Parlamento recomenda ao Governo que combata desinformação, mas PSD critica a máquina do PS
Todos os partidos acusaram o PS de não ter permitido que apresentassem propostas para o debate. A direita apontou o dedo à máquina da propaganda socialista que criou blogues no tempo de Sócrates. PSD vai chamar ao Parlamento o embaixador da cibersegurança.
Com a abstenção do PSD e o voto contra do PCP, os socialistas conseguiram fazer aprovar a sua recomendação ao Governo para que este adopte medidas para a aplicação em Portugal do Plano Europeu de Acção contra a Desinformação, aprovado por Bruxelas em Dezembro do ano passado. Ao lado do PS votaram o CDS e o Bloco (o PAN faltou à votação).
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Com a abstenção do PSD e o voto contra do PCP, os socialistas conseguiram fazer aprovar a sua recomendação ao Governo para que este adopte medidas para a aplicação em Portugal do Plano Europeu de Acção contra a Desinformação, aprovado por Bruxelas em Dezembro do ano passado. Ao lado do PS votaram o CDS e o Bloco (o PAN faltou à votação).
O debate potestativo de quase duas horas agendado pelo PS ficou essencialmente marcado por duas críticas. Uma delas, feita por todos os partidos, foi a da contradição dos socialistas de terem marcado um debate sobre o "combate à desinformação e em defesa da democracia" e não terem permitido que as outras bancadas apresentassem propostas. O regulamento da Assembleia da República prevê que o partido que marca um debate possa não admitir qualquer iniciativa dos restantes. "Uma demonstração expectável de democracia era esperar que todos os grupos parlamentares contribuíssem para o debate e não rejeitar que outros trouxessem as suas propostas", disse logo no início o bloquista Pedro Filipe Soares - ideia que foi repetida, sem excepção, em todas as intervenções. Rejeitou as corridas para ver quem "coloca a bandeirinha" na frente e acusou o PS de ter "afunilado" a discussão.
A outra crítica foi uma arma de arremesso essencialmente do PSD e do CDS, que não se cansaram de apontar o dedo às práticas socialistas de propaganda que passaram, no tempo dos governos de José Sócrates, pela criação de blogues e perfis na internet que defendiam a acção do Governo e do PS. Os dois partidos à direita até citaram o ex-ministro e actual cabeça de lista do PS às europeias como um dos autores desses blogues.
Depois de esgrimirem críticas e argumentos, no final do debate, o PSD anunciou que vai chamar ao Parlamento o embaixador especial para as questões de cibersegurança para saber em que ponto está a protecção nacional - sobretudo numa altura de vésperas de eleições - e o CDS prometeu que apresentará não uma simples recomendação (como o PS) mas um projecto de lei para ajudar a combater o fenómeno das notícias falsas.
O bloquista Pedro Filipe Soares realçou que o seu partido foi pioneiro na criação de um código de conduta nas redes sociais e desafiou os outros partidos a fazerem o mesmo. O deputado lançou também o repto ao PS para alinhar com o Bloco no debate da nova economia digital, que é responsável pelas campanhas de desinformação, e para fazer essas grandes empresas pagarem em Portugal os impostos devidos pelos "lucros milionários" que aqui ganham - como já estão a fazer os socialistas em Espanha, acicatou ainda o deputado.
O tema da propaganda de José Sócrates seria trazido pelo social-democrata Carlos Abreu Amorim, que esperava do PS "um acto de contrição ou uma catarse no sentido da Grécia Antiga", para fazer a "purificação das almas". Pelo contrário, o que teve foi uma "cataplana parlamentar", onde as propostas são "amalgamadas e confundidas", numa referência à participação culinária de António Costa no programa de Cristina Ferreira.
Abreu Amorim colocou o dedo na ferida e quis saber o que o PS tem a dizer sobre as revelações da revista Sábado de que o ex-ministro Pedro Marques participou no blogue Câmara Corporativa, que defendia o Governo de Sócrates e "difundia fake news", e que era financiado pelo empresário Carlos Santos Silva - também envolvido na Operação Marquês.
