“O que se pretendeu foi valorizar as medidas de apoio ao cuidador”

Pela primeira vez a Rede Nacional de Cuidados Continuados Integrados (RNCCI) tem uma coordenação conjunta entre saúde e segurança social.

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Ana Gomes e Miguel Fausto da Costa Daniel Rocha

Em funções desde 15 de Fevereiro, Miguel Fausto da Costa, enfermeiro chefe no IPO de Lisboa, representa o Ministério da Saúde. Ana Gomes, psicóloga, representa o Ministério do Trabalho e Segurança Social, onde é directora da Unidade de Gestão e Acompanhamento da RNCCI. Envolvidos no início da rede, ambos dizem estar disponíveis para trabalhar em proximidade com todos os parceiros e consideram que a proposta do Governo, que optou por não apresentar um estatuto de cuidador informal, é para eles a melhor opção.

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Em funções desde 15 de Fevereiro, Miguel Fausto da Costa, enfermeiro chefe no IPO de Lisboa, representa o Ministério da Saúde. Ana Gomes, psicóloga, representa o Ministério do Trabalho e Segurança Social, onde é directora da Unidade de Gestão e Acompanhamento da RNCCI. Envolvidos no início da rede, ambos dizem estar disponíveis para trabalhar em proximidade com todos os parceiros e consideram que a proposta do Governo, que optou por não apresentar um estatuto de cuidador informal, é para eles a melhor opção.

Esta coordenação da RNCCI, repartida entre os ministérios da Saúde e do Trabalho e Segurança Social, é um sinal de que estão finalmente a trabalhar numa óptica comum?
Ana Gomes (AG)
— Este trabalho conjunto é um espelho muito claro da intenção que está subjacente à criação da RNCCI, de poder conciliar, centrando na pessoa que precisa de cuidados, o apoio social e os cuidados de saúde.

Miguel Fausto da Costa (MFC) — Este trabalho conjunto já existia na anterior coordenação. A grande diferença é ao nível das coordenações (nacional, regional e local), ao estarem representadas a saúde e a segurança social. É uma nova forma de trabalhar porque as necessidades dos utentes não se espartilham entre saúde e apoio social.

A Associação Nacional de Cuidados Continuados tem criticado os valores de financiamento. Também reclama um valor importante do Estado: 6,4 milhões de euros. Há risco de os prestadores poderem abandonar a rede?

AG — Temos deslocações programadas nos próximos meses às diferentes regiões do país para tentar encontrar soluções para colmatar todas as dificuldades e numa proximidade muito grande. Estamos disponíveis para acompanhar e para ajudar todas as instituições, nomeadamente as associações que têm o direito de reivindicar o que consideram melhor e estaremos atentos a isso. Todas terão um tempo de diálogo e de análise das suas reivindicações.

MFC — O modelo de contratualização é com um valor fixo, pago por diária. Não ponho completamente de parte que possamos evoluir para um modelo de complexidade. Ou seja, quanto mais complexo mais se paga; menos complexo, paga menos. Isso é uma das possibilidades para futuro e talvez se aproxime mais das reivindicações das associações, por um lado, e do conceito de cuidados centrados nas necessidades da pessoa, por outro.

Há uma estimativa de quantos profissionais serão precisos para aumentar o número de equipas de cuidados domiciliários?

MFC — Existe uma equipa domiciliária, uma experiência piloto em Évora, que presta cuidados 24 horas por dia: 12 horas em permanência e 12 horas por contacto telefónico. Tem nove tipos de profissionais diferentes e uma geometria variável em função da complexidade e nas necessidades dos utentes. Está a ser a equipa piloto para conseguir responder a essa pergunta.

Quantos cuidadores temos em Portugal?

MFC — Esse levantamento está por fazer. As associações falam em 800 mil cuidadores. A expressão cuidador é tão vasta quanto cuidar de um filho com deficiência ou de um idoso.

Quando é que se pode fazer este tipo de levantamento?

MFC — Está ser discuta na Assembleia da República a proposta de lei para medidas de apoio ao cuidador e que definirá o que se considerará por cuidador. Julgo que nessa altura conseguiremos ter números.

Um levantamento só depois da aprovação de um projecto de lei?

MFC — Essa legislação enquadrará ao que estamos a chamar cuidadores do ponto de vista legal.

AG — Há muitas coisas que estão a ser feitas. Temos um grupo de trabalho que vai terminar a sua função dentro de dois meses sobre duas medidas muito importantes que estão a correr o país e em que há imensas experiências-piloto. É a capacitação aos cuidadores e que a literacia em saúde e apoio social. Isto não está à espera, como o descanso do cuidador não tem de ficar à espera. Temos que promover espaços de descanso do cuidador, quer nas unidades que já existem como valorizar o descanso do cuidador deixando a pessoa que precisa de ser cuidada no seu domicílio. Aqui, novamente a necessidade de parcerias com as autarquias e outras associações e com o voluntariado.

O Governo optou por não apresentar um estatuto do cuidador, mas antes fazer o seu reconhecimento e criar medidas de apoio. Esta é a melhor solução?

AG — Para nós é.

Porquê?

AG — Porque este é o espaço certo para reconhecer o esforço e o que as pessoas fazem, dando-lhes benefícios. A aprovação da lei vai trazer muitas soluções novas para pessoas que estão agora muito mais isoladas e sozinhas e isso para já é o caminho certo.

O estatuto do cuidador não faria isso?

MFC — O estatuto é um estatuto. Aqui, o que se pretendeu foi valorizar as medidas de apoio ao cuidador.

As medidas que o Governo propõe são suficientes?

AG — As medidas provavelmente nunca são suficientes e tudo tem de ser dinâmico. Este documento também tem uma intenção muito importante de valorizar os direitos da pessoa cuidada. De lhe dar o direito de participar nas decisões que têm a ver com a sua vida e os seus cuidados.