EDP desenha futuro: vender activos, investir “verde” e pagar dívida e dividendos
Vender activos, investir em renováveis e reduzir a dívida é a receita da EDP para um futuro que passa ao lado da OPA da China Three Gorges, mas que remunera os accionistas com três mil milhões de euros.
A EDP apresentou esta terça-feira aos investidores uma estratégia que dispara em várias frentes e com a qual quer reforçar o investimento em renováveis, aumentar os lucros (regressando ao patamar dos mil milhões de euros em 2022), reduzir a dívida e manter o mesmo nível de remuneração aos accionistas, assegurando a entrega de três mil milhões de euros nos próximos quatro anos.
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A EDP apresentou esta terça-feira aos investidores uma estratégia que dispara em várias frentes e com a qual quer reforçar o investimento em renováveis, aumentar os lucros (regressando ao patamar dos mil milhões de euros em 2022), reduzir a dívida e manter o mesmo nível de remuneração aos accionistas, assegurando a entrega de três mil milhões de euros nos próximos quatro anos.
O novo plano estratégico da eléctrica liderada por António Mexia, que parece passar à margem do processo de Oferta Pública de Aquisição (OPA) anunciado em Maio passado pela China Three Gorges (CTG), põe todas as fichas nas energias renováveis (nas quais se antecipa um investimento de oito mil milhões de euros) e a grande maioria delas nos Estados Unidos, um mercado onde, à partida, a oferta chinesa estaria condenada ao fracasso.
Em conferência de imprensa, o presidente da EDP sublinhou que o plano estratégico teve “o apoio de todos os accionistas, mesmo o oferente”, e que “a empresa está a fazer os investimentos que tem de fazer” para “evoluir na continuidade”. Afirmando que a eléctrica está bem posicionada “para capitalizar esta fase de transição energética”, Mexia sublinhou que, agora que “toda a gente quer ser mais verde”, a EDP tem a vantagem de ter chegado primeiro que os outros: “Nós não temos de comprar crescimento, nós crescemos”.
Porém, para que isso continue a acontecer, a empresa terá de “focar-se no que sabe fazer bem” e sair de áreas em que é “maior do que aquilo que devia”. É aos negócios expostos ao mercado (por oposição a negócios com receitas reguladas e contratos de venda de energia de longo prazo), e em áreas como as energias térmicas, na Península Ibérica, que a EDP pretende diminuir a sua exposição: reduzir o risco, tornar o portefólio mais verde (até 2030, 90% da electricidade produzida deverá ser renovável) e gerar encaixes “significativos” que permitam reduzir dívida (em dois mil milhões de euros até final do plano), serão os principais critérios destas operações.
Até ao final deste ano, a empresa conta ter definida a lista de activos para vender em Portugal e Espanha, com os quais pretende encaixar dois mil milhões de euros, num prazo de 18 meses. Na calha, segundo Mexia, poderão estar algumas barragens, as centrais a carvão, e mesmo centrais a gás, ou participações em redes com proveitos regulados (embora estas “não sejam uma prioridade”, pois “ajudam a estabilizar os cashflows” da empresa). Tudo está em aberto.
A venda de participações em activos de renováveis nos Estados Unidos mantém-se parte da estratégia, porque “permite diminuir o risco e acelerar o crescimento e fazer mais projectos, em mais locais, ao mesmo tempo”. Regra geral, a EDP conserva uma posição de 20% nos projectos e assegura a operação e manutenção dos parques, mas está aberta a vender a totalidade do capital de alguns projectos. A meta é alcançar quatro mil milhões de euros com esta rotação de activos, que suportará metade do investimento previsto nas renováveis (os restantes quatro mil milhões virão dos fundos libertados pela actividade e por alienações).
Brasil é para manter
Embora a aposta a todo o vapor nas renováveis e a redução da dívida (que ronda os 13.500 milhões) estejam em linha com as sugestões deixadas à gestão da EDP pela Elliott Management (o accionista activista que se opõe à OPA da CTG), há uma que está fora de questão: a venda da operação no Brasil. Mexia deixou claro que o negócio brasileiro está de acordo com os eixos definidos (as renováveis e os negócios regulados, como as redes de distribuição). “O Brasil tem tido um papel relevante no negócio” e a EDP irá continuar a avaliar oportunidades de crescimento, num mercado onde nunca embarcou “em loucuras”.
Quanto a Portugal (onde a EDP registou em 2018 um prejuízo de 18 milhões de euros), o gestor referiu que a rentabilidade diminuiu nos últimos anos (independentemente das medidas políticas e regulatórias assumidas no final de 2017 e em 2018, que “foi um tempo muito difícil”), mas as coisas podem mudar. “Vemos oportunidades em Portugal, com o compromisso do Governo com a transição energética”, nomeadamente em áreas como a mobilidade eléctrica, as redes inteligentes, o reforço de potência dos parques eólicos e os leilões de potência solar, detalhou.
O presidente da EDP disse ver com satisfação a posição do Governo relativamente às novas concessões de distribuição eléctrica - o Executivo voltou atrás e prefere agora pôr a concurso uma concessão única nacional, em vez de concessões regionais. Mexia diz que “a decisão vai no bom caminho” e “é mais inteligente porque promove economias de escala”.
Quanto à CESE, Mexia assumiu que a empresa irá pagá-la pelo menos até 2022, embora acredite que nessa data a taxa extraordinária da energia já estará reduzida a 40% do valor actual (a EDP pagou no ano passado 65 milhões da CESE).
Sobre a OPA, o presidente da EDP notou ainda que as notificações da operação às autoridades europeias e norte-americanas deverão ocorrer “em breve”. “Os passos necessários e obrigatórios face ao que foram as condições de sucesso da oferta estão a ser dados, mas este trabalho administrativo é mais complexo e mais longo do que algumas partes pensavam”, afirmou o gestor. Terá a CTG vindo mal preparada para lançar uma OPA à EDP? “O contexto mudou”, respondeu o presidente da eléctrica, referindo-se a uma “evolução clara relativamente ao investimento estrangeiro na Europa”.
Se “o caminho [para tentar registar a OPA] tem de ser feito”, isso não é o mesmo que falar numa operação bem sucedida, porque a sua concretização obrigaria a EDP a vender a operação norte-americana e colocaria em risco o investimento da State Grid na REN, por causa das regras europeias de separação dos activos de transporte e produção eléctrica. “Convém que essa clarificação seja feita e eu estou sempre mais preocupado com o futuro do que com o passado. É para isso que estamos aqui hoje”, afirmou António Mexia.
A jornalista viajou a convite da EDP