O deputado socialista José Magalhães, autor do projecto de resolução do PS, passou ao lado da crítica limitando-se recusar falar sobre "violações do segredo de justiça", disse que o PSD não quis estudar o assunto das notícias falsas e que nem conhece o plano de acção de Bruxelas.
José Magalhães defendeu não serem precisas leis novas para combater as notícias falsas, afirmou que o PS tem "muitas dúvidas" sobre a necessidade de um partido ter um código de conduta para lidar com as redes sociais porque "ninguém espera" que um partido não seja honesto ou que fabrique notícias.
CDS quer saber o que Lisboa e Moscovo pretendem fazer em conjunto
Os centristas são a favor de um reforço da legislação, disse Telmo Correia citando os casos de França e da Alemanha, e defendeu ser preciso lidar no Parlamento Europeu com os movimentos e partidos que recorrem ao estratagema da desinformação. Lembrou que o CDS apoia a saída do Fidesz, o partido de direita do primeiro-ministro húngaro Viktor Orbán, do Partido Popular Europeu. E quis saber o que o Governo português combinou como ministro dos Negócios Estrangeiros russo, Sergey Lavrov, sobre a estratégia de combate à desinformação.
A comunista Diana Ferreira atirou grande parte da culpa da desinformação e das notícias falsas para os "interesses" dos grandes grupos económicos por trás das empresas de comunicação social e defendeu a necessidade de se discutir o funcionamento e financiamento das redes sociais mas também da disseminação da informação falsa a par da educação para a literacia digital. E lembrou exemplos de conflitos baseados em informação falsa, como a guerra do Iraque, a que o também comunista António Filipe veio somar as guerras dos Balcãs e da Síria e a actual situação na Venezuela.
António Filipe criticou o plano de acção da Comissão Europeia que o socialista José Magalhães tanto elogiara, dizendo que "não é um plano contra a desinformação mas sim um plano de desinformação a favor da UE e da NATO porque não permite que se ponha em causa o rumo da Europa. "É uma tentativa de impor uma versão oficial e repudia tudo o que a contraria. Este plano não é um bom contributo para um tema que deve ser discutido com seriedade."
Para o PSD, popular é o mesmo que populista
Mas o PSD não deixaria a chama contra Sócrates apagar-se. O deputado Carlos Peixoto subiu à tribuna para lembrar a "credenciada e cadastrada fábrica de fake news do PS e do Governo Sócrates", citando o empresário socialista Henrique Neto. "O PS tem a maior rede de desinformação existente em Portugal. (...) Pode estar cheio de experiência, mas falta-lhe decência política e moralidade."
Disse que os socialistas "são péssimos espécimes no que diz respeito à transparência" e listou uma série de exemplos de "fake politics" e promessas anunciadas e nunca cumpridas, como aos professores, investimento na saúde, sobretaxa dos combustíveis, fim das propinas, redução do custo da electricidade. "O PS vive numa confusão tal que não sabe distinguir o que é verdadeiro e falso. Já foi assim no tempo de José Sócrates e este Governo PS é um sucedâneo do anterior."
Para o PSD, o combate às falsas notícias deve fazer-se pelo reforço da protecção dos dados pessoais e do combate ao cibercrime, apontou.
Depois de o deputado socialista Pedro Delgado Alves ter acusado o PSD de apenas fazer chicana política e atacar o PS em vez de "ser construtivo", discutir seriamente o assunto e ajudar a contrariar o "crescimento galopante dos populismos" , Carlos Peixoto haveria de confundir os conceitos de populismo e popular: "Sabe onde morou ontem o populismo? Na casa da Cristina Ferreira. Isto é trágico para o país." E tentou justificar-se dizendo que citou "exemplos concretos" de "fake news que têm como origem a vossa [do PS] casa" ao falar das promessas do Governo.