções desta terça-feira são “importantes”, mas frisou que “há algo ainda mais importante": “Quem mandou matar a Marielle? Espero não ter de esperar mais um ano para saber quem organizou tudo isto.”

Segundo o jornal O Globo, as equipas de investigação passaram vários meses a tentar ligar os pontos até chegarem a Ronnie Lessa porque o sargento na reforma usava telemóveis comprados com a identificação de outras pessoas – e no dia do assassínio de Marielle Franco, o seu telemóvel pessoal foi usado por uma mulher numa outra zona da cidade, para confundir a polícia.

Com a colaboração das empresas de comunicações móveis, os investigadores identificaram uma grande quantidade de telemóveis usados por várias pessoas no trajecto feito pelo automóvel em que seguia Marielle Franco.

Para apertar a malha, os investigadores usaram as gravações de uma câmara de segurança colocada na rua onde a vereadora participava num debate, na noite do crime. Nas imagens, vê-se uma luz a aceder no interior do automóvel usado pelos assassinos, o que sugeria que os ocupantes tinham começado a usar um telemóvel.

Depois de cruzarem todas as informações de localização e hora, os investigadores conseguiram reduzir de forma significativa as suas buscas. A partir de um número de telemóveis mais restrito, foi possível identificar um que tinha sido usado para contactar uma pessoa com ligações a Ronnie Lessa.

Por fim, os investigadores tiveram acesso à informação que o utilizador desse telemóvel guardou na “nuvem”, mediante uma ordem judicial. Foi lá que encontraram o rasto das pesquisas que o sargento na reforma foi fazendo sobre Marielle Franco e outras informações comprometedoras, que se vão juntar às descobertas feitas esta terça-feira em casa dos suspeitos e nos seus computadores.